Boa parte das empresas brasileiras é familiar e, entre elas, ainda é pequeno
o número das que têm um processo organizado e planejado para sucessão e
preparação de herdeiros para assumir a gestão.
Sem uma estratégia definida para a passagem de comando, o clima na empresa e
os próprios negócios são fortemente afetados quando surge a necessidade de
preparar o herdeiro para ser o novo CEO (chief executive officer), presidente ou
acionista majoritário.
Um dos principais erros dos empresários é pensar que a sucessão deve ser
preparada apenas em alguns momentos pontuais, como alguns anos antes da
aposentadoria ou em caso de doença do principal executivo.
“É muito importante começar desde cedo essa preparação, sobretudo na educação
sobre como funciona a empresa. Muitos ainda crescem pensando como 'donos' da
empresa, quando esse conceito é um dos que mais atrapalham a sucessão, já que de
dono para acionista, diretor, gerente, há uma grande diferença”, aponta a
diretora da Mesa Corporate Governance, consultorias de governança corporativa,
Josenice Blumenthal.
Para a consultora, essa ideia que predomina entre muitos sucessores – de que
ele vai assumir um negócio como dono – acaba trazendo grandes conflitos,
provocando posteriores dificuldades até de reter talentos dentro da empresa em
função da falta de respeito a determinada hierarquia. “Se o sucessor não estiver
preparado, pode mudar a cultura da empresa de uma hora para outra, provocando
perdas muito grandes”, aponta Josenice.
Preparação
A recomendação da consultora é que o conceito repassado ao sucessor seja o
de acionista, e não simplesmente como dono ou proprietário. Assim, ele entenderá
mais sobre o negócio, e obrigará a si mesmo a desenvolver melhor o
relacionamento com outras pessoas da empresa, tomando decisões municiado de mais
informações, critérios e dados.
Segundo a diretora da Mesa Corporate, embora não exista uma "fórmula" para
sucessão, algumas ações são extremamente importantes na preparação para um novo
sucessor ou herdeiro. “As possibilidades variam de acordo com a empresa, mas é
possível promover programas de trainee dentro da própria empresa, avaliar se
efetivamente, antes de assumir, o sucessor conhece e domina a gestão das
diferentes áreas do negócio e se tem interesse pela empresa e seu ramo de
atuação. Também é recomendado que o sucessor tenha uma preparação, mesmo que
breve, fora da empresa da família, em que ele experimente regras e uma
hierarquia longe de seu ambiente convencional, para que tenha mais conhecimento
sobre o mercado corporativo”, orienta Josenice.
A executiva lembra que muitos pais esperam a continuidade dos filhos em
algumas áreas e negócios, o que muitas vezes não ocorre justamente em função da
falta de interesse dos candidatos a sucessores. “Nesse caso, insistir na
sucessão pode ser um grande erro”, diz Josenice. Embora não haja uma
recomendação específica sobre quanto tempo deve durar a transição, Josenice
orienta que esse processo deve respeitar as particularidades envolvidas e ter um
constante monitoramento.
Critérios
Além das demandas com relação ao próprio sucessor, a consultora alerta para
necessidade de que se estabeleçam critérios mensuráveis de desempenho e
conhecimento da empresa, para que o novo executivo assuma um cargo diretivo com
base na meritocracia, e não apenas no grau de parentesco com o CEO ou
presidente.
“Nem sempre a visão que um pai tem sobre um filho, por exemplo, é a mais
clara, profissional e objetiva possível, já que está acompanhada de vínculos
afetivos”, lembra a consultora.
Outra avaliação importante é sobre os valores da empresa onde o sucessor vai
atuar – além dos próprios valores e tradições familiares. Esses atributos que
vão ditar “o estilo” de administrar uma corporação, e que vão se refletir nas
estratégias de marketing, recursos humanos e finanças.
“Sempre que vamos atuar em um processo de sucessão, fazemos uma avaliação dos
valores da família e da empresa, porque são eles que vão determinar o perfil
para se inserir em determinada corporação. Muitas vezes, sem um conjunto de
valores adequado a uma empresa, a administração pode fracassar, mesmo que o
executivo tenha ótima preparação técnica”, opina Josenice.