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Carreira / Emprego - A indústria da recolocação 

Data: 11/12/2008

 
 

A história é quase sempre a mesma. Um dia qualquer, o telefone toca. Do outro lado da linha, alguém diz ter uma oportunidade perfeita para você. Melhor ainda: com um salário bem maior que o atual. Feliz da vida, você vai para a entrevista. Intimamente, pensa: 'Finalmente alguém reconhece o meu potencial'. O escritório passa credibilidade pela localização nobre.

É um espaço atraente e bem decorado. Na conversa pessoal, o consultor carrega no tom de urgência para preencher a vaga. Tudo precisa ser resolvido ali, na hora. É pegar ou largar só que a vaga tem um preço: a compra de serviços de consultoria de carreira.

O passaporte para o emprego perfeito não é mais o seu currículo. É o seu cartão de crédito.

O relato acima sintetiza um tipo de venda que tem alimentado uma grande e rentável indústria no mercado de trabalho brasileiro a das empresas de recolocação profissional. Trata-se de um tipo de negócio que promete ajudar profissionais de todos os quilates a arrumar um novo emprego. Para isso, cobram por serviços como adequação de currículo, treinamento para entrevista e realização de testes psicológicos. O problema não é o conceito por trás dos serviços oferecidos a consultoria de carreira, mas como essas empresas captam clientes, vendem e prestam serviços e como dão o atendimento no pós-venda. Além disso, a realidade mostra que se trata de um negócio de baixíssima taxa de sucesso e o cliente só fica sabendo disso por conta própria. Somente três de cada dez clientes conseguem emprego por meio dos serviços de uma das principais consultorias do ramo, a Dow Right Recursos Humanos, de São Paulo. O dado é de Sérgio Silva, diretor de relações públicas da empresa.

Os profissionais atendidos por esse tipo de empresa têm boa qualificação acadêmica. São executivos, profissionais liberais e técnicos. Eles compõem um quadro típico de momentos de crise econômica. A taxa de desemprego no país é de 7,5%, de acordo com o IBGE um crescimento de 70% em sete anos. Enquanto isso, o desemprego entre pessoas com 12 anos ou mais de escolaridade aumentou 81% no mesmo período, diz o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Tradução: está cada vez mais difícil, mesmo para pessoas bem preparadas, manter-se no emprego.

Quem passa pelo desemprego sabe que esse é um momento delicado na vida. Nessa situação, o profissional está emocionalmente frágil, financeiramente apertado e socialmente excluído. 'Quem paga às empresas de recolocação é porque passa por um misto de desespero e medo com falta de informação', diz Moacir Carlos da Silva, professor de pós-graduação em psicologia social e do trabalho do Instituto Sedes Sapientiae, da Universidade de São Paulo. O consultor Gutemberg Macedo, que atua com outplacement desde 1979, mas só atende clientes enviados por ex-empregadores, tem uma explicação para a multiplicação desse tipo de negócio. 'A proliferação dessas empresas é muito similar ao crescimento das organizações religiosas. Ambas oferecem amparo à pessoa que está num momento de baixa auto-estima e se sente abandonada', diz.

O preço da desinformação

Os profissionais que buscam ajuda nesse tipo de empresa repetem quase sempre o mesmo roteiro: recebem promessa de vaga que não existe; compram serviços que vão ajudar a obter uma recolocação que nunca acontece; encontram um serviço padronizado no qual obtém a promessa de tratamento individualizado. Pagam mais de 1 000 reais por um serviço que pode ser feito por menos de 1 real: colocar o próprio currículo no correio. 'Eu estava desempregado e não dispunha de recursos para arcar com uma despesa tão alta', diz o economista Paulo José Bastos, de 29 anos, ex-cliente da Dow Right. 'O vendedor tranqüilizou-me informando que, com minha experiência e escolaridade, a recolocação ocorreria em pouco tempo', diz. Bastos trabalha atualmente na Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos (Amcham), em São Paulo, graças a seu esforço pessoal.

