A falta de conhecimento sobre os hedge funds faz com que existam diversos
mitos em torno das operações desse tipo de fundos: são especulativos? Cobram
taxas de administração exorbitantes? Devem ser evitados a qualquer custo - ou é
um investimento que dá bons retornos independente da situação do mercado?
"Muitas dessas concepções são baseadas em simplificações, conclusões
precipitadas e interpretação errada de alguns fatos" afirmam os autores do
estudo AIMA'S Roadmap to Hedge Funds. A principal diferença dos hedge funds, na
verdade, é que eles utilizam uma gama maior de instrumentos e mercados para
obter lucros e minimizar perdas - e não comparam seu desempenho a benchmarks, no
chamado "retorno absoluto". Veja a seguir os 10 principais mitos sobre hedge
funds - e a explicação por trás de cada um deles.
Mito 1: os hedge funds são como jogos de azar
Os hedge funds são, na verdade, mais semelhantes ao dono do cassino do que ao
apostador que joga nele - o apostador, que depende da sorte, é mais parecido com
o investidor em fundos long only, acreditam os autores do estudo encomendado
pela Alternative Investment Management Association, associação global sem fins
lucrativos que atua no mercado de hedge funds. A mesma analogia é válida no caso
de uma loteria - não é necessário ganhar todas as vezes, porque as
probabilidades estão a favor da casa. Em outras palavras, no mercado, as
probabilidades estão a favor dos hedge funds.
Segundo os autores, a operação de uma loteria é o mais próximo de um benchmark
que se pode chegar em um universo de retornos absolutos. A razão pela qual um
cassino ou uma loteria funcionam (e são lucrativos) é que existe um fluxo de
dinheiro constante, apesar de o retorno esperado ser positivo para o operador e
negativo para quem aposta, em termos monetários. "Qualquer investidor vagamente
familiarizado com estatísticas prefere ser o operador, e gerenciar o dinheiro de
forma ativa", afirmam.
Mito 2: hedge funds sempre fazem proteção de riscos
Os riscos são necessários para se obter retornos - se os hedge funds se
protegessem de todos os riscos, não haveria retornos também. Muitos hedge funds
procuram proteção contra diversos tipos de risco, priorizando a consistência e
estabilidade dos retornos - assim, eles conseguem oferecer retornos constantes
com um menor risco de perda. A diferença aqui é a seleção de riscos - os hedge
funds selecionam riscos aos quais vale a pena se expor, devido aos resultados
esperados, e evitam riscos que não trarão recompensas ao investidor, defende a
AIMA.
Mito 3: hedge funds são arriscados
Se examinados isoladamente, os hedge funds são sim arriscados - mas ações de
energia e tecnologia também são. Mas os hedge funds não podem ser analisados
isoladamente porque são apenas uma parcela do capital do investidor.
Assim como poucas pessoas investem em apenas uma ação (ou setor) e procuram
diversificar seus investimentos para aumentar a probabilidade de lucros e
minimizar as perdas, os hedge funds são uma boa oportunidade de diversificação
para um portfólio tradicional - já que qualquer investimento com expectativa de
retorno positivo, baixa volatilidade e baixa correlação com o restante do
portfólio terá grande chance de diminuir a volatilidade dos investimentos como
um todo.
Mito 4: hedge funds são especulativos
Nesse caso, os autores são bastante enfáticos: hedge funds não são
especulativos. Segundo eles, a ideia vem da conclusão precipitada que um gestor
que usa instrumentos especulativos está invariavelmente gerenciando um portfólio
especulativo.
Os instrumentos especulativos usados - por exemplo, short selling de ações - têm
como objetivo minimizar os riscos. "A maioria dos gestores com retorno absoluto
é mais conservadora - já que são responsáveis pelas perdas, ao contrário dos
investimentos tradicionais", afirmam. Além disso, os gestores frequentemente tem
seu próprio capital aplicado, então seus interesses estão alinhados com os dos
investidores.
Mito 5: os hedge funds cobram altas taxas
Uma descrição comum para os hedge funds já foi "um esquema de compensação
disfarçado de classe de fundos". A primeira questão sobre a remuneração dos
fundos e gestores é que os hedge funds remuneram seus gestores com uma taxa
fixa, mais uma porcentagem dos ativos investidos no fundo - como os valores
tendem a ser altos, os melhores profissionais convergem para essa área - o que,
por sua vez, mantém a geração de lucros alta entre os hedge funds.
