Carreira / Emprego - O desequilíbrio entre trabalho e maternidade
Quando deixou, depois de nove meses, o cargo de diretora interina da área de
marketing da Sadia, a executiva Fernanda Oruê, 42 anos, sentiu dois sentimentos
distintos. O primeiro de alívio por poder ter menos responsabilidade e mais
tempo para os filhos. O segundo, um certo desapontamento profissional. Depois de
uma negociação franca com a empresa, ela desistiu de concorrer ao cargo e acabou
assumindo uma gerência sênior em outro setor, o de inovação. "Tive um momento de
encantamento com o fato de me tornar diretora, mas sabia o que isso custaria.
Minha família estava chateada. Não conseguia atender um telefonema dos meus
filhos", diz. Hoje, ela sente-se realizada com o novo trabalho. Tem mais
controle sobre a própria agenda. Mesmo assim, encontrar o equilíbrio entre a
vida executiva e a maternidade, para ela, ainda parece uma equação sem solução.
Fernanda não está sozinha. Pesquisa realizada com 1.282 executivos, sendo 242
mulheres, mostra que 88% delas estão insatisfeitas e infelizes com a
distribuição de tempo entre a vida pessoal e profissional. Situação que piora
quando se trata de mães com filhos pequenos, de até dez anos de idade. O estudo
conduzido pela professora Betania Tanure, professora da Fundação Dom Cabral e da
PUC Minas ouviu presidentes, diretores até gerentes seniores, de médias e
grandes empresas instaladas no país. "O fato das mulheres atingirem mais cargos
executivos do que há dez anos faz com que elas disponibilizem mais tempo e
energia com o jogo do poder nas corporações e isso traz inúmeras implicações",
diz a pesquisadora.
Apenas 5% das executivas entrevistadas acreditam que têm um razoável equilíbrio
entre a vida pessoal e profissional e 7% dizem não ser possível mudar o ritmo do
trabalho, como se constatassem que no mundo corporativo esse desequilíbrio é
natural. "Assim elas conseguem acalmar o coração no curto prazo", diz Betania.
Mas, nem sempre conseguem o mesmo com os maridos. Segundo o estudo, as mães
executivas, além do estresse do trabalho precisam administrar as reclamações dos
companheiros, que se sentem preteridos em relação a atenção dispensada aos
filhos quando elas estão em casa.
"Não é nada fácil conciliar as coisas", diz Rubria Coutinho, 44 anos, gerente
corporativa de desenvolvimento organizacional da mineradora Samarco. Ela é uma
das quatro mulheres a ocupar um cargo de gerência na companhia. Não existem
diretoras na empresa. Engenheira bastante dedicada, ela só começou a sentir o
peso do desequilíbrio na vida pessoal quando se casou. "Dois anos depois, aos 37
anos, decidi que queria ser mãe", lembra. O chamado do relógio biológico levou a
executiva a uma longa e sofrida busca pela maternidade. Fez tratamentos para
engravidar durante anos, mas só conseguiu quando praticamente tinha desistido de
tentar. A filha Amanda, hoje com quase dois anos de idade, fez Rúbria repensar
sua relação com o trabalho.
O fato de ter tido a filha em um momento mais maduro da carreira ajudou Rúbria a
ter mais tranqüilidade para se ajustar ao novo universo familiar. "Tenho uma
super estrutura com babá, família e um marido que comanda um negócio próprio, o
que me dá mais flexibilidade", diz. Nas viagens constantes de negócios, sempre
que possível, tenta incluir a filha e a babá. "São muitas malas", diz. Ela
procura ver Amanda todos os dias. Morar há poucos minutos do trabalho ajuda.
"Gostaria de estar mais presente, sempre fica uma pontinha de culpa, mas tento
compensar", diz. O café da manhã é cedo e sagrado. "Mantenho um ritual". Sua
jornada é longa, começa às 8 da manhã e termina às 7 da noite. Isso quando não
surgem compromissos de última hora para o jantar. "Não é um mar de rosas, mas me
sinto privilegiada por ser mãe", diz.
Se as executivas, cada vez mais, se desdobram para dar conta de seus inúmeros
papéis, é porque a preocupação com sua empregabilidade também vem crescendo.
"Elas são mais provedoras do que antes", diz Betania Tanure. "A estrutura
familiar mudou, muitas são separadas ou respondem por uma parte significativa do
orçamento da família".
Quando descobriu que estava grávida, Teresa Vernaglia, 41 anos, presidente da
AES Eletropaulo Telecom, levou um susto. "Não tinha planejado", lembra. "Chorei
porque não sabia como daria conta de tudo", lembra. Ela não podia imaginar-se
quatro meses afastada do trabalho em um mercado tão competitivo como o de
telecomunicações e no auge da carreira. Logo depois do nascimento do filho
Gabriel, hoje com dois anos, esse sentimento foi se transformando. "Não tenho
nem babá", diz. Durante a semana, Gabriel vai para escola em tempo integral e no
fim de semana a mãe assume o comando. "Às vezes chego quebrada para trabalhar na
segunda", diz. "Para administrar melhor o tempo, aprendi a ter muita disciplina
também fora do escritório", diz a executiva.
O segredo para não se angustiar com as inúmeras demandas, dentro e fora do
trabalho, segundo Fernanda Oruê, é admitir suas imperfeições. "É preciso aceitar
o fato que não somos super mulheres. Você até acha que vai dar conta de tudo,
marido, filhos, casa e o bônus da companhia, mas a expectativa de ser perfeita
deixa tudo pior", diz. Mãe de Gabriela, 10 de anos de idade e Caue de 5,
Fernanda diz que hoje consegue explicar para eles o que significa ter uma mãe
executiva. "Quando chego tarde, lembro que não sou perfeita, sem culpa". Para
ela, manter o equilíbrio entre a vida corporativa e a pessoal é uma batalha
diária. "Quando a gente adora o que faz é muito fácil ser seduzida pelo jogo do
trabalho", diz
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