'O chefe aprovou o meu mestrado em Londres e eu fui promovido na volta'
Rafael Bruno, de 27 anos, superintendente de fusões e aquisições do Banco Real
Relacionamentos profissionais complicados são a terceira causa de demissão de
executivos e estão na frente até mesmo do mau desempenho quando chega a hora de
determinar quem vai ficar fora do jogo.
Foi essa a conclusão de um estudo da DBM, consultoria especializada em
recolocação, com escritório em São Paulo, que ouviu 420 executivos brasileiros
entre abril de 2006 e abril deste ano. No levantamento, a má interação entre as
pessoas só perde para fatores externos e, portanto, de difícil controle, como
reestruturações, fusões e aquisições. “E pensar que, muitas vezes, essa falta de
‘química’ entre chefe e subordinado poderia ser contornada”, diz Marcelo
Cardoso, presidente da DBM.
Os 123 445 profissionais que responderam à pesquisa em que se baseou a edição
2007 do Guia VOCÊ S/A-EXAME. As Melhores Empresas para Você Trabalhar também têm
seus senões em relação à liderança. “Meu chefe não me ajuda a decidir sobre qual
caminho seguir na carreira, não me apóia e não ouve minhas sugestões.” Essas
foram algumas das queixas apontadas por eles. Reclamações que, no fundo, passam
pelas dificuldades de convivência. Situações que não só deixam o dia-a-dia mais
difícil, como também podem atrasar a carreira. Afinal, o chefe é o principal
fator de engajamento com a companhia. “Este ano, cruzamos dados de nossas
pesquisas mundiais com informações de clientes e descobrimos que sete em cada
dez pessoas pedem demissão por não se dar bem com o superior”, diz Gustavo
Oliveira, vice-presidente do Gallup Consulting, instituição americana de
pesquisa e consultoria com escritório em São Paulo.
Por essas e por outras, é muito procedente o conselho da consultora americana de
carreira Cynthia Shapiro, que escreve para o jornal The Wall Street Journal e
para a revista Fortune, entre outras publicações: “Encare seu chefe como o
cliente mais importante e, em alguns casos, o mais difícil também”. Em vez de
ficar bancando a vítima, tente fazer diferente. Nas próximas páginas, você vai
encontrar 22 situações críticas dessa relação e 37 maneiras de lidar com elas.
Se o chefe não sabe nem quer saber do impacto que tem na sua vida, a melhor
saída é gerenciar o conflito e liderar para cima, duas competências fundamentais
para conseguir sucesso na carreira. “Isso significa ter atitudes que influenciem
positivamente o chefe”, diz Marcelo Cardoso, da DBM.
1) Pedir um aumento
Olhe além do seu umbigo... Pesquise no mercado para saber se seu salário
está defasado. “Um profissional que gere a própria carreira deve ser capaz de
enxergar o contexto”, diz a professora Tania Casado, da Faculdade de Economia,
Administração e Contabilidade (FEA-USP) e da Fundação Instituto de Administração
(FIA). Também é preciso ver a situação da empresa às vezes não é possível fazer
alterações de salário.
...e para ele também. Não faça comparações. “Fale sobre suas últimas
realizações, seu compromisso com os objetivos de longo prazo da empresa e seu
alinhamento com os valores da companhia”, sugere Luiz Ernesto Gemignani,
presidente da Promon, empresa paulistana de soluções de infra-estrutura.
Pense no que há por trás disso. “Em 16 anos de Unilever, nunca pedi um
aumento de salário”, diz Marcelo Williams, vice-presidente de RH no Brasil. A
preocupação dele sempre foi trabalhar bem e entregar mais do que o chefe pedia.
A melhora no contracheque veio naturalmente, com as promoções.
2) Ser promovido
Não fale em dinheiro. Mais vale mostrar que você está pronto para encarar
mais desafios do que entrar no assunto “dinheiro”. “Exponha seus motivos e
pergunte para o chefe: ‘E então, quais são seus planos para mim?’”, diz Marcelo.
Assim, você fica sabendo se o que imagina para a sua carreira está alinhado com
a proposta da companhia. Obviamente, para ter uma conversa dessas você precisa
estar seguro dos seus resultados.
