Resumo
Um jogo de negócios inovador foi utilizado junto a 163 executivos de empresas
nacionais e multinacionais e empreendedores start-up (negócio próprio) e a 156
estudantes universitários para a identificação e o desenvolvimento de suas
habilidades empreendedoras. Ao todo, quinze características comportamentais
empreendedoras foram destacadas e fizeram parte do estudo. O objetivo foi
comparar as características empreendedoras de cada grupo, através da simulação e
vivência de forma lúdica de um ambiente empreendedor, bem como da resolução de
dilemas empresariais. O resultado mostrou que apesar das peculiaridades de cada
grupo, as características visão e planejamento são as que mais se destacam em
todos os grupos, e otimismo e capacidade de networking as que menos se destacam.
Como a seleção dos participantes ocorreu de forma aleatória para a composição de
cada grupo, porém levando em consideração que são pessoas de destaque em suas
áreas de atuação, conclui-se que o comportamento empreendedor é identificado não
só nos que iniciam seus próprios negócios, mas em outros grupos de pessoas.
Através da utilização do jogo de negócios e da análise dos relatórios obtidos
pôde-se propor para cada grupo e para cada pessoa individualmente um plano de
ação para desenvolvimento de suas habilidades menos destacadas, bem como para
capitalizar sobre as mais bem destacadas em cada caso. Trata-se de uma
contribuição para o desenvolvimento das habilidades empreendedoras do executivo
moderno, dos dirigentes de pequenas empresas e de estudantes para que se
preparem para os desafios do seu futuro profissional.
Introdução
Com o aumento da competitividade entre as empresas é crescente a necessidade de
se atrair e reter talentos. Para desempenhar essa função muitas empresas
desenvolvem métodos específicos e os departamentos de Recursos Humanos acabam se
tornando onerosos, desempenhando um trabalho árduo ao tentar identificar e
classificar características essenciais que devem estar presentes nos
profissionais selecionados.
Muitos dos métodos de seleção das empresas envolvem técnicas bastante
subjetivas, baseadas no julgamento pessoal de equipes de recrutadores ou em
testes que levam em conta apenas o conhecimento técnico dos candidatos. Esse
tipo de recurso está tornando-se obsoleto devido à preocupação cada vez maior
das empresas com o comportamento que será apresentado pelos futuros funcionário.
Tal demanda gera a necessidade de sistemas que avaliem o perfil comportamental
dos futuros profissionais e que possam auxiliar no desenvolvimento de suas
habilidades comportamentais mesmo após a contratação, promovendo o contínuo
desenvolvimento.
Análises que buscam conhecer como o profissional agiu anteriormente ou como
agiria diante de determinadas situações também estão cada vez mais valorizadas
por recrutadores. A análise comportamental é bastante complexa de ser realizada
e pode muitas vezes ser induzida por critérios subjetivos. Com isso, técnicas
que permitam avaliar o comportamento vivencial do candidato podem auxiliar no
processo de seleção e recrutamento e após a sua contratação.
A nova visão de empresas que buscam organizar os funcionários em equipes
multidisciplinares, visando à complementaridade das habilidades individuais cria
também a necessidade de se conhecer melhor todos os atuais funcionários, sabendo
quais são as características mais presentes nos mesmos. Dessa maneira, métodos
que auxiliem na avaliação e identificação do perfil de cada um dos funcionários
da empresa podem auxiliar na criação de equipes mais bem preparadas e com perfis
complementares.
Alheio aos departamentos de Recursos Humanos diversos autores vêm ao longo
dos anos tentando classificar características que estejam presentes, tanto nos
indivíduos que criaram suas próprias empresas, genericamente denominados de
empreendedores, como naqueles que têm esse perfil, mesmo trabalhando em empresas
já estabelecidas, chamados de intra-empreendedores. Atualmente muitas das
características encontradas nessas pessoas são valorizadas, de modo que esses
profissionais enquadram-se muito bem no perfil buscado pela empresa.
Dessa maneira esse trabalho buscou utilizar-se de um jogo de negócios
inovador, totalmente baseado na internet, desenvolvido para analisar o perfil
empreendedor dos profissionais. Tal ferramenta utiliza um ambiente lúdico, na
forma de jogo, onde os usuários devem tomar decisões no dia-a-dia, e têm suas
características empreendedoras mapeadas, de modo que ao final têm-se uma análise
completa de seu perfil empreendedor. Além disso, pôde-se comparar grupos
distintos de pessoas com vistas a identificar eventuais diferenças e
similaridades de comportamento entre elas.