A segunda questão é ligada ao "peso morto" dos portfólios - que são ativos mais
baratos, sobre os quais o gestor não tem confiança, mantidos no portfólio para
controlar riscos em fundos que tem como meta bater um benchmark. Um gestor de
long only com uma margem de erro de 200 pontos-base, por exemplo, pode ter
aproximadamente 90% do portfólio ligado exclusivamente ao benchmark, e apenas
10% como gestão ativa - assim, se o gestor cobra o investidor uma taxa por 100%
dos investimentos, e gerencia apenas 10% ativamente, a taxa desse tipo de fundo
pode ser considerada alta.
Já nos hedge funds, não existe peso morto no porfólio - e consequentemente, uma
parcela maior do capital é investido em posições nas quais o gestor tem
confiança de sua posição, e a taxa paga é referente ao total de investimentos
gerenciados ativamente.
Mito 6: hedge funds geram bons retornos em qualquer condição de mercado
Os hedge funds não tem uma relação próxima com o mercado de renda variável -
prova disso é que geraram resultados positivos enquanto as ações recuavam na
crise de 2000-2002. Algumas estratégias têm maior relação com o mercado, mas o
desempenho não é constante: mesmo a estratégia long & short, que deveria ser
mais relacionada com a performance de renda variável, historicamente teve um
retorno positivo em alguns trimestres ruins para ações, e em alguns teve um
desempenho ruim.
Uma analogia possível, no caso de queda do mercado de renda variável e dos hedge
funds, é que os portfolios long-long são como carros sem freio, enquanto os
hedge fnds são carros com freios - mesmo que caia num período ruim para o
mercado em geral, a queda é mais controlada. "Por isso, muitos profissionais
dessa indústria acreditam que os fundos long-only é que são especulativos, já
que estão totalmente sujeitos aos humores do mercado de ações".
Mito 7: a lição da quebra do LTCM é "não invista em hedge funds"
A quebra do hedge fund LTCM, desencadeada pela crise russa de 1998 e finalizada
em 2000, ainda assusta muitos investidores. Mas já houve perdas no mercado de
ações na mesma proporção - ou até maiores - que não parecem desanimar os
investidores em relação à renda variável, mesmo com o número muito maior de
regulações que deveria reger as operações, já que os hedge funds têm pouca
regulamentação a seguir. E um hedge fund é um negócio - e, como todo negócio,
existe a possibilidade de que ele falhe e entre em falência.
Segundo Thomas Schneeweis, professor da Universidade de Massachusetts, as lições
do LTMC - e de qualquer tipo de investimento - não envolvem não investir em
hedge funds, mas sim: a importância da diversificação; investimentos de alto
retorno também são potencialmente investimentos de baixo retorno; investir em
mercados secundários sem liquidez pode ser desastroso em condições de mercado
extremas; e um investimento que oferece retornos de mais de 30%, como era o
caso, é extremamente arriscado.
Mito 8: hedge funds aumentam o risco sistêmico do mercado financeiro
Para os autores, este é um dos temas mais controversos na indústria de hedge
funds - e é, em parte, verdade. "Os hedge funds, em nossa opinião, podem
estabilizar ou desestabilizar os mercados financeiros".
Isso porque quando investidores que operam com alavancagem são pressionados por
um choque de liquidez, os riscos que eles assumiram vão ser devolvidos ao
mercado, exacerbando a instabilidade. Por outro lado, os hedge funds servem para
aumentar a liquidez e eficiência do mercado quando necessário - como foi o caso
em 2002, quando a indústria de hedge funds absorveu os ativos vendidos pelas
seguradoras europeias.
Mito 9: short selling é o oposto de um investimento em longo prazo
Short selling é frequentemente interpretado como o oposto de comprar uma ação
como investimento em longo prazo - o que não é verdade. "Short selling requer
habilidades específicas bem diferentes de se comprar e manter ações por um
período de tempo", afirmam os autores.
Mito 10: não existe uma revolução de retorno absoluto
No mercado, alguns acreditam que existe um portfólio normal, ao qual os hedge
funds recorrem quando não sabem como aplicar o capital. Entretanto, segundo os
autores, há duas posições para as quais os hedge funds recorrem nesses casos:
devolver o dinheiro para os investidores ou Treasuries. "Se um investidor de
retorno absoluto não sabe o que fazer, ele não recorre a riscos aleatórios.
Porque ele faria isso? Se não há oportunidades, não há riscos no portfólio",
afirmam.