O artigo no 39 do Código de Defesa do Consumidor, relativo a práticas abusivas, protege clientes nessas circunstâncias. Seu inciso IV tem a seguinte redação: 'É vedado ao fornecedor de produtos e serviços prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços'. No Procon de São Paulo, as reclamações de clientes insatisfeitos com consultorias de recolocação crescem ano a ano. Em 1999, quando o serviço passou a ser computado, foram 475 consultas e 108 reclamações. O número cresceu para 1 009 consultas e 278 reclamações no ano passado. Os principais problemas detectados pelo Procon-SP são serviços não fornecidos ou sem qualidade e com publicidade enganosa.

No Tribunal de Justiça de São Paulo, pelo menos 356 pessoas aguardavam julgamento de processos contra 19 empresas de recolocação (veja gráfico 'Os clientes reclamam') no dia 15 de janeiro. No topo da lista, com 63 processos, estava a Dow Right. Graças a uma estratégia legal de fazer acordos com os clientes que reclamaram na Justiça, a empresa reduziu esse número para 33 no dia 24 de março. Já o site do TJ registrou a entrada no mês passado de dez novos processos contra a consultoria. A mesma empresa é ré em dois processos da Promotoria de Justiça do Consumidor do Ministério Público. Já o Procon-SP registrava no dia 25 de março 20 reclamações. As denúncias contra a Dow Right e outras empresas similares mostram que há um padrão de ação nesse mercado. Vejamos:

1. A captação ativa do cliente é o que alimenta as empresas do ramo. Uma forma de chegar ao potencial comprador é por meio de anúncio em jornais. Eles funcionam como chamariz para que profissionais enviem seus currículos ou liguem para a empresa. Outra fonte são os bancos de currículos de outras empresas e entidades de classe. Profissionais de tecnologia, por exemplo, tornam-se alvo quando colocam seus dados no site da Associação dos Profissionais de Informática (Apinfo). Qualquer pessoa (sem senha) tem acesso a informações como nome, telefone e e-mail de quem lá se inscreveu.

2. Na hora da venda, o marketing é bastante agressivo principalmente quanto à urgência para agendar a entrevista. Isso tem levado inúmeros clientes a afirmar em juízo que receberam por telefone promessas de vagas que iriam ser preenchidas em poucos dias e, por isso, a entrevista deveria ser agendada a toque de caixa. O administrador de empresas Roberto Carlos da Cruz (confira quadro acima), por exemplo, pagou a três empresas que, segundo ele, prometeram vaga de executivo na área de saúde. 'Em todas ouvi que havia uma vaga que se encaixava no meu perfil, mas tínhamos de correr com o processo, senão eu ficaria de fora', diz. Cruz pagou às empresas Paruziah, Prime e Jerdi, todas com escritórios na capital paulista. 'Após um ano e meio, continuo sem emprego.' Marcos Possari, presidente da Prime Perfil Profissional, que atua desde 1993 somente em São Paulo, diz que não vende vaga. Vende serviços. 'Nós buscamos empresas que estejam interessadas no perfil do nosso cliente', diz. 'É um trabalho personalizado.' Já o sócio da Paruziah, Raxidi Saleh, vai mais longe. 'Não tenho kit de recolocação. Não faço milagre porque o sucesso de meu negócio depende do profissional e do mercado', diz. Saleh afirma que cerca de 25% de seus clientes terminam empregados num prazo de nove meses. O empresário diz que todos os dias atende alguém com mágoa em relação a alguma empresa de RH. A solução para ele seria a criação de um órgão regulador do setor. 'Eu sei que há empresas boas no mercado e outras que estão se prostituindo. Tem de haver um órgão que regulamente as empresas de recursos humanos', diz. 'Hoje, qualquer elemento abre uma consultoria.'

