Quando uma pessoa ingressa numa organização é comum que ela traga consigo a
esperança de que essa oportunidade poderá ajudá-la a realizar seus sonhos. E
quando esse mesmo profissional precisa se desligar das suas atividades, seja por
causa de uma inesperada demissão ou para assumir um desafio em outra empresa, é
perfeitamente compreensivo que venha surgir algumas dúvidas e temores. Agora
imagine se o desligamento acontece após 20 anos de atividades contínuas, devido
ao processo de aposentadoria? Se o colaborador não estiver devidamente preparado
para enfrentar a realidade, ele poderá deixar de aproveitar a sua nova fase de
vida.
Foi pensando nos profissionais que atuam há mais de 26 anos na corporação que
a Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG) criou, desde 1998, o Programa de
Preparação para a Inatividade - PPI, uma iniciativa que visa propiciar aos
militares uma mudança de atitude diante da passagem para a reserva, passando a
recebê-la como um fato totalmente natural. Atualmente, a PMMG possui cerca de 42
mil militares, entre homens e mulheres. O Comando Geral da corporação fica
sediado em Belo Horizonte.
"Além disso, nossa proposta visa fortalecer a motivação dos militares para o
desempenho profissional nos anos restantes de carreira e possibilitar uma
melhoria na qualidade de vida desses profissionais após a passagem para a
inatividade, tornando-os mais aptos para desfrutar positivamente essa condição",
explica o assessor de Comunicação Organizacional da 6ª Região da PMMG e
responsável pelo PPI, capitão Antônio Claret dos Santos.
Através do PPI, a PMMG procura ainda conscientizar os militares sobre as
peculiaridades que a inatividade traz à realidade social, tanto no que se refere
às possibilidades e ganhos, quanto às dificuldades e perdas que o processo pode
proporcionar. Outro objetivo do programa é faciliar que os futuros inativos
tenham acesso a informações relativas a assuntos como saúde, lazer, finanças,
família, projetos sociais, entre outros.
Segundo o capitão Claret, a PMMG resolveu criar o PPI depois de observar que
muitos policiais militares, que iam para a reserva, mostravam-se despreparados
para conviver com a sociedade civil, visto que passaram muitos anos sob um forte
regime hierárquico. "A partir daí, a corporação instituiu um trabalho de
pesquisa com o intuito de minimizar o sofrimento desses profissionais",
complementa ele, mencionando que para coordenar o programa foi criada uma
comissão formada pelo gerente de RH, o gerente de Comunicação Organizacional, os
membros da sessão de Saúde e outros militares.
Apesar de ser um programa estadual, no início, o PPI foi implantado apenas na
região Sul de Minas Gerais, ou seja, na 6ª Região da PMMG, pois recebeu algumas
resistências. Na 6ª RPM, o programa encontrou pessoas mais dispostas e crentes
na eficiência e eficácia da proposta. A Unidade de Lavras (8º BPM) foi a
pioneira na implantação do PPI e serviu de incentivo para outras unidades. Hoje,
além de trabalhar com militares que estão dentro da faixa de 26 a 30 anos de
serviço, o programa também aceita a participação daqueles profissionais que já
se transferiram para a reserva. No primeiro ano de implantação, 17 militares
foram beneficiados pela iniciativa e até o momento 228 participaram do PPI.
"Nesse momento, existem 171 militares matriculados no programa, só na 6ª RPM.
Hoje, todas as dez Regiões da Polícia Militar de Minas Gerais aderiram ao
programa", explica o capitão Claret.
A adesão ao PPI é voluntária. Na 6ª RPM, por exemplo, o convite aos militares
fica a cargo de uma comissão designada pela coordenação do programa, que
conversa pessoalmente com os futuros inativos. A princípio, alguns militares
eram preconceituosos e tinham receio, pois acreditavam que ser participante do
programa poderia significar uma possível rotulação de "velhinhos da terceira
idade" ou algo do gênero. Porém, aos poucos, esse medo foi se diluindo, graças
ao empenho, à motivação da primeira turma e à imagem que os primeiros
participantes passaram do programa para a tropa.
Na prática, o PPI possui três fases, que comprende um período de 18 meses. A
primeira etapa, inclui um ciclo de palestras mensais com duração de seis meses.
De caráter preliminar, essa fase objetiva explicar o funcionamento,
diagnosticando, através de questionários, os interesses e as expectativas do
público-alvo, além de formalizar a inscrição dos eventuais interessados. Para as
demais reuniões dessa etapa, são programadas palestras sobre assuntos de
interesse do militar que se prepara para a inatividade como temas relativos a
aspectos sociais, familiares, projetos pessoais, saúde, lazer, financeiro, entre
outros.
Na segunda etapa do PPI, que também dura seis meses e se realiza através de
encontros mensais, são oferecidos ciclos de filmes e desenvolvidas atividades de
integração. Os participantes são divididos em grupos a fim de facilitar o
trabalho. "As atividades de integração são realizadas em reuniões intercaladas
com apresentação de filmes que deverão ser relacionados com os assuntos
abordados", salienta o assessor de Comunicação Organizacional da 6ª RPM.
Na última etapa, que possui a mesma duração de seis meses e encontros
mensais, os grupos são sub-divididos para que sejam desenvolvidas as seguintes
dinâmicas:
- 1º encontro: integração grupal;
- 2º encontro: comunicação - desenvolvimento da capacidade de comunicação
efetiva;
- 3º encontro: mitos - inatividade, família, sexualidade e doenças;
- 4º encontro: perdas de papel - elaboração psíquica de conflitos;
- 5º encontro: criatividade e mudança - novas alternativas de vida e
- 6º encontro: encerramento - feedback e participação da família.
Cada encontro mensal dura quatro horas e acontecem durante o expediente dos
militares. Nesses dias, eles são dispensados de suas atividades e caso o
encontro coincida com o dia de folga, o militar terá direito a outro dia de
folga, posteriormente. Quando questionado sobre a receptividade dos militares em
relação ao PPI, o capitão Claret afirma animado que essa tem sido ótima e que a
iniciativa chegou até a servir de modelo para a Universidade Federal de Lavras.
"O nosso PPI foi tema de uma monografia realizada pela aluna Tatiane Alves dos
Santos, do curso de Administração da UFLA. Após a apresentação do seu trabalho
naquela instituição, o departamento encaminhou uma proposta de implantação à
Reitoria, que acabou sendo aceita e hoje é empregada na Universidade", finaliza
o capitão da PMMG.