3) Negociar as férias
Se a situação estiver complicada, adie. Caso a sua área esteja a mil por
hora, deixe seus planos para depois. Quando achar que é possível sair, faça uma
sondagem com o chefe. “Diga que você já tem férias vencidas e que gostaria de
tirar uns dias para voltar com força total para tocar aquele projeto”, diz José
Augusto Minarelli, da Lens&Minarelli, consultoria especializada em recolocação.
4) Ter flexibilidade no horário de trabalho
Diga que vantagem a empresa leva. “Se você quer ter um horário mais
flexível para fazer um curso, por exemplo, deve dar a contrapartida, mostrando
para o chefe como isso pode melhorar seu trabalho e quais benefícios essa
mudança pode trazer para a organização”, diz Gerson Correia, sócio-diretor da
Talent Solution, consultoria de recrutamento e seleção.
5) Tirar uma fase sabática
Não espere apoio financeiro. “Acho cara-de-pau um profissional pedir
licença remunerada ou querer que a empresa pague o curso que ele deseja fazer
durante esse período. Isso tem que partir do chefe”, diz Gerson. Se a companhia
tiver essa cultura e se você for visto como um bom funcionário, a proposta virá,
com certeza. Segundo Gerson, caso a licença não seja aprovada, é preciso pensar
se o seu projeto é tão importante a ponto de valer a pena sacrificar seu emprego
por ele.
6) Conseguir mais prazo
Coloque a boca no trombone. Nesse caso, muito pior que dizer “não vai dar
tempo” é dizer “não deu tempo”. “Da próxima vez, não tem desculpa, planeje-se
melhor, identificando os gargalos, os pontos onde as coisas costumam emperrar”,
diz Milton Pereira, diretor de desenvolvimento humano e organizacional da
Serasa, empresa especializada em pesquisas, informações e análises
econômico-financeiras.
7) Ganhar um projeto
Não seja muito assertivo. No caso, fale algo como “gostaria muito de
fazer esse trabalho porque...”. “E enumere também as competências que você tem
para conseguir seu objetivo”, diz Gerson, da Talent Solution.
Esvazie sua mesa antes. “Tem gente que tem uma porção de trabalhos por
fazer e ainda assim acha que está em condições de pedir mais um projeto”, diz
Rugenia Pomi, diretora executiva do instituto de pesquisa Sextante Brasil e da
consultoria Gênesis Desenvolvimento e Potencialização Humana, em São Paulo. Para
ela, é mais profissional terminar o que você está tocando antes de se oferecer
para assumir mais um projeto.
8) Como dizer “não” para o chefe
Não se afobe. Antes de recusar um pedido da chefia, analise a situação.
No fundo, um pedido do chefe é uma ordem. “Reorganize sua agenda para tentar dar
conta dessa demanda”, diz Gerson, da Talent Solution.
Diga por que não será possível atender ao pedido. “Seja objetivo e
apresente uma boa justificativa para a sua recusa”, diz Waldir Eschberger Jr.,
presidente do Zambon Laboratórios. Vale perguntar se é possível resolver
posteriormente o assunto em questão e, claro, se oferecer para fazer isso.
9) Você se sentiu injustiçado
Peça um feedback. Em primeiro lugar, não comente o assunto com os
colegas. “Seu sentimento pode chegar aos ouvidos do chefe”, diz Ricardo Rocco,
um dos diretores da Russell Reynolds, consultoria de recrutamento de executivos
com escritório em São Paulo. Esfrie a cabeça e diga ao seu superior como se
sentiu em relação ao ocorrido. Se a promoção saiu para um colega, por exemplo,
nem pense em se comparar a ele. Peça um feedback sobre o seu desempenho.
10) O chefe está estranho com você
Precipite o assunto. Pergunte se a mudança de comportamento tem a ver com
seu trabalho. Se tiver, ouça as razões dele sem se justificar e trabalhe para
melhorar. Também é bom aprender a ler os sinais não-verbais antes de ficar
cismado. “Muitas vezes, o chefe pode estar mais calado que de costume, mas
demonstra por atitudes que continua o mesmo de antes”, diz Lucia Costa,
sóciadiretora da Mariaca/Lee Hecht Harrison, consultoria especializada no
recrutamento de executivos, em São Paulo.
11) Você teve uma briga com o seu chefe
Peça desculpas. No início da carreira, Luiz Eduardo Rubião, diretor-geral
da Chemtech, consultoria carioca de projetos de engenharia e tecnologia, se
indispôs com o chefe. “Se tivesse conversado com ele em seguida, não teria
ficado com as piores turmas do cursinho”, diz ele, que na época era professor.