3. As vagas prometidas em geral não existem. Assim como Cruz, a maioria dos clientes dessas empresas aceita marcar a entrevista depois de ouvir ao telefone que haveria uma vaga certa para eles. Por ser resultado de uma promessa verbal, é muito difícil provar que a garantia foi feita. O arquiteto Valdir Gomes Moraes, de 43 anos, de São Paulo, é uma exceção. Quando comprou os serviços da Dow Right, por 1 800 reais, ele conseguiu um documento que raramente é fornecido: a lista das empresas que supostamente teriam vaga para ele. Sem nenhuma entrevista agendada após um mês, Moraes resolveu conferir se seu currículo havia sido enviado às empresas. Ficou surpreso com a resposta. Quatro empresas, entre elas a Folha da Manhã, que publica o jornal Folha de S.Paulo, e a administradora de cartões de crédito American Express, afirmaram que nem sequer contratavam arquitetos.

O caso de Moraes aconteceu porque as empresas de recolocação têm como padrão enviar currículos indiscriminadamente sem a contrapartida da vaga. Chamam a isso de 'prospecção'. A história abaixo exemplifica essa prática. Em novembro de 2000, Accor, BankBoston, Bradesco, Chubb Seguros, Citibank, Lojas Renner, Motorola e Redecard receberam o currículo de pelo menos dez clientes da Dow Right com a rubrica 'prospecção'. Segundo o manual de 'normas e procedimentos gerais' da Dow Right, obtido por VOCÊ S/A, 'prospecção' é sinônimo de 'encaminhamento sem a vaga'. Ex-funcionários da Dow Right, que preferem o anonimato por medo que seu vínculo com a empresa manche seu currículo, afirmam que esse é um procedimento comum. Mesmo quando há uma vaga, o tratamento em massa se repete. 'Eu vi 50 currículos ser reunidos num pacote e despachados para uma única vaga', diz uma psicóloga que trabalhou dois meses na consultoria. Essa prática irrita as empresas. O BankBoston chegou a devolver à Dow Right um pacote de currículos com carta em que pedia para não ser mais incluído nesse tipo de mailing. A Dow Right afirma que capta as vagas nas empresas e muitas delas seriam exclusivas de seus clientes.

4. O serviço de pós-venda é alvo de reclamação constante. A mais comum: clientes e ex-clientes se dizem esquecidos assim que participam das atividades previstas no contrato. Em geral, já no primeiro dia são submetidos a testes psicológicos e fazem a composição do currículo. Nos dias seguintes, sempre em regime de urgência, tomam parte de dinâmica de grupo e treinamentos diversos. A pressa tem um motivo: contratos assinados pessoalmente podem ser cancelados dentro de uma semana mas, se os serviços foram prestados, fica mais difícil discutir a rescisão. Além disso, o vendedor só receberá seu salário variável se o cliente cumprir o contrato. 'Acabei os benditos cursos cinco dias depois para que o processo andasse o mais rápido possível. A partir daí, acabou o interesse por mim', diz o engenheiro de alimentos Daniel Ferreira, de Campinas, no interior de São Paulo. 'Ninguém atendia o telefone e minha headhunter nunca estava lá.' Ferreira, que tem diploma pela Unicamp, pagou 1 600 reais à filial da Dow Right do ABC, em Santo André. Outra reclamação freqüente é a ausência de controles sobre quem é ou não cliente. Por causa disso, há reincidência de telefonemas para profissionais que já estão pagando pelo serviço. 'A mesma empresa contatou-me várias vezes depois que eu já era cliente', diz o administrador de empresas João Francisco Vitali, de São Paulo.

As reclamações acima são resultado de um modelo de negócio baseado na quantidade de clientes que atrai não no serviço que presta. 'Elas ganham com a venda do sonho', diz o advogado Josué Rios, de São Paulo, especialista em direito do consumidor, autor do livro Guia dos Seus Direitos (editora Globo). Essa estratégia de venda em massa pode ser compreendida quando nos aprofundamos no funcionamento da Dow Right. VOCÊ S/A obteve com exclusividade dois documentos que mostram que os clientes podem ter razão em suas denúncias. O primeiro, 'Script venda ativa', leva a assinatura de Christiane Vanessa Deffune, dona e gerente comercial da Dow Right. Trata-se de um passo-a-passo para ser usado ao telefone com potenciais clientes. Segundo o documento, o consultor deve perguntar por que o profissional está buscando uma nova colocação. 'Se o motivo é salário, propor salário acima do que ele recebe mensalmente', recomenda. Mais adiante, no item 4, Christiane sugere perguntar qual a situação financeira do potencial cliente. E diz (os erros de português foram mantidos em nome da fidelidade à transcrição): 'O trabalho de agendamento é como uma pré-venda, temos que detectar o real potencial de nosso futuro comprador (...) nem traga este cliente sem condições financeiras na consultoria se não é perda de tempo'. O segundo documento contém 38 passos a ser seguidos durante a entrevista pessoal. Segundo o item 8, o funcionário deve dizer: 'Eu atendo empresas em todo o território nacional, e no exterior. (...) Tenho filial em Nova York'. A filial, segundo o diretor Sérgio Silva, será inaugurada no final de 2003.

