Cenário: sala típica de alto executivo, mesa grande com papéis e pastas
espalhadas e outra mesa redonda de reunião à frente. Sentado atrás dela está um
senhor, sênior diretor. A sua frente e de lado para a platéia, há um jovem, com
cara e roupa de executivo. Nota-se uma clara relação chefe - subordinado e uma
certa dificuldade de relacionamento e comunicação. O jovem tem menos de seis
meses no cargo.
Diretor: E então? Como vão as coisas?
Jovem executivo: Bem, o Senhor sabe... A turma é meio fraquinha, estou tendo
dificuldades em impor meu jeito, dar velocidade. Eu até queria falar mesmo com o
senhor. Gostaria de poder trazer minha equipe anterior. Afinal, eles sabiam
trabalhar comigo... O que o senhor acha?
Diretor: Meu rapaz, bons líderes não arrastam velhas equipes, montam novas,
formam novos talentos.
O diálogo foi elaborado pelo professor do Ibmec-SP e consultor da FGV (Fundação
Getúlio Vargas), Gilberto Guimarães, que também dirige a BPI no Brasil,
consultoria européia especializada em processos de mudanças.
Medo do novo
Desmontar toda uma equipe para trazer os antigos colegas de trabalho é uma
tentação. E muitos não resistem, segundo Guimarães. "É muito, muito comum
mesmo". Ele mesmo conta que já fez isso. Mas diz que aprendeu, ao longo dos
anos, que não é a melhor saída.
"Aprendi, na minha vida, como líder, que arrastar antigas equipes não é bom. A
nova equipe já tem a cultura da empresa e o ideal é que o executivo assimile o
novo ambiente e o desafio", explica.
Segundo ele, líderes trazem antigas equipes por dois motivos. O primeiro é a
necessidade de ter alguém em quem confiar. "Imagine se você teve, durante anos,
uma pessoa que cuidava de suas contas e compromissos, que sabia o número de sua
conta no banco e lembrava das datas de aniversário de seus parentes, colegas e
amigos. Sem ela, será complicado, em qualquer empresa", exemplifica.
A outra razão é a insegurança. "Muitas pessoas fazem questão de acabar com a
nova equipe e trazer a velha, não porque confiam em seus antigos colegas, mas
porque desconfiam de si próprio, de sua capacidade enquanto líder de se adaptar
às novas pessoas e às novas regras do jogo. Estamos falando de um sentimento
parecido com o de uma criança que muda de escola e não conhece ninguém. É duro
almoçar com estranhos. Nem todo mundo tem a coragem de dar a cara para bater".
Atitude acarreta perda de oportunidade
Na opinião do consultor de carreira da Catho, Renato Waberski, demitir os novos
subordinados para contratar a antiga equipe tem mais conseqüências negativas do
que positivas. "Acaba sendo bastante comum, mas é sempre importante deixar o
velho para trás. Fora a insegurança que irá gerar na diretoria - já que as
atividades que eram desenvolvidas de uma forma serão feitas de outra - o líder
perderá a oportunidade de conhecer e formar novos talentos".
Ele defende a tese de que o líder pode, literalmente, reinventar sua carreira
com o novo time. "É uma situação que ele precisa vencer. Pelo menos aos meus
clientes mostro esse caminho. A mudança é uma maneira de reinventar a si mesmo
enquanto profissional e a carreira. Não se pode perder a oportunidade".
É importante ressaltar ainda que as pessoas que já trabalham há algum tempo na
empresa têm a memória da organização, o que diminui as chances de o novo
executivo cometer os mesmos erros do passado. Isso sem falar que, ao trazer a
antiga equipe, ele fechará as portas da organização para a qual trabalhava, que
pode ficar desfalcada.
Mas não há apenas conseqüências negativas: de acordo com Guimarães, pode ser bom
trazer a antiga equipe, se o executivo estiver fazendo isso porque tem certeza
de que os resultados serão melhores dessa maneira, e não porque está inseguro.
O ideal, segundo especialistas
Na opinião do diretor da BPI no Brasil, o grande líder descobre os talentos na
empresa para a qual foi trabalhar. "Não precisa desmontar a equipe. O grande
líder é aquele que forma grandes equipes, descobre novos talentos e tem o dom de
descortinar as competências nas pessoas. Ele pode até ter uma surpresa e
encontrar pessoas até melhores". Waberski concorda. "É importante ter como meta
formar uma nova equipe".
Guimarães acrescenta que é possível demitir alguém após um certo tempo de
avaliação da equipe herdada. "O líder pode mapear quem é quem na equipe por meio
de uma conversa com a área de Recursos Humanos e, depois de dar uma chance a
todos, demitir aquele que não está adequado aos objetivos da empresa",
recomenda.