Você sabe como
alugar um imóvel?
Ir à caça de um apartamento para alugar é daqueles compromissos que quase
todo mundo, ao menos uma vez na vida, terá de cumprir. A tarefa, que exige
paciência, disciplina e disposição, ficou um pouco mais complicada este ano.
O novo Código Civil vai facilitar a vida do fiador e complicar, por tabela, a do
inquilino. Mais: o índice de correção do valor do aluguel, um detalhe que andava
esquecido nesses últimos oito anos de estabilidade, volta a preocupar.
Quem está planejando procurar imóvel deve ficar atento a mais essa questão.
Fuja de índices como o IGP-M (o índice geral de preços do mercado, calculado
pela Fundação Getúlio Vargas), geralmente usado para corrigir aluguéis. No ano
passado, a variação dele ficou em 25,3%.
A expectativa dos economistas é que neste ano o IGP-M mantenha esse desempenho.
A solução, nesse caso, é recorrer aos índices que calculem a variação de preços
ao consumidor, como o INPC (o Índice Nacional de Preços ao Consumidor, calculado
pelo IBGE) ou o IPC (o Índice de Preços ao Consumidor, da Fipe), que ficaram
abaixo de 15% em 2002.
Para o professor do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas,
Luís Carlos Ewald, sempre é possível negociar. A dica vale principalmente para
aqueles contratos que vencem no começo deste ano. "O inquilino não pode deixar
que o aluguel seja corrigido por um porcentual tão alto. Os salários não
aumentaram tanto", diz.
Ewald sugere, inclusive, que o inquilino ameace sair do apartamento caso o dono
se mostre irredutível. "A negociação será mais fácil para aqueles que pagam o
aluguel em dia", completa Ewald.
Fiador pode desistir das obrigações
A burocracia não termina aí. O novo Código Civil pode ser outra pedra no sapato
do inquilino quando o assunto é fiador.
As normas para o fiador se livrar da fiança ficaram mais flexíveis. Até então,
só era possível ficar livre dessa condição por sentença judicial. Com o novo
Código, basta uma simples notificação ao credor para que o fiador se livre da
sua obrigação dentro de um prazo de 60 dias.
A medida preocupa o mercado imobiliário. Em São Paulo, mais de 60% dos contratos
de locação tem a fiança como garantia.
Se já era difícil conseguir um fiador, imagine agora que ele pode desistir no
meio. Especialista em direito imobiliário, o advogado José Roberto Graiche,
acredita que não será tão fácil para o fiador se livrar da sua responsabilidade.
"É preciso esperar para saber como o Judiciário irá se comportar", avalia.
Nessa hora, vale recorrer às alternativas ao fiador disponíveis atualmente, como
seguro-fiança ou título de capitalização. Elas pesam um pouco no bolso, mas
podem evitar surpresas no futuro.
No seguro-fiança, por exemplo, a seguradora paga o aluguel do inquilino
inadimplente por até 30 meses, dependendo do plano contratado. O morador, por
sua vez, fica sujeito à ação de despejo e de cobrança. O valor cobrado pelo
produto costuma ser de, no mínimo, um aluguel por ano.
O título de capitalização já funciona como uma reserva financeira, sendo que o
locatário pode resgatar o capital investido ao final do período do contrato,
desde que o aluguel tenha sido pago regularmente.
O novo Código também vai forçar o inquilino a ler a convenção do edifício onde
pretende morar para conhecer a multa que é aplicada por atraso no pagamento do
condomínio. O Código limita a multa a 2%, mas ainda não se sabe se o que
prevalece é o que está escrito na convenção.
Diante de tantos problemas - e para evitar novos - a reportagem do JT criou um
manual prático para ajudar você a alugar um apartamento.
1 - A escolha
Antes de iniciar a via-crúcis à procura de um apartamento, estabeleça uma
estratégia, sempre tendo em mente as suas necessidades.
O preço - Comece definindo o valor que você está disposto a pagar pelo
aluguel. Os especialistas no assunto recomendam que as despesas com moradia não
ultrapassem um terço da renda bruta da família.
