O sonho de muitos profissionais é ter uma experiência no exterior, morar em
um país desconhecido por tempo suficiente para absorver sua cultura, conhecer
pessoas interessantes, vivenciar o dia-a-dia delas e ganhar fluência em outro
idioma. Mas poucos têm essa oportunidade enquanto estudantes, por uma questão
financeira. Fazer intercâmbio ainda é privilégio de quem tem maior poder
aquisitivo.
Não raro, quando o profissional já está formado e estabelecido no mercado de
trabalho, a vontade ressurge e, com ela, a oportunidade, uma vez que o salário
pode então permitir a viagem. Daí aparece o dilema: "devo largar o emprego para
realizar o sonho?"
A pergunta não é em vão. É pertinente questionar como se dará a recolocação no
mercado de trabalho na volta ao país de origem, bem como se existirão ganhos não
só pessoais, mas também profissionais. O diretor da Robert Half, Fernando
Mantovani, avalia que isso depende do objetivo de carreira do profissional e da
forma como esta está sendo construída.
"Ganhar fluência em outro idioma é coerente se o mercado de atuação do
profissional exigir essa competência. A questão é que ele deve ponderar se é
necessário, se o intercâmbio fará efetiva diferença na carreira, considerando
que terá de se afastar do emprego atual por certo período", explica.
Mantovani acrescenta: "É imprescindível questionar ainda os riscos que essa
decisão implica e a situação financeira do intercambista. Ele precisa ter uma
reserva de dinheiro, já que é possível que demore algum tempo até que consiga um
emprego, ao voltar à terra natal".
Risco calculado
O importante, quando se toma esse tipo de decisão, é ter consciência tanto dos
ganhos profissionais quanto dos riscos envolvidos. Riscos estes que precisam ser
calculados.
Por exemplo, o executivo de uma grande empresa tem a oportunidade de fazer uma
MBA (Master Business Administration) no exterior. Ao topar esse desafio, ele
ganhará muito: voltará fluente em outro idioma, realizará o sonho de viver em
outro país e ainda crescerá profissional e pessoalmente. Por outro lado, será
que, ao voltar, conseguirá uma vaga no mercado de trabalho em um cargo
executivo? Ou seja, será que ele terá de descer alguns degraus, apesar do ótimo
currículo?
O diretor de Inovação e Tecnologia da AAPSA (Associação Paulista dos Gestores de
Pessoas), Guilherme Françoso, que também atua como gerente de Planejamento
Estratégico da Proativa Recursos Humanos, conta a história de um membro de sua
equipe que passou por um dilema parecido.
Ele trabalhava com Françoso, quando surgiu a oportunidade de ir ao exterior.
Decidiu arriscar e pediu demissão da empresa onde trabalhava. Passou três anos
fora, morou em lugares como Londres e Paris, realizou uma especialização em
marketing e conseguiu estagiar em um grande jornal, permanecendo na área de
formação. Quando voltou, a antiga empresa na qual trabalhava decidiu contratá-lo
novamente.
"Foi de interesse da empresa trazê-lo de volta. É interessante observar que eu o
conheci antes dessa experiência e pude ver sua evolução. Ele voltou mais maduro,
ponderado e um profissional mais competitivo", lembra o especialista em Recursos
Humanos. A diferença é que, quando deixou o Brasil, esse profissional era
analista de Marketing. Ao voltar, já ganhou o cargo de coordenador de Marketing.
Será que, se não tivesse se arriscado, estaria hoje tão bem posicionado? Essa é
uma pergunta a ser feita.
Caminho certo?
Segundo Mantovani, o importante é a experiência estar de alguma forma
relacionada aos objetivos maiores de carreira do profissional. Já a decisão deve
levar em conta a situação atual dele no mercado.
Supondo que um executivo que ganha um salário que considera ótimo esteja
pensando em morar um tempo no exterior. Neste caso, o diretor da Robert Half
acredita que será necessário escolher entre ficar no Brasil por causa do status
atual e do salário, ou ir para fora por uma necessidade pessoal - pela vontade
de realizar um sonho e de crescer enquanto pessoa.
Não há um caminho certo. Depende do que cada um considera mais importante. "Há
quem coloque o salário em primeiro lugar. Ou o status", explica ele, ao lembrar
que, por outro lado, existem pessoas que dão mais valor à experiência de vida.
Inúmeras pessoas têm por hobby principal conhecer culturas, pessoas e lugares
diferentes. Elas fazem de tudo para viajar e nunca perderiam uma oportunidade
dessas. Pois bem, não estão erradas. "É uma experiência nova, que possibilita
expandir os horizontes".
Competitividade relativa
Uma opção para essas pessoas é tentar permanecer na área de atuação, bem como
procurar cursos para fazer no exterior que estejam alinhados com seus planos de
carreira. Um ponto negativo a ser considerado é a possibilidade de retornar ao
país de origem totalmente desatualizado. De qualquer forma, Mantovani garante
que o importante é evitar decisões não planejadas, inclusive levando em conta as
finanças.
Para Françoso, da AAPSA, a decisão dependerá do contexto no qual a pessoa vai
para fora, principalmente se ela já ocupa um cargo hierárquico mais alto aqui no
Brasil. "Não dá para largar tudo para fazer mochilão, sem saber ao certo o que
irá fazer", afirma. "Também não dá para ter experiências menos complexas, em
termos profissionais, quando se tem um diploma", opina.
Ele finaliza lembrando que a experiência internacional pode de fato tornar o
profissional mais competitivo no mercado de trabalho. Mas ressalta que essa
competitividade é relativa. "Conheço pessoas que foram para o exterior,
estudaram e, quando voltaram ao Brasil, retornaram às mesmas empresas onde
trabalhavam, nos mesmos cargos, quando poderiam conseguir oportunidades bem
melhores. Elas não souberam tirar proveito da experiência a que tiveram acesso.
Então, a competitividade é uma questão relativa".