Ações / Bolsa de Valores - O resgate de instituições e o problema do risco moral
A necessidade de salvamento de várias instituições financeiras pelos governos
americano e europeu trouxe de volta à discussão econômica um dos principais
problemas apresentados pela teoria da informação assimétrica: o chamado risco
moral. Com relação aos bancos, o risco moral se reflete, por exemplo, na
seguinte questão: como os banqueiros têm certeza de que sempre serão salvos
pelos governos de seus países, poderiam eles continuar arriscando o dinheiro dos
correntistas e investidores em novas operações subprime?
Neste artigo vamos discutir e apresentar definições mais rebuscadas sobre o tema
e discutir uma questão central do momento que vivemos: salvar instituições à
beira da falência é interessante? Vale a pena? Que lições podem ser aprendidas
com este debate? Em suma, o problema de risco moral existe quando a ação do
Agente não é verificável ou quando o Agente recebe informação privilegiada após
a relação econômica ter sido iniciada.
No problema de risco moral, os participantes têm a mesma informação quando a
relação (transação econômica) é efetivada. Então, o problema de informação
assimétrica surge pelo fato de que depois do contrato assinado, o principal não
consegue observar e/ou monitorar perfeitamente as ações/esforços do Agente. As
regras estão acertadas, mas o comportamento das partes muda bastante. Vamos
entender?
A partir da não-observação do comportamento de um dos Agentes, pode haver o
incentivo para tomada de decisões que não respeitam o que foi determinado no
contrato. Desta forma, os arranjos efetuados via sinalização ou filtragem perdem
sua efetividade, à medida que um dos agentes passa simplesmente a ignorar as
convenções estipuladas no acordo.
O risco moral
O termo risco moral foi originalmente utilizado no mercado de seguros para
explicar o fato de que, em tal mercado, quando uma empresa ou pessoas se
encontram plenamente seguradas, mas não podem ser meticulosamente monitoradas
pela companhia de seguros (que dispõe de informação limitada), estas podem
alterar seu comportamento após o seguro ter sido adquirido.
Em outras palavras, isto quer dizer que o segurado pode se expor a maiores
riscos, aumentado a probabilidade de pagamento por parte da seguradora. O mesmo
problema de risco moral enfrentado pelo mercado de seguros é observável em
outras situações da economia. Ou seja, ele sempre se manifestará quando um
contrato, já assinado, represente partes que não possuem condições de acompanhar
o comportamento ou as ações tomadas pelos outros envolvidos.
Segundo Kreps (1994), o problema de risco moral ocorre quando uma parte de uma
transação pode tomar certas ações que (i) afetem o resultado obtido pela segunda
parte, mas que (ii) a segunda parte não pode monitorar ou controlar
perfeitamente. O exemplo apresentado por Kreps é de seguro contra fogo, onde o
segurado pode ou não se preocupar adequadamente com o risco de um incêndio.
A solução seria a presença de incentivos, ou seja, estruturar transações onde a
parte que toma as ações, em seu próprio interesse, agirá conforme o que a
segunda parte preferiria. Conforme Mishkin (2000), o custo de monitoração do
comportamento dos agentes é muito elevado, o que em última instância poderia
inviabilizar a transação.
Risco moral e informações privilegiadas
Outra forma de risco moral surge quando o agente detém informação privilegiada
em relação ao principal. Encontramos, também neste caso, diversos exemplos na
economia. Podemos citar o mercado financeiro. Na presença de um emprestador de
última instância ou de seguros de depósitos para bancos comerciais podem ocorrer
problemas de risco moral.
Como? Ora, tanto por parte dos depositantes que não procurarão selecionar as
instituições financeiras mais sólidas, quanto pelas instituições financeiras que
expandirão seus créditos sem preocupação quanto aos riscos assumidos nas
operações. Situação perfeitamente aplicável, aliás, ao cenário que se criou
depois da falência do Lehmann Brothers - onde o Tesouro Americano foi obrigado a
salvar várias instituições financeiras atingidas pelo subprime.