Por isso é importante conhecer o valor do condomínio e do IPTU antes de tomar
qualquer decisão. O zelador do prédio pode ser uma boa fonte de consulta para
saber se os valores não variam muito.
O número de quartos - Qualquer corretor também vai questionar sobre o
número de quartos. A informação ajuda esses profissionais a selecionar um
imóvel, mas não é preciso se limitar a um número específico.
Se você quer um apartamento de dois quartos, por exemplo, nada impede que você
também visite um de três dormitórios. A diferença pode não pesar tanto no bolso.
E há casos em que um apartamento de três quartos pode ficar até mais em conta do
que outro menor.
O número de garagens - O mesmo não se pode dizer do quesito número de
garagens. A maioria dos apartamentos com duas garagens tem um aluguel mais caro.
Isso sem falar no IPTU, que costuma ser cobrado separadamente.
A área de lazer - O fato do prédio ter ou não uma área de lazer pode
dizer muito sobre os seus moradores.
É claro que existem exceções, mas esse é o tipo de lugar onde será difícil
encontrar uma concentração maior de crianças.
A opção deve ser levada em conta principalmente para quem tem filhos. E,
lembre-se, a área de lazer nem sempre é o que mais encarece o condomínio.
A região - Por último e não menos importante, delimite a região de
procura. O bairro, de preferência. A cidade é muito grande e qualquer um
desistiria no meio do caminho.
2 - A busca. Reserve tempo
Com toda aquela carga de informações, você já pode se preparar para a segunda
parte da procura.
Consulte os anúncios - Procure nos classificados de imóveis de jornais e
da internet ou ligue para uma imobiliária de sua confiança. Um bom dia para
fazer a consulta aos anúncios de jornais é o domingo.
Recorrer aos amigos e colegas de trabalho pode funcionar. Se algum deles mora na
região de sua preferência, peça que eles procurem algum na vizinhança.
Entre uma visita e outra na companhia de um corretor, uma boa estratégia de
busca é ficar atento às plaquinhas de "Aluga-se" colocadas nas casas e prédios.
Você pode dar a sorte de encontrar as chaves ali mesmo e pedir ao zelador para
visitar o apartamento escolhido.
Concentre as visitas - Reserve o fim de semana ou tire uma manhã de folga
para iniciar a caça. Se for possível, concentre o máximo de visitas em um só
dia. Nunca insista em conhecer o apartamento à noite. A visita pode ser em vão.
A energia geralmente fica cortada enquanto o apartamento não é alugado.
Faça anotações - E não se esqueça de levar um caderninho para fazer as
anotações sobre cada apartamento, detalhando os aspectos positivos e negativos
de cada um.
Essas informações podem ajudar muito na hora da escolha. O excesso de visitas
pode facilmente trair a sua memória.
3 - A visita. Atenção aos detalhes
Nesse assunto, a primeira impressão não é a que fica. Você pode olhar um
apartamento em um dia e no outro já ter se esquecido de como ele era.
A conservação - Preste atenção na pintura, pisos, portas, janelas,
armários e móveis (se houver). Algumas coisas podem ser consertadas sem muito
custo e isso até pode ser negociado com o proprietário.
Os armários - Fique atento à quantidade de armários nos quartos, na
cozinha e no banheiro. Aproveite para abrir todos eles e veja se não exalam
cheiro de umidade. Abra e feche janelas e portas para verificar se elas
emperram. Algumas vezes isso pode ser apenas falta de uso.
Pergunte ao zelador - O encanamento e a parte elétrica são difíceis de
ser conferidos, a não ser que o interessado conheça bem o assunto. A dica é
perguntar ao zelador. Talvez ele conheça mais do que o próprio corretor sobre a
situação do imóvel.
O gás e o chuveiro - Não se esqueça de verificar se o gás é encanado ou
não. Existem apartamentos relativamente jovens em São Paulo que não possuem gás
encanado. Saber se o chuveiro é à gás faz diferença, sobretudo na conta de luz.
