Mesmo com o benefício extra do 13º, consumidor deve ter atenção para não
acabar inadimplente
O apelo emocional do Natal, acrescido das férias e do recebimento do 13º
salário, pode fazer com que o consumidor se descontrole nas compras de final de
ano. Por isso, o equilíbrio dos gastos e o planejamento orçamentário nos últimos
dois meses do ano são primordiais para que não haja o comprometimento com
dívidas acima da capacidade de pagamento.
O consumidor deve lembrar que em janeiro e fevereiro, meses que precedem as
festas de fim de ano, existem gastos específicos, como matrículas escolares,
Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e Imposto sobre Veículos Automotores
(IPVA), que não podem ser desconsiderados durante as compras de Natal. “O
descontrole financeiro nos últimos anos tem levado muitos consumidores à
inadimplência. Dessa forma, é de extrema importância que alguns cuidados básicos
sejam levados mais a sério, não só nesta época de consumo mais intenso, mas
sempre que uma compra for realizada”, alerta o vice-presidente da Telecheque
José Antônio Praxedes Neto.
As tradicionais despesas, taxas e impostos, aliadas às dívidas acumuladas com
férias, viagens, festas e presentes do final do ano anterior, muitas vezes se
transformam numa bola-de-neve que se arrasta por meses a fio e carregam a dúvida
de qual o melhor caminho a seguir na hora de quitar as dívidas.
Tributos como IPTU e IPVA, matrícula dos filhos no colégio, fardamento, lista
de livros e de material escolar e anuidade de conselho profissional são apenas
alguns dos compromissos financeiros extras que os cidadãos enfrentam todo começo
de ano. Juntem-se a isso as despesas a mais do final do ano e aquelas habituais,
como as contas de energia, água, aluguel, condomínio e o supermercado.
Inevitavelmente, o consumidor mais comedido ou com o dinheiro “contado” se
pergunta: como organizar as finanças pessoais? Como evitar os endividamentos?
Qual a melhor forma de pagamento para cada despesa? Quais as prioridades?
Empréstimos são válidos?
A prioridade, aconselham os economistas e consultores financeiros, são os
chamados itens de subsistência: feira, aluguel, condomínio, água, luz e escola.
Outro ponto importante é dar preferência ao pagamento daquelas taxas que geram
os maiores juros e multas. “O consumidor deve também priorizar as taxas com
menores prestações e as que dão desconto com pagamento antecipado”, diz o
consultor financeiro especialista em negociação de dívidas, Emanuel Gonçalves.
Fugir dos empréstimos também está entre as principais orientações dos
especialistas. “Deve-se evitar, ao máximo, realizar financiamentos ou recorrer a
crediários. São caminhos perigosos que muitas vezes só resolvem o problema no
momento.
De cada dez pessoas que recorrem a empréstimo, oito estão devendo o dobro ou
o triplo do valor tomado e com dívidas nas principais financeiras da cidade”,
alerta Gonçalves. “Mas, se, em último caso, não houver outra alternativa, é
importante pesquisar bastante as taxas de juros. Há muita discrepância e
exploração por parte dos bancos e financeiras”, acrescenta.
O consultor financeiro Reinaldo Domingos salienta que as facilidades de crédito
existentes atualmente no mercado têm contribuído bastante para o endividamento
da população. “Cerca de 70% dos consumidores brasileiros hoje têm algum tipo de
dívida, seja com cheque especial, cartão de crédito ou financeira”, observa.
O economista e consultor Paulo França comenta que as pessoas em geral,
especialmente no Brasil, não são educadas para ter controle das finanças
pessoais. “Mas tomar consciência da situação financeira e organizá-la é tão
importante para o indivíduo quanto cuidar da saúde, escovar os dentes e tomar
banho”, compara o especialista. “É preciso que haja uma mudança de cultura do
brasileiro. É preciso criar o hábito de poupar”, reforça Reinaldo Domingos. Já a
supervisora técnica do Dieese, Ana Georgina Dias, acredita que grande parte dos
brasileiros não consegue poupar não por serem gastadeiras, mas sim porque o
salário muitas vezes mal dá para pagar as despesas. “Não há uma cultura da
poupança porque a média de renda da população é baixa, e muitas vezes não sobra,
mesmo”, considera.
No entanto, Emanuel Gonçalves considera que, mesmo com um bom salário, há
pessoas que gastam mais do que ganham, vivem acumulando dívidas, estouram os
cartões de crédito, usam todo o limite do cheque especial e têm a eterna
sensação de que nunca vão conseguir equilibrar suas finanças. “E esse
desequilíbrio se acentua ainda mais neste período do ano, com o caixa extra do
13º salário”, observa.
Na interpretação do especialista, muitas vezes o indivíduo compra aquilo que
já possui, mesmo não precisando. “Em comum, essas pessoas apresentam
determinadas características: não fazem cálculos sobre seu salário, não
organizam seus gastos nem priorizam despesas, pagam as contas sempre com atraso,
não costumam negociar suas dívidas e têm o hábito de contar com receitas futuras
— como férias, restituição de Imposto de Renda ou ganhos de negócios ainda não
fechados”, destrincha o perfil do devedor-padrão.