Metodologia
O jogo de negócios foi aplicado a 319 pessoas, sendo 59 empreendedores start-up,
104 executivos de nível gerencial de empresas nacionais e multinacionais e 156
estudantes universitários, no período de janeiro a junho de 2006. Os executivos
foram selecionados dentre várias empresas de diversos setores, incluindo desde
grandes empresas multinacionais até médias empresas, porém todos estavam
cursando um programa de MBA quando foram analisados. Os estudantes
universitários analisados representaram um grupo homogêneo, com subgrupos de 30
estudantes por universidade participante do estudo.
Todos os participantes do estudo acessaram o jogo através da internet e
tiveram pelo menos 30 dias para jogar. Para que o resultado obtido
individualmente fosse considerado válido cada participante jogou pelo menos uma
vez de forma completa todo o jogo. Alguns participantes jogaram mais de uma vez,
sendo que nesses casos seu resultado final foi considerado como a média de todos
os jogos realizados. Cada jogo completo levou em média uma hora e meia, porém a
ferramenta permitia que o usuário jogasse em vários momentos distintos, sem
necessidade de ficar continuamente jogando para se obter o resultado final, o
que facilitou sua aplicação.
Após todos os participantes terem finalizado o jogo os dados foram agrupados
e foi feita uma média da pontuação em cada característica analisada. Essas
características foram posteriormente classificadas, o que permitiu a comparação
entre as características mais e menos presentes em cada um dos três grupos.
Dessa maneira pode-se considerar que foi realizada uma pesquisa que envolveu
tanto parâmetros quantitativos, pois se utilizou dados numéricos para a
elaboração de um ranking com as principais características empreendedoras, e
parâmetros qualitativos, pois a análise dos dados não foi feita de maneira
estatística e sim baseada na comparação entre os resultados obtidos.
Resultados
Os resultados obtidos na pesquisa são apresentados na tabela comparativa a
seguir. Cada uma das quinze características empreenderas é classificada em ordem
de importância para cada grupo, ou seja, as classificadas nas primeiras posições
são as que mais se mostraram presentes para o cada grupo analisado e as
classificadas nas últimas posições, as menos presentes. É importante salientar
que o fato de algumas características ser consideraras menos presentes, não
significa que a pessoa não possua ou não tenha tal habilidade/característica. O
jogo foi desenvolvido de forma a se analisar de maneira comparativa todas as
características. Assim, quando a característica otimismo é apresentada como a
menos presente para o grupo de intra-empreendedores, implica que dentre todas as
características analisadas para este grupo foi a que menos se destacou, mas não
se pode dizer que as pessoas participantes do grupo não são otimistas.
Com a análise dos dados pesquisados percebem-se como fatores de destaque aos
empreendedores start-up a capacidade de identificar oportunidades de sucesso e
de anteciparem-se a tendências futuras, ou seja, serem visionários. Outra
característica que se mostrou bastante presente nessas pessoas foi a capacidade
de planejamento e organização, provando que para empreender não basta ter
vontade, mas é necessário também procurar prever os desafios que podem aparecer
e estar pronto para enfrentá-los.
Entre as características menos presentes, três delas, trabalho em equipe,
liderança e capacidade de networking, refletem a tendência de muitos
empreendedores a trabalharem sozinhos inicialmente, devido à resistência ao
risco de um novo empreendimento das pessoas à sua volta.
Esses dados podem ser validados por um estudo teórico realizado recentemente
com empreendedores start-up e intra-empreendedores , baseando-se em ampla
revisão bibliográfica com diversos artigos científicos sobre o comportamento
empreendedor, apontando que as características mais presentes nos empreendedores
start-up e intra-empreendedores são semelhantes, com peculiaridades em cada
caso.
Comparando-se os resultados obtidos no presente estudo com o estudo teórico
citado percebe-se grande semelhança devido ao fato de em ambos os estudos os
empreendedores start-up se destacarem pela capacidade de inovar e de ter visão
de futuro. A capacidade de correr riscos e a necessidade de realização também
foram consideradas críticas em ambos os casos. As únicas divergências
encontradas foram em relação às capacidades de planejamento e organização que
recebeu destaque nos resultados obtidos com o jogo de negócios, mas que não
tiveram tanta ênfase no estudo teórico.