Um negócio em família

A Dow Right não é a única empresa de recolocação profissional do mercado. Só em São Paulo, VOCÊ S/A listou 25. O que a destaca são suas contradições. Uma delas reside na idade da própria empresa. No dia 20 de fevereiro, seu website afirmava que a empresa está 'há mais de 12 anos no mercado de recursos humanos'. Seu registro na Junta Comercial de São Paulo, porém, apresenta 14 de maio de 1999 como a data de sua constituição. Ainda fará, portanto, quatro anos. Oficialmente, a Dow Right também afirma não ter nenhuma ligação comercial com a Alphalaser Consultoria em Recursos Humanos. Seu único vínculo seria o parentesco entre os donos. A Alphalaser foi fundada em 15 de abril de 1994 por Carlos Roberto Deffune e sua mulher, Rosane Aparecida. Eles são pais de Christiane, dona de 90% da Dow Right.

Quem manda nas duas empresas, no entanto, é o patriarca da família. Deffune controla pessoalmente o escritório da Alphalaser na capital fluminense, para onde viaja com freqüência. Ex-funcionários afirmam que Christiane, uma jovem psicóloga, embora acionista majoritária, atua principalmente como gerente-geral de vendas na sede. Seria, ainda, uma das mais eficientes vendedoras. Sua mãe é a diretora administrativa e financeira e dá expediente no mesmo local. Os anúncios publicitários da Dow Right também dão uma pista da ligação íntima entre as duas empresas. A Dow Right chegou a afirmar em alguns deles ter cinco unidades, incluindo as de São José dos Campos e Rio de Janeiro. Seu cadastro na Junta Comercial registra a existência somente das filiais de Campinas, Santo André e Curitiba. A Alphalaser, essa sim, possui filiais no Rio de Janeiro e em São José dos Campos, além da sede na avenida Paulista.

A Dow Right, embora jovem, cresceu rápido. Tem faturamento estimado em 8 milhões de reais por ano. Seu website informa que a empresa já assessorou 47 750 profissionais. Ativos seriam 5 000 em dezembro, segundo Sérgio Silva. Para os executivos da empresa, os processos na Justiça e as reclamações no Procon são parte pequena diante do total de profissionais assessorados e felizes. Os serviços prestados pela Dow Right têm índices de satisfação 'entre 70% e 80%', segundo Silva. Ele rebate as reclamações com um dossiê de 300 páginas favorável à consultoria. Contém reportagens de revistas e jornais, depoimentos de clientes satisfeitos e de empresas que utilizaram seus serviços. A maior dificuldade na recolocação dos clientes, afirma o executivo, é o perfil do candidato. 'Ele busca a assessoria, mas não consegue se colocar porque não é qualificado', diz Silva. Experiência profissional pouco diversificada e idade acima de 35 anos seriam os principais entraves.

A Dow Right admite que possui clientes insatisfeitos. Gisela Kelly Ferreira, gerente de outplacement, em São Paulo, tem duas explicações para o fato. O primeiro seria um ruído na comunicação empresa-cliente. Segundo ela, sua política de qualidade exige que cada cliente seja encaminhado para no mínimo dez empresas. 'Só que, quando você fala isso para o cliente, o que ele imagina? Dez entrevistas. Entendeu? A forma que você fala. Você tem de tomar muito cuidado com aquilo que fala', disse Gisela Kelly a VOCÊ S/A em dezembro passado. O segundo problema seria o mau cliente. 'O valor é parcelado em quatro vezes. Então, tem gente de má índole que quer se recolocar, mas não quer pagar', afirma Gisela.