Ele alerta para essas facilidades que o mercado oferece nesta época.
“Parcelamento em dez, 12 vezes é sedutor aos olhos, mas pode virar armadilha
para o bolso. Antes de embarcar nas compras parceladas, que podem até triplicar
o valor do produto, o ideal é pesquisar o preço em outros locais e com outras
condições de pagamento”, orienta.
Paulo França ressalta que cada planejamento dos gastos deve ser feito tendo
em vista pelo menos os próximos três meses. “As finanças pessoais têm relação
direta com nossa saúde física e mental. Elaborar um orçamento é uma atividade
preventiva. Ser desorganizado com os pagamentos ou acumular dívidas afeta as
relações pessoais, leva a queda no rendimento profissional e a casos de
depressão”, afirma França. Uma mostra dessa falta de planejamento da população,
comenta Emanuel Gonçalves, é que os meses de março e abril são os que sempre
apresentam os maiores índices de inadimplência, refletindo os gastos
descontrolados do período entre dezembro e fevereiro.
“A falta de planejamento é uma brecha para o consumidor se perder e acumular
dívidas”, avalia o economista Carlos Nei Franca. Para ele, o cartão de crédito
está entre os primeiros da lista dos juros exorbitantes e, portanto, deve ser
logo quitado. “É fundamental também se controlar para não fazer novas dívidas
antes de acertar os pagamentos e poder respirar aliviado”.
***
Pesquisa traça perfil do devedor
O descontrole financeiro vem crescendo nos últimos três anos como a principal
causa da inadimplência do consumidor brasileiro. É o que mostra a pesquisa
Perfil do Inadimplente, realizada pela Telecheque, que ouviu 1.316 consumidores
inadimplentes (que não são, necessariamente, inadimplentes com cheques) entre
setembro e outubro deste ano. De acordo com o estudo, o descontrole financeiro
respondeu por 55% das justificativas dos inadimplentes e o empréstimo do nome
para terceiros por 13%. Os jovens entre 20 e 30 anos são maioria entre os
consumidores com restrição de crédito, representando 37% do total.
“O consumidor brasileiro tem se deparado com muitas oportunidades de gastar
seu dinheiro, o que tem tornado ainda mais complexo o planejamento financeiro e
o endividamento saudável”, comenta o vice-presidente da Telecheque, José Antônio
Praxedes Neto. “A visão da nossa área de recuperação é a de que precisamos
reeducar esses consumidores e tê-los novamente na cadeia produtiva do crédito,
agindo com maior consciência e tornando o consumo e o uso do crédito no Brasil
um círculo virtuoso”, complementa.
A pesquisa também identificou que o perfil mais comum de inadimplentes são os
casados (52%), os consumidores que já concluíram o ensino médio (43%),
empregados em empresas privadas (42%) e com faixa de renda entre R$700 e R$1.050
(24%).
Ainda segundo o estudo, o setor de confecções foi o mais afetado pela
inadimplência, já que 20% dos entrevistados se endividaram com compras
realizadas no segmento. O valor médio das compras que geraram inadimplência
ficou entre R$100 e R$199 (27%), e 59% dos inadimplentes realizaram compras com
pagamento em uma única parcela.
***
DICAS
Defina um limite máximo de gasto para as compras de Natal para que elas não
comprometam excessivamente a sua renda.
Defina antecipadamente um valor para cada pessoa da sua lista de presente.
Assim, poderá aproveitar os passeios em frente às vitrines sem se comprometer
acima da sua capacidade de pagamento.
Programe em casa o que vai comprar naquele dia. Desta forma, você pode se
concentrar em pesquisar os preços dos itens selecionados.
Não deixe que a correria das compras de fim de ano faça com que você se
descuide das condições de pagamento. Então, não se precipite antes de ver taxas
de juros e o saldo da sua conta.
Evite compras com prazos muito longos, pois os juros podem elevar o preço final
e você ainda pode ser pego por um imprevisto no meio do caminho,
impossibilitando-o de quitar a dívida e empurrando-o para a inadimplência.
Evite entrar no limite do cheque especial, pois as taxas de juros são
elevadas e você pode acabar perdendo o benefício do parcelamento sem juros, por
exemplo, no do cheque pré-datado.
Em caso de compras feitas à vista, insista em receber desconto.
Evite gastos desnecessários e compras por impulso, pois o descontrole financeiro
pode prejudicar suas contas e acarretar inadimplência, caso não seja feito
controle rígido de toda a compra realizada.
No caso de compras com cheques pré-datados, além de fazer controle rígido das
datas nas quais os cheques serão descontados, coloque as datas combinadas nos
cheques.
Tenha uma planilha ou um local específico para anotar todos os seus gastos
presentes e futuros. Assim, você poderá controlar o seu orçamento com precisão.