Ações / Bolsa de Valores - Volatilidade: devem os bancos centrais intervir nos mercados financeiros?
Se o banco central norte-americano tem expressiva influência sobre os
mercados acionários ao redor do globo em momentos de calmaria, em períodos de
tensão, cautela ou volatilidade elevada, qualquer pequeno sinal emitido pela
autoridade monetária mais importante do mundo ganha proporções ainda maiores.
O atual momento de expressiva incerteza dos participantes do mercado acerca da
condução futura da política monetária norte-americana, associado ao nível
substancial de preços dos mercados acionários do globo, leva analistas a
recomendarem, freqüentemente, cautela em relação à volatilidade inerente aos
mercados acionários, sobretudo em vésperas de decisão sobre os juros nos EUA
(como é o caso nesta quarta-feira).
Uma dúvida
Frente à importância e influência do Federal Reserve sobre os mercados de
capitais globais, é razoável questionar-se se a instituição preocupa-se ou toma
decisões motivadas pelo desempenho destes mercados.
Bem, o artigo intitulado "Devem os bancos centrais responder a movimentos nos
preços dos ativos?" (Tradução livre para "Should Central Banks Respond to
Movement in Asset Prices?") parece responder a esse tipo de pergunta. O
artigo, porém, parece merecer alguma atenção, já que foi escrito pelo
chairman do banco central mais importante do mundo.
A sugestão de Ben Bernanke
A julgar pelo artigo de Ben Bernanke, atual presidente do Federal Reserve,
publicado em meados de 2001 quando ainda não ocupava seu atual cargo, a resposta
à questão anterior é não. Em um contexto de metas de inflação, a autoridade
monetária não deve responder à volatilidade nos preços dos ativos, seja esta
causada por uma bolha, seja causada por choques tecnológicos. De acordo com o
artigo, não existem benefícios adicionais significantes para tal comportamento.
A despeito dos Estados Unidos não adotarem um regime explícito de metas
inflacionárias (em que a autoridade monetária determina previamente uma meta de
inflação e trabalha no sentido de converter expectativas e inflação corrente na
direção dessa meta, como é o caso do Brasil), a autoridade monetária
norte-americana trabalha com uma região de inflação "confortável" para a
economia e tem explicitado com freqüência sua preocupação sobre a evolução dos
preços no país.
Com a psicologia dos mercados não se brinca
Neste contexto, segundo o artigo, "mudanças nos preços dos ativos devem afetar a
política monetária apenas à medida que elas afetem as expectativas de inflação
do banco central". Isto é, bancos centrais que trabalham com metas de inflação
não devem responder à volatilidade nos mercados financeiros, exceto quando esta
passa a afetar as expectativas de inflação.
Além das evidências de que políticas agressivas de metas inflacionárias
estabilizam substancialmente a produção e a inflação em períodos de bolhas nos
preços dos ativos ou de choques tecnológicos, Bernanke cita fatores não
contemplados pelos modelos formais que configuram-se como bons motivos para se
preocupar com a interferência da autoridade monetária sobre os preços dos
ativos.
Dentre estes fatores, Bernanke afirma que "(...) (como a história tem mostrado)
os efeitos desse tipo de experiência [intervenções sobre os preços dos ativos]
na psicologia do mercado são perigosamente imprevisíveis", reforçando a
percepção de que a autoridade monetária não deve tentar influenciar o desempenho
dos mercados financeiros.
Ressalvas à parte...
É claro que o fato de Bernanke ter chegado a estas conclusões após a realização
de diversos estudos não garante que, como atual presidente do Fed, ele
tome suas decisões exatamente como acreditava que elas deveriam ser ao escrever
este artigo. Ficou claro também que o artigo refere-se a economias cujo regime é
explicitamente o de metas de inflação (não é o caso dos EUA).
Entretanto, estes fatos não tornam o artigo menos interessante, já que sugere
que, se nada mudou na cabeça do atual chairman e se a inflação é
definitivamente a preocupação central do Fed, uma bolha especulativa ou
volatilidade causadas por choques tecnológicos dificilmente levariam a uma
intervenção da autoridade monetária, a menos que as expectativas para a inflação
estivessem sendo influenciadas.
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