Estela trabalha feito louca, inclusive nos finais de semana. Não tira férias,
prefere vendê-las. Almoça em, no máximo, meia hora, para não perder tempo. Em
casa, não pára um segundo: tem as roupas para passar, o jantar para fazer, a
bagunça das crianças para arrumar.
Como acredita que precisa estudar para crescer profissionalmente, estuda inglês
e francês. Além disso, vira e mexe, faz favores a parentes e amigos. Não tem um
dia em que não corre para lá e para cá. Ela se sente estressada, mas pensa que
não pode fazer nada se a vida a levou para esse caminho.
É verdade que Estela é uma personagem fictícia. Mas você bem que se identificou
com ela, ou conhece alguém parecidíssimo. Já parou para pensar o que causa essa
rotina tão estressante? De acordo com a psicóloga e psicoterapeuta Clarice
Barbosa, essa necessidade de se ocupar o tempo inteiro pode indicar um grau alto
de ansiedade e uma tendência à compulsão.
E a reflexão?
Acima de tudo, a necessidade de ser solicitado o tempo todo e o condicionamento
à realização de muitas atividades diárias podem denunciar um vazio. É como se as
pessoas fugissem de si mesmas e prestassem atenção somente ao exterior. Passados
alguns anos nessa correria, as pessoas esquecem o que querem para si e as coisas
perdem sentido. Então, as atividades diárias passam a ser feitas no piloto
automático.
"O que a pessoa realiza perde valor. Isso acontece muito com os workaholics, por
exemplo. O único momento de reflexão surge na hora de dormir. E é por isso que
muitos sofrem de insônia. É a hora em que os pensamentos afloram. Quem trabalha
em demasia demonstra que não se basta, que sempre precisa de algo de fora", diz
Clarice.
E ainda por cima há quem se engane, quem diga a si mesmo: preciso trabalhar
muito, porque meu chefe é ruim; preciso ajudar as pessoas, porque elas são
dependentes de mim e sempre me procuram; não posso tirar férias, porque não
tenho dinheiro; e por aí vai. "Essas pessoas quase não param para pensar se
estão felizes, se gostam de fazer o que fazem e quais são seus objetivos de vida
(que não podem ser os objetivos dos outros). Mas é claro que, se alguém
perguntar, elas dirão que têm objetivos".
O problema é que, em algum momento, a vida obrigará essa pessoa a parar, na
opinião da psicóloga. Surgirá uma doença psicossomática (quando problemas
psicológicos se tornam físicos), uma depressão ou uma crise de ansiedade, por
exemplo. Isso sem falar que a carreira é comprometida, já que a rotina
estressante reduz a criatividade, desacelera o raciocínio e prejudica a memória.
O que fazer?
Se você se enquadra no perfil descrito, primeiramente deve admitir que precisa
mudar. Um bom indicativo é quando tem dificuldade para encontrar soluções no
dia-a-dia, o que é resultado da criatividade reduzida.
Em segundo lugar, precisa começar a cuidar de si, de sua saúde e buscar mais
qualidade de vida. "Aprenda a fazer pequenas pausas ao longo do dia, voltar um
pouco para si. É por isso que a hora do cafezinho, ritual na maioria das
empresas, é tão importante. Mas ainda dá para fazer pausas no elevador; no
caminho de um cliente para outro, ouvindo alguma música que gosta no carro; no
ônibus, lendo um livro. Dê uma parada para apreciar a natureza ou fazer um
alongamento, se tiver oportunidade", diz Clarice.
"Continuar nesse processo trará conseqüências negativas. Descubra o que gosta de
fazer, além do trabalho, avalie o que sente, reveja metas e objetivos de vida,
converse com amigos ou com um terapeuta, ajuda muito. Mas não fique sempre dando
desculpa, dizendo que não tem dinheiro, não tem tempo", finaliza a psicóloga.