Para Luiz, é possível resolver a situação de um jeito maduro. “Mas, se você se
excedeu, tem que pedir desculpas”, diz.
Conte até 20. “Se você já sabe que seu chefe gosta de provocar, respire
fundo quando for falar com ele”, diz Gerson, da Talent Solution.
12) O superior sabe menos do que você
Pense no lado bom. É cada vez mais comum dirigentes sem as mesmas
qualificações técnicas da equipe. Mas não é isso que está em discussão. Quando
alguém assume uma posição de liderança, a orientação passa a ser para as
pessoas, não para a execução de tarefas. Segundo Robert Joss, professor da
Graduate School of Business, da Universidade Stanford, nos Estados Unidos, o
líder tem que conseguir resultados por meio das pessoas — sua performance
individual se baseia nisso. Para Ricardo Rocco, da Russell Reynolds, salvo
algumas exceções, se ele está onde está é porque tem qualidades importantes para
a empresa. Portanto, comece a ver o que pode aprender com ele.
13) Quando você tem mais de um chefe
Crie um vínculo pessoal com cada um deles. “Quando você conhece o estilo
de cada um de seus chefes, tem mais condições de gerenciar as situações”, diz
Lucia, da Mariaca/Lee Hecht Harrison. Uma boa maneira de fazer isso é observar
as atitudes dele e ouvir o que as pessoas e o mercado costumam falar sobre ele.
“Mas não aborde ninguém diretamente. Vai que seu superior fica sabendo de suas
‘investigações’ e ele é do tipo reservado?”, diz Lucia.
Veja os pontos em comum. Alessandro Bonorino, diretor de RH da IBM
Brasil, já chegou a responder a três pessoas. “No começo, sempre ficava devendo
alguma coisa para alguém”, diz. Até que um dia ele resolveu fazer uma planilha
com as ordens que recebia de cada um e os pontos em comum entre elas. “Mostrei a
planilha para meus chefes que, a partir daí, começaram a entender minha
limitação para tantas demandas”, diz. Alessandro afirma que outra dica é abrir a
cabeça e aproveitar a diversidade de visões que o fato de ter mais de uma chefia
possibilita.
14) Em caso de ordens contraditórias
Coloque os responsáveis para conversar. Se isso acontece quando você tem
mais de um chefe, seu papel deve ser o de mediador. “Faça-os ajudar você a
entender o que é prioritário”, diz Lucia Costa, da Mariaca/Lee Hecht Harrison.
Não fique no meio. Fazer os chefes conversar também é a melhor saída quando
seu quase-ex-chefe e o futuro não chegam a um acordo sobre quando você começa no
novo departamento. “Melhor não ser intermediário’”, diz José Augusto, da Lens&Minarelli.
Não aponte o problema. Se a contradição vem de um chefe só, a orientação
mais importante é não assumir uma atitude acusatória. Senão, a situação pode
ficar ainda mais complicada. Melhor se sair com algo do tipo “estou meio confuso
com as orientações que você me passou e gostaria de conversar novamente sobre
elas”. “Fazendo dessa maneira, você dá a seu chefe uma chance de rever suas
posições”, diz José Augusto. Sem falar que fica mais simpático.
15) Seu chefe é virtual
Economize o tempo e a paciência dele. “Acho que o fundamental é não
ocupar o tempo do chefe com assuntos pouco importantes”, diz Waldir, presidente
do Zambon, que se reporta à gerente-geral da empresa, na Itália. Se for o caso
de apresentar um problema, exponha também a solução que você pensou. Waldir
hierarquiza os assuntos. “Acho importante separar os tópicos que devem ser
compartilhados daqueles que você pode tocar sozinho”, diz.
Não fale só de trabalho. Tente estabelecer um relacionamento mais pessoal
com seu chefe. Por exemplo, quando for falar com ele por telefone, faça um
aquecimento colocando na conversa algum comentário relativo à cultura do país em
que ele vive. “Fica muito mais agradável do que entrar direto no assunto
‘trabalho’”, diz Lucia Costa, da Mariaca/Lee Hecht Harrison.
16) Tem chefe novo no pedaço
Coloque seu ego de molho. Resista à tentação de mostrar que sabe mais do
que ele. “Você deve ajudá-lo a se adaptar”, diz Rugenia Pomi. Portanto,
coloque-se à disposição e pergunte o que ele quer que você faça, se precisa de
alguma informação etc.