A iluminação - É bom que o apartamento seja bem iluminado, principalmente
em lugares de pouca ventilação, como o banheiro. Recomenda-se que o apartamento
tenha "face" norte, nordeste ou noroeste.
Para saber a localização do seu, coloque o braço direito na direção em que o sol
nasce. À sua frente, estará o norte e às suas costas, o sul.
O barulho - Durante todo o tempo, fique ligado no barulho. Apartamentos
de fundos e em andares mais altos costumam ser silenciosos, a não ser que haja
playground. Em prédios construídos em ladeira, cuja mão é subida, corre-se o
risco de ouvir barulho de carro engrenado a noite toda.
A vizinhança - Antes de sair, não se esqueça de reparar na limpeza do
prédio. Aproveite para conversar com algum morador ou com o zelador para tentar
extrair alguma informação sobre a rotina do prédio. Outra dica: prédios em que a
maioria dos apartamentos é habitada por proprietários costumam ser mais bem
cuidados.
Faça tudo isso, claro, somente se gostar do apartamento. Aproveite e ande pela
vizinhança para conhecer a infra-estrutura de padarias, supermercados, escolas,
pontos de ônibus e táxi.
4 - A negociação. É preciso paciência
Poucas pessoas têm esse dom. Mesmo quem não tem paciência ou não tem a menor
habilidade para barganhar, vai precisar entrar em acordo antes de fechar um
negócio.
Afinal, você não ficará livre do proprietário antes do prazo contratual, a não
ser que esteja disposto a pagar uma multa.
O prazo - Por lei, o prazo de contrato de locação para pessoa física deve
ser de 30 meses. Mas é possível negociar um prazo menor para que o inquilino
desocupe o imóvel sem pagar multa, sendo necessário apenas avisar 30 dias antes.
Pechinche sempre - Sempre tente baixar o valor do aluguel, pois esse é um
ponto sempre negociável. Se a pintura não estiver bem feita, deixe claro que
você não precisará fazer uma nova quando deixar o apartamento.
As reformas - A troca do piso costuma render algumas horas de conversa. O
proprietário pode se mostrar irredutível, mas nunca deixe de perguntar se ele
pode bancar pelo menos metade dessa pequena reforma.
Quem paga o quê - Existem casos em que o inquilino pode até delimitar o
quanto vai pagar pelo condomínio, por exemplo. E toda vez que esse valor for
extrapolado, o dono banca os extras.
O IPTU, por exemplo, é responsabilidade do dono e o inquilino só deve pagá-lo se
isso estiver no contrato.
5 - A hora de fechar contrato
Essa é a parte mais burocrática e que pode colocar em risco todo o esforço
anterior.
Releia sempre - Ler mais de uma vez para checar se tudo o que ficou
combinado entre você e o dono está escrito no contrato.
Vistoria - É no contrato que o raio-X do apartamento estará descrito. Por
isso não deixe de acompanhar a vistoria feita pelo corretor. Omitir o estado de
conservação de uma pintura, por exemplo, pode trazer prejuízos futuramente.
Se a pintura não estiver boa, o inquilino não deve refazê-la ao entregar as
chaves, a não ser que a informação sobre o seu estado não esteja explicitado no
contrato.
O fiador - A imobiliária não pode pedir mais de uma garantia locatícia
(fiador, seguro-fiança ou depósito). Verifique também se é o proprietário quem
está assinando o contrato. Caso contrário, o responsável deve ter procuração
para isso.
O índice de correção - Todo contrato é corrigido anualmente por algum
índice que mede a inflação. À primeira vista parece um detalhe, mas pode pregar
uma peça nos mais desavisados. O IGP-M, por exemplo, é um dos mais altos e não
costuma acompanhar o custo de vida de quem é assalariado.
As despesas contratuais - Por último, não assuma as despesas relativas ao
contrato. Elas devem ser bancadas pelo proprietário. Contrato pronto, checado e
assinado: as chaves agora são suas.