Na verdade, a Dow Right tem outros problemas além dos apontados por Gisela Kelly. E começam muito antes de o cliente pisar em seu arrojado escritório de 500 metros quadrados instalado no coração financeiro do país, a uma quadra da poderosa Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Entre eles está sua relação comercial tortuosa com empresas que poderiam alimentar seu banco de vagas. Num de seus folders recentes, a Dow Right relacionou 66 empresas como suas principais clientes. VOCÊ S/A consultou 40 delas. Vinte e três responderam: nenhuma confirmou o vínculo com a Dow Right. Organizações citadas no folder da consultoria, como Johnson & Johnson, Itaú, Citibank, Scania e Lucent, negaram ser seus clientes. 'As empresas são enormes, nem sempre sabem que colocamos gente lá', explicou a gerente Gisela Kelly. Durante entrevista com Sérgio Silva, VOCÊ S/A solicitou dois nomes de atuais parceiras da Dow Right. Ele alegou sigilo e afirmou que comprovaria o vínculo na hora adequada.

Movidos a resultados

As contradições apresentadas pela Dow Right dizem muito sobre o estilo de negócio montado por Carlos Roberto Deffune, engenheiro mecânico formado pela Universidade Federal do Paraná. Deffune tem veia de empreendedor. Foi dono da Engesoft Recursos Humanos e Informática, que, em 1996, mudou a razão social para Alphalaser. Não gosta de aparecer. Toda vez que a empresa é requisitada a dar entrevistas, quem costuma falar são os executivos abaixo dele. Procurado com insistência por VOCÊ S/A, Deffune encaminhou o pedido de entrevista a seus advogados e assessores e nunca falou (veja o quadro 'Entenda o caso da censura'). O executivo não parece ser de muita conversa nem mesmo com os funcionários. Prefere estabelecer metas, remunerar quem dá resultados e punir quem não dá. Recentemente, ameaçou com multa funcionários que faltaram ao trabalho no sábado. Ex-funcionários relatam que ao receber ligação do patrão deveriam reconhecer imediatamente quem estava do outro lado da linha. Caso contrário, era bronca certa. 'Ele tem visão de mercado. Não é má pessoa', diz uma psicóloga que trabalhou com os Deffune.

Todos os dias Deffune reúne a equipe na área central da sede da Dow Right. Na sua ausência, assume seu lugar a mulher ou a filha. O objetivo é repassar a agenda do dia. Os vendedores, ali chamados de consultores, precisam, por exemplo, apresentar uma lista mínima de dez entrevistas com novos clientes. Quando a reunião termina, eles têm pressa de cumprir a agenda por isso muitos não aceitam o convite para participar do culto evangélico que a família Deffune organiza toda manhã. Sua remuneração mensal dependerá de quantos contratos eles venderem. O fixo de 800 reais pode ficar bem gordo com comissões que começam em 5% do valor do contrato. 'Tem consultor que ganha 6 000 reais por mês', diz um vendedor da Dow Right que, quando falou a VOCÊ S/A, estava a caminho de perder o emprego por não atingir a meta de cinco vendas semanais. 'Os que mais faturam são aqueles que vendem geladeira para esquimó', diz. Segundo ele, é proibido falar em vagas, mas seus colegas usam outro artifício, empregando uma frase com duplo sentido: 'Existem empresas interessadas no seu currículo'. Esses jovens e ambiciosos vendedores devem fazer com que o cliente assine o Contrato HeadHunting de Prestação de Serviços. Nele, a Dow Right se compromete a prestar serviços de consultoria de carreira, tarefas entregues aos headhunters. Essa equipe é formada por jovens psicólogos cujo trabalho é encaminhar currículos e conseguir entrevistas para os clientes. Não é uma função fácil. 'Trabalhei lá dois meses e não empreguei ninguém. Quando apareciam as vagas, eu não conseguia me lembrar do perfil dos candidatos porque cuidava de uns 200', diz uma psicóloga que trabalhou na sede. 'Uma amiga teve mais sorte: ficou lá seis meses e empregou três pessoas.'