Em relação aos intra-empreendedores a característica que se mostrou mais
presente foi a capacidade de planejamento, mostrando a maior cautela desse
profissional em correr riscos ou o fato de usar uma prática corporativa: a
cultura do planejamento. A visão e a identificação de oportunidades também foram
características bastante destacadas e indica a semelhança de perfil entre os
intra-empreendedores e os empreendedores start-up, que buscam sempre a inovação.
Esses resultados também estão de acordo com os resultados obtidos com o estudo
teórico citado anteriormente, o qual destacou como principais características
dos intra-empreendedores a capacidade de inovar, seguida pelo estabelecimento de
metas e a busca de oportunidades.
Um fator que pode ser considerado preocupante é a baixa importância dada à
capacidade de networking (relacionamento) pelos intra-empreendedores. É sabido
que aprimorar tal habilidade é fundamental para o bom relacionamento com outras
pessoas na empresa e fora dela para que seus projetos tenham sucesso.
Ao comparar-se ainda o perfil dos dois tipos de empreendedores com o perfil
dos atuais universitários percebe-se que estes últimos estão bem alinhados com
os já considerados empreendedores, mostrando que possuem potencial para atuarem
tanto como empreendedores start-up ou intra-empreendedores e com possibilidades
de sucesso na sua futura carreira profissional.
Aplicabilidade
As empresas têm buscado delinear o perfil do profissional do futuro e cada vez
mais se percebe que este delineamento está em consonância com o perfil
empreendedor. Mas como o perfil empreendedor é bastante abrangente, há a
necessidade de se identificar, analisar e desenvolver várias características
comportamentais empreendedoras em vários grupos de funcionários e em diversos
níveis do organograma organizacional.
O jogo de negócios aqui utilizado apresenta uma abordagem inovadora por
diferenciar-se das técnicas comumente empregadas nestes casos e assim passa a
ser uma alternativa que complementa as várias ferramentas e metodologias
atualmente existentes para o desenvolvimento pessoal. Por ser baseado em uma
plataforma tecnológica e utilizar o ludismo como meio de aplicação, vem ao
encontro da tendência atual de se utilizar formas diferenciadas de avaliação e
desenvolvimento das pessoas, permitindo ainda que o usuário se sinta mais à
vontade para se submeter ao uso da ferramenta.
Acredita-se que desta forma os resultados fiquem mais próximos do que
realmente ocorreriam em um evento prático e real, auxiliando assim aos
departamentos de recursos humanos e desenvolvimento de pessoas na organização a
identificarem o perfil desejado do profissional para cada função/cargo na
empresa e traçarem um plano de desenvolvimento para este profissional.
Assim, a empresa pode definir quais são as características comportamentais
mais importantes para cada papel/cargo ou projeto e formar equipes
complementares e com perfil empreendedor. O profissional, sozinho, pode ainda
ter seu plano pessoal de desenvolvimento para saber quais características
precisa desenvolver e posteriormente preparar uma plano de ação para este
desenvolvimento. Assim, ao longo do tempo, o profissional pode acessar diversas
vezes o jogo de negócios e monitorar se as mudanças que busca em seu perfil
realmente ocorreram.
Como o jogo de negócios é baseado em um ambiente corporativo fictício, e com
dilemas comuns do dia-a-dia empresarial, os resultados ficam bem próximos do que
ocorreria no ambiente real e por ser lúdico envolve mais as pessoas, evitando
parecer ser um teste de perfil ou algo parecido. Tal funcionalidade permite que
o jogo seja aplicado também em eventos e workshops, possibilitando que os
funcionários não se sintam pressionados em suas respostas, oferecendo assim um
resultado menos tendencioso.
O estudo comparativo aqui realizado serviu ainda para se ter uma validação do
perfil do empreendedor corporativo (intra-empreendedor) em relação ao
empreendedor start-up, comprovando o que prega a literatura sobre o tema, e
mostrando a validade da ferramenta, que pode e tem sido utilizada de forma
eficaz no desenvolvimento de profissionais.
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