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Carreira / Emprego - Por que você trabalha? 

Data: 09/12/2008

 
 

Um amigo defende a posição de que, se perguntássemos a cada trabalhador, independentemente do nível hierárquico, “por que você trabalha?”, a resposta seria unânime: “porque preciso ganhar dinheiro”. Eu tenho dúvidas sobre essa unanimidade e, por isso, gostaria de propor algumas reflexões sobre a questão.

Em algum lugar li ou ouvi que hoje as pessoas vivem a “síndrome da pressa”. Todos correm para algum lugar. A mim, me parece que correm para lugar algum. Uma pessoa sai de casa para assistir a um filme ou peça de teatro. E a sua ansiedade de chegar lá é tanta que sai pelas ruas feito um louco, buscando atalhos, ultrapassando quem estiver mais lento, às vezes arriscando cruzar um farol vermelho. Chega suado, esbaforido e, por tentar burlar a fila de ingressos, ainda arruma uma discussão aqui, um bate-boca ali.
Eu fico me perguntando: por melhor que seja o filme ou a peça à qual ele finalmente assistirá, terá valido a pena o esforço excessivo, os riscos e os desgastes físicos e emocionais? E por que as coisas têm que acontecer assim – seja quanto a cinema, teatro, balada, futebol, festa, praia, casamento, visita a amigos?

Tenho uma modesta opinião a respeito: essa “síndrome da pressa” está existindo porque muita gente anda confundindo conceitos simples do tipo meio e fim, causa e efeito, ação e reação, os quais, segundo penso, seriam fáceis e corretamente compreendidos se percebessem o verdadeiro sentido dos momentos que constituem a vida.

A vida – e aqui falo no sentido mais amplo possível – é constituída por uma série de eventos que se sucedem e se completam. Não se vive a vida aos solavancos nem em capítulos. Não se pode “pular” um pedaço do “filme”, como nos DVDs. Não há um “controle remoto existencial” e, portanto, não dá para se acelerar o ritmo natural das coisas. Vive-se a vida em absoluta e rigorosa seqüência, constituída de momentos.
Ora, se uma pessoa sai de casa para ir ao cinema, não pode pretender esquecer, desconhecer ou apagar o tempo de duração e as condições do trajeto. É simples assim: sem vivenciar e concluir o trajeto, ninguém conseguirá chegar ao cinema, ao teatro, balada, à praia, ao clube, ao jogo ou a qualquer lugar que vá.

Justamente aqui chego ao “xis” da questão: se a pessoa terá que necessariamente conviver com esse momento do trajeto, por que deixar que ele se transforme num tormento, numa tortura, num aborrecimento? Cada segundo, minuto, hora, centímetro, metro ou quilômetro que nos separam do ponto de chegada faz parte da nossa vida, do nosso presente, da nossa história e não podem ser desprezados nem diminuídos.

Muitas vezes, com alguma sorte e criatividade, os trajetos da vida podem ser muito mais gratificantes e prazerosos que o evento para onde a pessoa se dirigia. A festa poderá ser chata, o filme, idem, a peça um fiasco, nosso time pode perder o jogo de goleada, pode desabar o maior toró na praia, mas nada disso nos aborrecerá se, por exemplo, ao longo de todo o trajeto tivermos tido uma excelente companhia, uma pessoa amiga, agradável, divertida, sensível e inteligente. Ou se tivermos tido a oportunidade de conhecer lugares lindos, interessantes, aconchegantes e que até então não havíamos percebido.

Se isso de fato ocorrer, qual terá sido o verdadeiro sentido do nosso passeio? Ir ao evento ou conhecer melhor uma pessoa ou um lugar especial? De repente, o espetáculo principal pode virar mero pano de fundo para um espetáculo mais maravilhoso ainda. Quem já não passou por situação semelhante? Quem já não ouviu alguém comentar: “olha, a viagem teria sido um enorme fracasso se não fosse pelo fato de que fiz novas e maravilhosas amizades”.

Isso pode acontecer com você, se você se mantiver receptivo e atento ao que acontece à sua volta, às oportunidades inesperadas que a vida pode lhe proporcionar. Se você souber e quiser transformar seu trajeto num motivo também de descobertas, diversões e prazer – ao invés de ficar obcecado pelo ponto de chegada.

Agora está na hora de falar de trabalho e já vou direto ao assunto.

Se vocês entenderam bem minha analogia do “trajeto”, então permitam-me propor: por que não considerar o trabalho diário como um dos grandes trajetos da nossa vida? Nesta proposta, o filme ou o evento se chama realização. E o percurso pelas ruas, avenidas, no ônibus ou no metrô e tudo o mais, é o nosso cotidiano profissional, nosso expediente diário. A diferença é que este trajeto existencial, ao contrário do outro, não tem um tempo de duração previsível. Este trajeto não acaba no fim da tarde. Pode durar um, cinco, dez, 20, 30 anos. Pode ir até à aposentadoria.

Pois muito bem: que sentido a vida de um indivíduo terá se ele se permitir que esse “trajeto” seja feito com angústias, temores, inseguranças, tristezas e ressentimentos? Por que não fazê-lo com alegria, entusiasmo, esperança, sonhos? Claro que acidentes de percurso podem acontecer em qualquer dos dois “trajetos”, um sujeito pode ser atropelado ao dirigir-se a um cinema ou pode ser demitido após seis meses de trabalho. Mas a verdade é que ninguém conta com isso, nem espera por isso, desde que se esteja fazendo o melhor, com atenção e zelo.

Este é o ponto a que quero chegar: todo ser humano dispõe de livre arbítrio para agir como quiser, o que faz com que comportamento seja uma decisão pessoal. Se você gritar com um colega porque ele gritou consigo, ele terá decidido por você como você deveria comportar-se e isso ninguém no mundo deve permitir que aconteça. Se um colega gritar consigo, você decide o que fazer: pode gritar também ou pode calmamente afastar-se dele. Mas é você quem decide. Como também decidirá se vai passar o dia inteiro reclamando, de mau humor ou entusiasmadamente buscando soluções.

Não existem empresas, chefes, nem funcionários perfeitos – porque a base de tudo é o ser humano e este, por essência e natureza, é imperfeito. Portanto, crises e conflitos interpessoais – com ou sem gritos – há onde existirem a partir de duas criaturas. Mas quem souber utilizar corretamente o livre arbítrio, o bom senso, a paciência, a autonomia sobre seu próprio comportamento e a habilidade de descobrir o lado bom, positivo e divertido do trabalho, dando-lhe um novo sentido, poderá cumprir todo o “trajeto” de forma a manter inabalável seu bem-estar. E assim trabalhará com gosto, porque cada dia será um passo adiante no “grande trajeto”, que é a própria vida.

Acredito firmemente na possibilidade de um profissional dirigir-se diariamente ao seu local de trabalho com motivação e disposição. Porque sabe que vai aprender, ensinar, encontrar amigos, se sentir útil, superar obstáculos, vencer desafios, juntar-se a uma equipe que o admira - e porque sabe que tem possibilidade de vencer. E também, claro, porque vai ganhar dinheiro.

Se você quiser, este poderá tornar-se o verdadeiro sentido do seu trabalho ou dos momentos diários que o constituem. O que poderá promover significativas mudanças também no sentido da sua vida. Para melhor, acredite.



 
Referência: carreiras.empregos.com.br
Autor: Floriano Serra
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