Carreira / Emprego - Para atuar no Médicos Sem Fronteiras, é preciso ter mais que conhecimento técnico
Um profissional da área de saúde precisa saber lidar com pessoas e entender o
que está por trás de cada diagnóstico. Um profissional que atua no MSF (Médicos
Sem Fronteiras), por sua vez, precisa saber lidar com pessoas em situações e
áreas de risco, com pessoas de culturas e línguas diferentes das suas, com
recursos muitas vezes escassos e com uma realidade que ele pode nunca ter visto
ou vivido.
O MSF é uma organização internacional médico-humanitária independente que foi
criada em 1971 por médicos e jornalistas franceses que atuaram como voluntários
na Nigéria dos anos 1960. Em grande parte, a organização é sustentada por
doações privadas e, hoje, conta com mais de 28 mil profissionais de diferentes
áreas que atuam em mais de 60 países, sendo 65% deles africanos. Os
profissionais brasileiros somam apenas 100 desse total. Mas são muitos que a
cada ano mostram interesse em trabalhar para a organização.
Para atuar em condições pouco favoráveis, o profissional precisa ter em mente o
outro e não a si mesmo. “As pessoas que querem entrar para a organização
precisam ser bastante flexíveis, precisam se transformar para suprir uma
demanda. Até que ponto você aguenta isso tudo?”, afirma a psicóloga em saúde
mental do MSF Ana Cecília Moraes, de 27 anos. “É preciso ter valores
humanitários fortes”, diz.
Ana sabe do que está falando. Ela já participou de missões no Quênia, no Congo e
no Haiti – países que, como se sabe, têm condições pouco favoráveis para atuação
de qualquer profissional de saúde – e diz que o que mais a impactou foi o que
viu ao seu redor. “Dentro da minha área de atuação, enfrentamos casos fortes de
saúde mental no Brasil. Mas, nesses países, é o contexto que não favorece. E
isso foi o mais difícil. Não dá para mudar a realidade de um país”, afirma.
Situações de emergência
A organização Médicos Sem Fronteiras trabalha, basicamente, por projetos, na
medida em que surgem situações de emergência em determinado local. “A decisão
sobre os locais onde teremos projetos é sempre baseada nas necessidades de saúde
da população, e não em opiniões políticas, ideológicas ou religiosas”, disse a
organização em nota.
Para abrir um projeto (ou missão), o MSF realiza uma avaliação do local e
analisa as condições de saúde da população e as instituições e organizações
presentes. Além disso, a instituição leva em conta critérios como a quantidade
da população afetada por uma determinada doença ou fenômeno. Dessa forma, são
atendidas vítimas de conflitos, catástrofes naturais, epidemias ou são atendidos
locais em situações precárias de saúde.
Além disso, a organização também atua em campanhas de prevenção e implementa
serviços básicos de saúde, principalmente para crianças e mulheres. Para esses
trabalhos, não são recrutados apenas médicos e demais profissionais da área da
Saúde, mas também engenheiros, profissionais da área administrativa, contábil e
de logística.
Ana começou no MSF na área de Recursos Humanos, na sede da organização no Rio de
Janeiro, para ajudar no recrutamento de profissionais para a organização. “É
muito trabalho e é um trabalho de extrema pressão e é preciso estar preparado
para isso”, afirma Ana. “O profissional precisa estar disponível para trabalhar
fora do país por no mínimo um ano. Além de saber lidar com situações de conflito
e catástrofe”, ressalta.
Claro que saber lidar com essas situações previamente é difícil. Mas, nessa
hora, vale a experiência e o preparo do profissional, pois em determinados
países é preciso esperar por qualquer coisa. Segundo a organização, ainda que o
profissional vá trabalhar em uma área considerada pacífica, nunca terá um “risco
zero” de sofrer algum ataque violento. “O MSF trabalha sempre com regras
estritas de segurança que devem ser respeitadas por todos os que trabalham
conosco. Mesmo assim, já houve casos de ataques contra nossas equipes”, disse a
organização.
Como trabalhar na MSF
Para trabalhar na organização, é preciso atender alguns requisitos
importantes, como experiência na área de atuação, disponibilidade para viagens,
ótimos conhecimentos em inglês ou francês e, se possível, nas duas línguas. Para
além das exigências técnicas, é preciso ficar atento às exigências
comportamentais, como motivação, comprometimento, facilidade em trabalhar com
equipes e pessoas de língua e cultura bem diferentes, capacidade de trabalhar e
viver em condições muitas vezes básicas, além de estar em ótima condição de
saúde física e mental e saber lidar com pressões.
Os candidatos que querem atuar na organização também escrevem uma carta
motivacional, na qual explicam os motivos pelos quais querem atuar na
organização. Além disso, eles também preenchem um formulário de candidatura, que
muda de acordo com a área de atuação. Após a análise desses documentos, os
candidatos ainda participam de uma reunião informativa, de uma entrevista
individual e de exercícios individuais e em grupo sobre o trabalho da
organização.
Todo esse processo ocorre na sede do MSF, no Rio de Janeiro, e os custos de
transporte e moradia durante esse recrutamento ficam a cargo do candidato.
Depois dessa avaliação, o profissional tem de esperar. E estar preparado.
“Quando ele passa no processo, ele ainda não sabe para onde vai”, explica Ana. E
nem pode escolher para onde vai. “Não sabemos onde pode ser aberto um novo
projeto, então, não dá para escolher”, diz.
Até ser chamado para alguma missão, a organização sugere que o profissional
organize sua vida. "[É preciso] preparar documentos administrativos, fazer uma
consulta médica, tomar vacinas, ler sobre o projeto e sobre o MSF, organizar sua
vida pessoal e profissional para poder sair do Brasil", considerou.
Os ganhos
Não é porque a organização é independente que os profissionais não ganham nada
atuando nela. O profissional começa a receber um salário assim que assina o
contrato para trabalhar em determinada missão. Depois que ele passa no processo,
ele pode esperar de semanas a meses para ser convocado para uma missão. Nesse
período, ele não é remunerado, pois não está prestando serviços para a
organização. Somente a partir do momento em que ele é convocado, ele passa a
receber.
Além do salário, que pode variar muito dependendo da missão e da experiência do
candidato, o profissional do MSF também recebe uma ajuda de custo diária no país
onde ele está, e que varia de acordo com o custo de vida desse país. A
organização ressalta, porém, que o salário não deve ser a motivação principal
daqueles que querem atuar na organização. Além da remuneração, ele também recebe
os seguros (de vida, de saúde, de repatriação, para casos de incapacitação e
roubos de bagagem). E, mesmo após o fim da missão, o seguro saúde ainda valerá
por mais três meses. E todos os custos da missão são pagos pela organização.
Esses, porém, não são os principais benefícios que os profissionais que atuam na
organização ganham. Atuar com situações desfavoráveis gera muitas vezes
frustrações, mas é uma experiência como poucas. “É uma experiência que, com
certeza, transforma”, avalia Ana.
Referência:
InfoMoney
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Autor:
Camila F. de Mendonça
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