Na Antigüidade, mais especificamente na época do Império Romano, era
imprescindível que um cidadão bem formado tivesse em seu currículo a oratória
como matéria básica. Qualquer um que ocupasse um cargo a serviço do Império
deveria ter conhecimento e fazer bom uso de técnicas para falar em público. E
isso não se limitava a políticos e bajuladores palacianos; até o líder de um
pequeno grupo de soldados deveria ter alguma habilidade para se comunicar com
seus comandados e mantê-los motivados. A boa comunicação era fundamental para o
bom andamento do exército.
Hoje em dia essa também é uma atividade cada vez mais requisitada a
profissionais das mais variadas áreas de atuação. Até um contador, que antes se
limitava a distribuir cópias de relatórios e balanços para comentá-los numa
reunião, hoje precisa fazer essa tarefa diante de uma platéia, através de
apresentações de power point, com gráficos e tabelas animadas.
A freqüência com que somos requisitados a falar diante de uma platéia tem
gerado uma procura desenfreada por cursos de técnicas para falar em público.
Isso é maravilhoso por estimular em nossa cultura uma busca pela
revalorização da palavra tão desgastada numa época em que "uma imagem diz mais
do que mil palavras". Apesar de nos tornarmos uma sociedade cada vez mais
áudio-visual, a palavra ocupa um papel fundamental em nossas vidas e jamais
sairá de moda. Basta lembrar que ela foi base de nossa cultura e preservação do
conhecimento nos séculos que antecederam o século XIX.
Hoje em dia, apesar dos recursos de que um palestrante dispõe em suas
apresentações e das telas com design agradável, são os comentários e a relação
das imagens com o conteúdo que fazem a grande diferença. Por mais recursos que
disponha, a habilidade do palestrante é o seu verdadeiro diferencial. Daí a
necessidade de cuidar bem do seu estilo.
Mas o que é estilo? O que determina o estilo de um orador?
A melhor definição que encontrei foi a de um personagem do filme "Crônica de
um amor louco". A produção começa com uma palestra do personagem Charles
Serking, interpretado pelo ator Ben Gazzara:
- Chega de papo furado e vamos direto ao que chamam de arte. Estilo. Estilo é
a resposta de tudo. Um jeito especial de fazer uma tolice ou algo perigoso.
Antes fazer uma tolice com estilo do que algo perigoso sem estilo. Fazer algo
perigoso com estilo é o que eu chamo de arte.
Muitos consideram falar em público como sendo algo perigoso. Quem consegue
fazê-lo com estilo, obviamente o faz com arte.
Uma vez que o ato de falar em público é considerado uma "arte", podemos
pressupor o conhecimento e domínio de técnicas específicas. Qualquer um que as
domine pode ser considerado um orador. Mas isso não significa que ele o faça com
estilo.
Acredito que a diferença esteja no início, quando o aluno procura um curso de
oratória. Como diz um velho ditado: - Bem começado, meio caminho andado. E a
partir desse momento, a diferença estará no conteúdo das aulas.
Considero que um bom curso de oratória deve estimular o aluno a se
autoconhecer e evitar os clichês. Há muitos cursos que ensinam "receitas" de
como falar em público, com tipos padronizados de discursos, onde os alunos
ensaiam posturas e assumem o estereótipo de um orador. O resultado é uma porção
de oradores articulando palavras de maneira carregada, lembrando alguns
locutores de futebol, sorrindo incansavelmente, sem a menor naturalidade,
fazendo o gênero "simpático". Enfim, podem ser comparados a um pelotão de
soldados uniformizados marchando: Eficientes, mas todos iguais.
Nestes anos todos como professor de oratória, a minha busca tem sido
estimular o aluno a ampliar o seu material expressivo, tornando-se ele mesmo,
sem precisar assumir um "tipo" ao falar em público. Procuro dar-lhe
"ferramentas" para trabalhar, ensinando como usá-las. Mas é o aluno quem deverá
descobrir "quando" deve usá-las. Isso nenhum professor de oratória pode ensinar.
Tenho feito isso desde 1993, com excelentes resultados, sempre partindo do
princípio que um bom orador é um ser pensante e dinâmico, que não se apega a
fórmulas rígidas e absolutas no que diz respeito à comunicação. É espontâneo,
tem estilo e graça e não faz nada que destoe de sua imagem natural. Lapidada com
cuidado e carinho.
Ao contrário do que se imagina, falar em público com estilo é muito simples,
mas tudo aquilo que é simples costuma carregar em seu bojo uma certa carga de
complexidade. Daí a necessidade de se auto-observar, fazer um levantamento
constante de suas experiências pessoais, organizando melhor seu repertório de
vida e avaliando as lições extraídas que gerem conceitos, para compartilhar com
sua platéia.
Aí reside o segredo do nascimento do estilo de um orador. A capacidade de
estabelecer uma intimidade com a platéia, como se estivesse batendo um papo com
velhos amigos, se permitindo a dividir com eles seus conhecimentos e vivências.
É claro que uma apresentação bem feita, com imagens bem selecionadas e telas
bem preparadas ajudam - e muito - a ressaltar a qualidade de uma palestra; mas
são meros adornos. São como a moldura de um belo quadro: possuem uma função
específica. São satélites do sol maior que é o orador, pois o ser humano ainda
continua sendo o seu melhor efeito especial.