O envolvimento das crianças com a mídia e o ato de consumir se iniciam mesmo
antes de elas aprenderem a ler ou a escrever. É, segundo Bauman,
“a instalação do papel social de consumidor”. Esse autor alerta que
esse novo modelo de sociedade é cheio de forças coercitivas que levam seus
integrantes a se ajustarem aos valores do mercado. A questão é o número cada vez
maior de crianças e adolescentes ingressando em um modelo altamente consumista.
O apelo social do ”ter para ser aceito” acaba fazendo de muitos
pré-adolescentes reféns de uma vida para o consumo. Esse processo complica ainda
mais a conturbada fase de construção da identidade pessoal e ingresso na vida
adulta. O foco do artigo de hoje é a influência que a propaganda exerce sobre
crianças e adolescentes e qual o papel dos pais e/ou responsáveis na formação de
um consumidor responsável.
A consultora financeira Susanna Stuart,
autora do livro "Ensine seu Filho a Cuidar do Dinheiro" (Ed. Gente), fala sobre
alguns fatores que elevaram a pressão pelo consumo e o aumento do marketing
direcionado ao público infantil nas últimas décadas:
- A opção por ter filhos mais tarde: com a carreira
profissional dos pais encaminhada, o bebê crescerá em um cenário financeiro
melhor;
- O número menor de filhos por casal: maior dedicação e
gastos com cada criança;
- Pais ocupados e filhos mais sozinhos: maior tempo em
frente à TV ou computador e idas freqüentes aos shoppings para lanches e
compras;
- Menos filhos, mais recursos: menos tempo e inclusão das
crianças nas decisões financeiras da família.
Essa tendência é muito perigosa, pois pode causar danos à construção dos
valores morais e éticos de nossas crianças e adolescentes. Principalmente nas
crianças até 7 anos, pois elas não possuem capacidade cognitiva suficiente para
distinguir as mensagens passadas através da mídia. Conseqüentemente, o poder de
decisão é pequeno.
O posicionamento dos pais é essencial
O que fazer se estamos inseridos nessa sociedade e diversas vezes
cedemos aos apelos do consumo pelo consumo? Se nós adultos acabamos atendendo
aos nossos desejos e satisfazendo nossas vontades, o que dizer dos jovens ainda
em formação e de seu caráter imediatista?
Uma atitude é certa: o posicionamento de pais e responsáveis é fator
essencial para a formação de cidadãos mais críticos e seletivos. A transmissão
de valores através do hábito de consumo responsável tem um impacto expressivo na
vida dos filhos - valores que serão absorvidos a cada dia e através da postura
observada por eles.
Todas as nossas condutas são baseadas em nosso sistema de crenças. Por
exemplo, em minha casa nós damos preferência de compra aos produtos nacionais,
ajudamos mensalmente instituições filantrópicas da nossa cidade e procuramos
ponderar o custo-benefício das marcas. Essas atitudes são explicadas para nossa
filha, que a partir da nossa postura está formando o seu sistema de valores e
crenças.
Os comerciais de TV: oportunidade para diálogo
A “dupla” comercial de TV e crianças sempre foi foco de discussões por
parte de especialistas. Alguns recomendam a exclusão das propagandas durante a
programação infantil. Outros dizem que a influência de colegas e o estilo de
vida familiar têm mais peso na questão do alto consumo, tema para um próximo
artigo. Pontos de vista diferentes, com uma recomendação em comum: a necessidade
de uma condução na formação dos hábitos de consumo por parte dos pais.
O certo é que as crianças passam muito tempo em frente à TV e as empresas
investem muito em propagandas focadas para esse público. Errado? No momento, não
cabe a discussão. A questão, mais relevante, é a postura ativa que os pais
precisam ter. Precisamos oferecer às crianças e adolescentes ferramentas para
torná-los mais seletivos.
Não queremos e nem devemos privá-los de entrar em contato com os inúmeros
produtos lançados todo dia pelas empresas, o que seria muito difícil e não
resolveria a questão. A atitude correta é prepará-los para terem uma postura
mais crítica frente aos comerciais.
A maioria dos nossos hábitos de consumo é influenciada pela mídia, desde o
sutil comercial de margarina até os programas instigando nosso cérebro de forma
mais direta, ao melhor estilo “Compre, Compre!”.
Os comerciais destinados às crianças e suas mensagens diretas e indiretas
possuem um grande impacto sobre elas e é por isso que devemos dedicar atenção
especial a eles e como nossos filhos reagem à sua exposição. A especialista em
educação financeira infantil Neale S. Godfrey, autora do livro
"Dinheiro não dá em Árvores" (Ed. Jardim dos Livros), sugere que o ideal é
conversar com as crianças sobre as propagandas, explicando seus objetivos.
Quando entendemos como o sistema funciona somos menos vulneráveis à compra pela
compra. Seria uma solução contra o consumismo desenfreado que atormenta pais e
educadores em todo o mundo.
Através das conversas informais com as crianças e respeitando as fases de
desenvolvimento de cada uma, você estará formando um “consumidor esperto”. O
mundo é repleto de produtos e os comerciais existem para mostrar esses produtos
e nos convencer a comprá-los. Nosso papel é saber escolher.
Fale com seus filhos sobre:
- Qualidade;
- Diferença entre querer e precisar;
- Pesquisa de preço;
- Estabelecer comparações e escolher o mais apropriado;
- Planejamento, poupança e disciplina.
Outro alerta importante é o incentivo inconsciente ao consumismo como forma
de compensação emocional. Explico: muitos pais compensam sua ausência com
presentes. Bom, acho que não preciso falar mais nada, certo?
E na sua família, como é conduzida a questão do consumo junto às crianças?
Escreva-nos contando suas experiências! Um abraço e até o próximo artigo.