Para fazer seu trabalho, os headhunters dependem das vagas encaminhadas pela área de captação. Ex-funcionários afirmam que, para chegar à lista de empregos disponíveis, as fontes principais são jornais e sites de empresas concorrentes, como Manager, Catho e Banco Nacional de Empregos. 'A Dow Right se cadastra nos sites e copia as vagas. Se a Catho tem uma vaga para gerente de qualidade, a Dow Right envia os currículos de seus clientes para essa vaga. Mas não pode dizer o nome da empresa porque a vaga não lhe pertence', diz outro ex-funcionário.

Clientes e ex-funcionários afirmam que a Alphalaser adota as mesmas práticas da Dow Right. A executiva Patrícia Guerra pagou 1 300 reais pelos serviços de recolocação da Alphalaser no Rio de Janeiro. 'Em um ano, nunca fiz uma entrevista. Fui jogada de galho em galho lá dentro. Depois de meses, descobri que não havia nenhum headhunter trabalhando no meu currículo', diz Patrícia. Ela conta ainda que, após formalizar a reclamação, a Alphalaser ampliou a vigência do contrato. 'Nada adiantou, falei, reclamei, pedi ajuda. Cansei de ligar para lá a troco de nada.'

A família Deffune já teve outras dificuldades em satisfazer o consumidor. Em 1998, a empresa Moeda Comércio e Representações de Produtos Naturais, de Martinópolis, no interior paulista, foi chamada na Procuradoria de Justiça do Consumidor do Ministério Público. Os sócios, Carlos Roberto Deffune e sua irmã Maria Elena, assinaram um termo de ajustamento de conduta no qual se comprometeram a 'não mais veicular publicidade de sua responsabilidade' que pudesse vir a 'induzir o consumidor em erro'. A Moeda comercializava o remédio Ervamatin com a promessa de evitar queda de cabelos. O mesmo Ministério Público abriu processo contra a Dow Right em 2001 por causa de uma cláusula de seu contrato. A empresa exigia o pagamento de 40% do primeiro salário de todo cliente que encontrasse emprego durante a vigência do contrato mesmo que tivesse obtido a vaga por outras fontes. Em novembro daquele ano, a empresa assinou no Ministério Público um Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta pelo qual se comprometeu a mudar o contrato. Agora, só cobra a taxa de sucesso daqueles que se empregam graças aos esforços da empresa.

Ambigüidades

Legalmente, pelo contrato que assina com os clientes, a Dow Right não tem obrigação de conseguir emprego para eles. É o que os advogados chamam de 'contrato de meio', pelo qual o fornecedor garante que fará de tudo para que o cliente atinja seu objetivo. Nesse caso, um emprego. Mas não garante a vaga, já que esta não lhe pertence. É ao mesmo tempo um contrato de adesão, aquele em que o consumidor não pode negociar nenhuma cláusula. O contrato já vem escrito, pronto para ser assinado. Tudo isso é previsto em lei. 'Entretanto, todo contrato de adesão precisa ser redigido em termos claros, destacar as cláusulas que limitam os direitos do consumidor e não deixar brechas para ambigüidades', afirma o advogado Marcos Diegues Rodriguez, do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), em São Paulo. Todos os advogados que avaliaram o contrato da Dow Right afirmam que ele está cheio de ambigüidades e desinformações. Faltam, por exemplo, mais explicações sobre o tipo de serviço prestado (veja outros detalhes no quadro 'Como é o contrato'). A lição que fica é que, na próxima vez que você precisar de um serviço como esse, não tenha a ilusão de que há um caminho rápido e seguro para o emprego. 'Não existe milagre. O profissional tem de assumir o controle da carreira, inclusive nos momentos difíceis', diz Gutemberg Macedo.



 
Referência: curriculum.com.br
Autor: Cassio Utiyama, Dalen Jacomino e Maria Tereza Gomes - Você S.A
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