Profissionais e
corporações necessitam visitar
urgentemente um oftalmologista. Explico.
Há empresas que promovem
campanhas nos meios universitários para
recrutamento de estagiários e trainees.
Mas impõem-lhes tantos pré-requisitos
que acabam por não preencherem as vagas.
Formação “sólida” e em instituição de
ensino de “primeira linha”; fluência em,
no mínimo, dois idiomas; domínio de
microinformática, o que abrange
processador de texto, planilha
eletrônica, banco de dados, software de
gestão, entre outros; e, a pior das
exigências, experiência anterior
“desejável”.
Estas mesmas empresas
não observam no seio de seus próprios
quadros a existência de uma legião de
jovens que, relegados a cargos de
auxiliar ou assistente, apresentam
grande potencial, seja pelo espírito de
liderança, pelo senso de iniciativa,
pelas atitudes empreendedoras ou mesmo
pela necessidade. Porém, permanecem como
pedras brutas que precisam ser lapidadas
– mas talvez nunca o sejam.
Estas companhias, por
força de sua incapacidade de enxergar em
seus jovens colaboradores um futuro
promissor, sofrem de miopia.
Há empresas, por outro
lado, que no embalo de modismos e
recomendações de gurus, charlatões e
aproveitadores de toda ordem, resolvem
promover reformas, reestruturações,
reengenharias e que tais. Neste
processo, “descobrem” que certos
colaboradores com idade superior a 40
anos estão velhos e ultrapassados,
contribuindo para aquele estado de
morbidez que assola os negócios – e que
motivou a tal reformulação. Mais ainda,
custam caro aos cofres, pois recebem
remuneração equivalente à de dois ou
três executivos em condições de
tecnicamente exercer igual função.
Decidem, então, aposentá-los,
convidando-os a “enfrentar novos
desafios para promover seu
desenvolvimento pessoal”. Um bilhete
azul, uma indenização, uns meses
adicionais de seguro-saúde. E livram-se
do que se lhes apresenta como um
problema.
O que não se percebe é
que o executivo demitido conhecia não
apenas a empresa, mas seu mercado com
maestria. Perfil dos consumidores,
armadilhas da concorrência. Vivência,
experiência, maturidade. Tudo jogado ao
vento que, talvez, venha a polinizar os
campos de seu maior rival.
Estas empresas, por
força de seu pragmatismo inconseqüente
ao esfacelar sua equipe, sofrem de
astigmatismo.
Analogamente, há os
profissionais que não se conscientizam
da necessidade de investirem em suas
carreiras, ampliando seus conhecimentos,
repertório e rede de contatos. Apostam
na manutenção do in statu quo ante e
acreditam que não correm riscos de
qualquer ordem. Sistemáticos,
automatizados, fazem tudo do mesmo jeito
há anos e continuam dando as mesmas
velhas respostas mesmo para as novas
perguntas. Velhas soluções para novos
problemas. Por não terem visão de
futuro, mas apenas visão de passado,
sofrem de miopia.
Mas há também aqueles
que nunca estão satisfeitos com seu
ambiente de trabalho. Vivem em
transição, buscando recorrentemente
novas corporações não por conta de um
desafio que irrompa triunfante,
possibilitando-lhes colocar à prova toda
expertise e habilidade acumuladas, mas
tão somente por um punhado de moedas a
mais. Não se comprometem, não se
envolvem, não apostam na viabilidade do
empreendimento que gerenciam. Não
desenham trilhas, não deixam marcas, não
registram um legado. Por conta disso,
sofrem de astigmatismo.
Há, ainda, outras
versões de miopia e astigmatismo
corporativo. Afinal, o que dizer de
empresas que continuam a ofertar
produtos e serviços para os quais
simplesmente não há mais mercado?
Calcados em um passado de glórias,
recusam-se a aceitar a ocorrência de
novas tendências, novos hábitos de
consumo, novos padrões de comportamento.
São companhias demissionárias, posto que
demitidas por seus próprios
consumidores, que optaram por produtos
substitutos, tecnologicamente mais
avançados, ostentando maior praticidade,
menor custo e eficiência superior.
Derrotadas, buscam incansavelmente
justificativas para seu retrocesso sem
visualizar o elefante sentado na sala de
reuniões. Derrotadas e vencidas.
O mesmo aplica-se a
profissionais sem profissão, cujas
atividades são objeto de estudo
epistemológico de tão superadas pelo
tempo. Kevin Kline, protagonizando o
arquiteto George Monroe em “Tempo de
Recomeçar”, retrata bem o estereótipo.
Um exímio construtor de maquetes,
edificando-as manualmente há vinte anos,
vê sua atribuição sucumbir diante da
agilidade tridimensional do computador.
Perde o emprego e, com ele, seu único
pilar de sustentação.
Empresas que não
valorizam profissionais, sejam eles
jovens ou maduros. Profissionais que não
buscam o autodesenvolvimento ou que
menosprezam os locais por onde passam.
Companhias que não enxergam sua posição
relativa no mercado, ignorando o
ambiente, a demanda e demais aspectos.
Pessoas que não vislumbram oportunidades
ou ameaças ao seu ofício.
E, assim, a cegueira se
instala no mundo corporativo.