Chega de saudade. “Não faça comparações nem se mostre saudosista”, diz
Lucia Costa. É melhor ouvir mais para construir um bom relacionamento com essa
pessoa.
17) Você cometeu um erro
Não espere o superior descobrir. Antecipe-se e admita que errou. “Não
fique se justificando e, se possível, diga também como acha que a situação deve
ser resolvida”, diz Gerson, da Talent Solution.
18) Seu superior é desorganizado
Não entre em embates. Você é um poço de organização e seu chefe é o
oposto? Colabore com ele. “Que tal mostrar o modelo que você preparou para o
relatório mensal de resultados?”, diz Rugenia Pomi.
Guarde sua organização para você. Vamos supor que você e seu chefe tenham
uma reunião. Para não se perder, estruture seu raciocínio. “Assim, mesmo que ele
dê mil voltas, você tem a noção exata do começo, meio e fim da conversa”, diz
Gerson.
Aproveite a brecha. “Meu primeiro chefe era uma pessoa brilhante, mas
caótico”, diz Luiz Eduardo, diretor-geral da Chemtech. O que ele fez? Focou no
lado genial do superior e aproveitou as brechas que ele deixava por causa de sua
falta de organização. “Certa vez, toquei sozinho uma reunião, porque ele havia
se esquecido do horário”, diz.
19) Falta química entre você e o líder
Crie empatia. Melhor abrir o jogo e citar as situações em que você se
sentiu desconfortável. “Já vivi isso uma vez. Na época, expus minhas razões e
ouvi as do meu chefe”, diz Milton Pereira, da Serasa. Só assim conseguiram se
colocar no lugar um do outro. “Pode até não existir simpatia, mas você cria
empatia”, diz. Esse também é um ótimo exercício para evitar que você se
transforme naquele tipo de funcionário que só entra na sala do chefe para falar
o que deu errado, achando que ele tem a solução para tudo.
20) O chefe é seu amigo
Separe as coisas. Para Erli Rodrigues, diretor-geral da American Airlines
para o Brasil, o negócio é não misturar trabalho e amizade. “Separando bem isso,
a parte pessoal pode até ajudar, porque deixa a convivência mais agradável”,
diz.
21) Você tem cinco minutos para vender sua idéia
Faça a lição de casa. Nem pense em improvisar. É preciso fazer uma
exposição bem feita de suas idéias e basear seus argumentos em números. “E estar
pronto para responder a qualquer pergunta do chefe sobre o assunto”, diz Erli.
Se não souber a resposta, diga que vai pesquisar. Só não faça cara de quem nunca
ouviu falar do assunto, para não colocar tudo a perder.
Comece pelo fim. Luiz Ernesto Gemignani, da Promon, diz que o melhor é
começar falando sobre os resultados, os benefícios e o significado (nesta ordem)
que aquela idéia tem para a empresa e para as pessoas.
22) Seu superior é ansioso
Antecipe-se a ele. Não espere que ele pergunte, mantenha-o bem informado
sobre o andamento do seu trabalho. “Com o tempo, é bem provável que ele se sinta
mais relaxado e a situação melhore para o seu lado”, diz Lucia, da Mariaca/Lee
Hetch Harrison.
Não leve para o lado pessoal. Ok, não é fácil lidar com um chefe ansioso.
Mas tudo fica pior se você acreditar que as cobranças têm um cunho pessoal.
“Lembre-se que ele age assim com todo mundo”, diz Lucia.
Afine seu discurso
Descubra como seu chefe capta as informações para conversar melhor com ele:
Se o seu chefe é do tipo sensação:
Preocupado com o aqui e agora
Tem um método de trabalho e prefere não pular etapas
Confia em fatos
Para falar com ele:
Mostre evidências, provas, detalhes e dê exemplos
Traga dados mensuráveis e quantitativos
Seja prático, realista
Apresente as informações, mostrando as etapas envolvidas
Se o seu chefe é do tipo intuição:
Está de olho no futuro
Não tem um ritmo regular de trabalho
É ligado em pressentimentos
Para falar com ele:
Apresente primeiro a idéia principal, o conceito global
Não forneça muitos detalhes a menos que ele solicite
Fale sobre desafios, possibilidades e as diferenças que suas idéias irão trazer
Mantenha o foco nos aspectos que não são rotineiro