Surge outro problema: em uma situação de economia em recessão, mesmo que o
governo identifique a excessiva presença de créditos ruins nos balanços dos
bancos, ele não sabe avaliar até que ponto isto é devido à desaceleração
econômica ou má gerência dos administradores. Esta é uma situação identificada
por Rasmusen (1992) como sendo o risco moral com informação oculta.
Risco moral nas relações trabalhistas
Um dos melhores exemplos da presença de risco moral se dá no mercado de
trabalho, onde dificilmente o empregador consegue avaliar ou acompanhar o nível
de esforço de seus empregados. O fato é que se o esforço não pode ser medido,
ele não pode ser incluído nas cláusulas do contrato assinado entre as partes e
dessa forma não pode ser exigido pelo empregador.
Rasmusen (1992) também considera o mercado de trabalho com as seguintes
definições:
- Se o empregador conhece a habilidade do empregado, mas não seu nível de
esforço, o problema é de risco moral com ação oculta;
- Se nenhum dos dois conhece a habilidade do trabalhador no início do
relacionamento, mas o trabalhador descobre sua capacidade tão logo comece a
trabalhar, o problema é de risco moral com conhecimento escondido;
- Se o trabalhador conhece sua capacidade desde o início, mas o empregador
não, o problema é de seleção adversa;
- Se o trabalhador adquire suas referências em resposta ao salário
oferecido pelo empregador, então o problema é de filtragem (“screening”).
O risco moral no mercado de seguros: um exemplo prático.
A presença de risco moral leva à uma situação paradoxal para o mercado. No
exemplo do mercado de seguros, o consumidor desejaria cada vez mais seguros e as
empresas seguradoras estariam dispostas a vender mais, desde que o consumidor
continuasse a tomar a mesma quantidade de cuidado.
Porém, este equilíbrio não acontecerá, pois, se o consumidor for capaz de
adquirir mais seguro, ele racionalmente escolheria tomar menos cuidado.
Portanto, as empresas de seguros restringirão a quantidade ofertada, pois não
conseguem, efetivamente, monitorar o comportamento do assegurado. Fazendo isto,
a seguradora mantém parte do risco com o consumidor.
Arrow (1963) considerou a questão do risco moral para o mercado de seguros nas
seguintes bases: se os indivíduos estão segurados contra riscos, eles não têm
incentivos a agir evitando o risco. Se a informação fosse perfeita, então a
apólice de seguro iria estipular as ações que poderiam ser realizadas e então
não haveria problema de incentivos.
Mas as ações são, na melhor das hipóteses, imperfeitamente observadas, o que
leva o indivíduo detentor de um seguro de automóvel a dirigir de forma mais
arriscada do que o indivíduo que não possui tal seguro.
Assim, Stiglitz (1985) afirma que a provisão dada pelo seguro afeta a extensão
de cuidado que os indivíduos vão tomar para evitar os sinistros, uma vez que a
companhia de seguros não pode monitorar as ações dos indivíduos. Como já
mencionamos, uma solução seria a aplicação de incentivos para que os indivíduos
evitassem correr riscos, como descontos oferecidos na renovação do seguro por
exemplo (os chamados bônus).
Portanto, sempre que houver a presença de risco moral haverá perda de
eficiência, favorecendo que uma das partes da transação assuma comportamentos
que prejudiquem a outra parte. Vale para um simples seguro de automóvel, quanto
para uma extensa e complicada operação financeira.
Isso quer dizer que a decisão de salvar ou não uma instituição financeira da
bancarrota sempre alterará o comportamento das demais instituições envolvidas no
setor e/ou que negociem com o segmento. Logo, preservar bancos nem sempre
implica num mercado financeiro mais saudável como querem as autoridades
americanas e européias.
Referência:
dinheirama.com
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