A legislação que rege as relações dos bancos com seus clientes vem sendo
permanentemente atualizada pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco
Central, com o objetivo de resguardar os interesses dos usuários e clientes e
contempla exigências muito mais amplas, complexas e específicas do que aquelas
genericamente fixadas na Lei 8.078/90, que instituiu o Código de Defesa do
Consumidor, conforme pode ser verificado nas Resoluções 2.878, de 26.7.2001, e
2.892, de 27.9.2001.
O sistema de atendimento aos clientes implantado pelo Banco Central em todo o
Brasil tem índices e prazo médio de soluções que podem ser classificados como
muito bons e recebe dos bancos atenção prioritária. Sem um elevado padrão de
qualidade nenhum grande banco conseguiria sobreviver atualmente no mercado
brasileiro, cada vez mais competitivo, com forte atuação de grandes instituições
públicas e privadas, nacionais e estrangeiras.
Baixo índice de reclamações
As reclamações sobre serviços bancários no Banco Central caíram 43,5% nos
últimos dois anos, passando de 24.099, em 2.000, para 16.788, em 2001, segundo
informações divulgadas pela Diretora de Fiscalização do Bacen, Tereza Grossi. Os
pedidos de informações sobre serviços bancários ao Banco Central também baixaram
26,7% nesse período, diminuindo de 633.288 em 2.000 para 500 mil em 2.001.
No ano 2.001, os bancos tiveram apenas uma reclamação no Banco Central para 1
(um) milhão 107 mil transações, em média, realizadas para seus clientes. Em
2.000, houve uma reclamação para 683,8 mil transações. Esses dados confirmam a
contínua melhoria na qualidade dos serviços bancários no Brasil, com um aumento
de 61,9% do número de transações realizadas em relação a cada reclamação no
Banco Central.
O volume de transações realizadas pelos bancos alcançou 16,4 bilhões em 2.000,
segundo pesquisa realizada pela Febraban. Em 2.001, a estimativa indica 18,6
bilhões de transações, com um crescimento de 13,3% em relação ao ano anterior.
Bancos em sintonia com o Código de Defesa do Consumidor
O sistema financeiro não é contra o Código de Defesa do Consumidor. Tanto a
Federação Brasileira de Bancos quanto os principais bancos vêm mostrando firme
posição de apoio à Lei 8078/90 e ao que ela representa em termos de respeito e
proteção ao cliente. Em todas as iniciativas de regulamentação de direitos dos
clientes bancários propostas pelo Banco Central, com base nos princípios do
Código de Defesa do Consumidor, em sugestões dos próprios clientes, de órgãos de
defesa do consumidor ou nas características específicas das operações bancárias,
o sistema financeiro posicionou-se claramente a favor dos aperfeiçoamentos
sugeridos.
Os bancos também foram pioneiros em sistemas centralizados de atendimento aos
clientes para prestação de informações e recebimento de reclamações e mantêm
contatos constantes com os Procons e as delegacias do Banco Central de todo o
País, buscando informações sobre problemas que eventualmente ocorrem para
aperfeiçoar os serviços que prestam à sociedade e à economia.
Adin visa esclarecer conflito que pode comprometer poupança pública
A Ação Direta de Inconstitucionalidade impetrada no final do ano passado pela
Confederação Nacional do Sistema Financeiro - Consif, perante o Supremo Tribunal
Federal - STF, tem como principal objetivo resguardar interesses dos clientes e
investidores que confiam sua poupança ao sistema financeiro, evitando conflitos
judiciais por falta de definição do Judiciário sobre a legislação que se aplica
aos contratos bancários.
No direito brasileiro, a Constituição de 1988 distingue dois regimes em
relação ao contratante que não é profissional. O regime comum assegura a
proteção, por lei ordinária, dos direitos do consumidor, considerados como
direitos individuais (art. 5, XXXII) e consagrados no capítulo referente à ordem
econômica (art. 170, V). Diferentemente, o regime dos bancos, abrangendo as
relações com os seus clientes, está previsto no capítulo referente ao sistema
financeiro nacional, devendo, em virtude de determinação constitucional, ser
regido por lei complementar (art. 192). A diferença básica entre as leis
ordinária e complementar decorre do fato de a última ser prevista como tal pela
Constituição e necessitar de aprovação da maioria absoluta do Congresso
Nacional, enquanto a primeira dispensa previsão constitucional e nela basta que
a votação seja por maioria simples.
Trata-se de uma distinção formal, mas que se reveste da maior importância,
pois a Corte Suprema decidiu reiteradamente que as modificações do sistema
financeiro só poderiam ser feitas por lei complementar, razão pela qual,
inclusive, não se aplica aos bancos a Lei de Usura. A matéria foi objeto de
várias decisões, nas quais ficou claro que era preciso que as alterações
ocorressem por lei complementar e que uma única lei deveria abranger todos os
aspectos previstos constitucionalmente. Por outro lado, a lei que rege o Sistema
Financeiro Nacional (Lei no 4.595, de 31.12.1964), recepcionada como lei
complementar, concede poderes ao Conselho Monetário Nacional (CMN) para definir
a política monetária e, conseqüentemente, para baixar Resoluções, regulando o
funcionamento dos bancos e o modo pelo qual as suas operações podem ser
realizadas com os seus clientes. A constitucionalidade desse poder do CMN já foi
reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal.
Na realidade, as operações financeiras se distinguem dos demais negócios
jurídicos de natureza comercial, pois abrangem a moeda e o crédito, que não são
bens e serviços equiparáveis aos demais. Uma empresa comercial ou industrial
vende para o consumidor um bem que é seu e que, normalmente, perderá valor
gradativamente depois de vendido. No caso de um serviço, seu valor, ainda que
seja importante para quem o receba, na maioria dos casos tem pouco ou nenhum
valor de revenda. Já o dinheiro que o banco empresta não é seu, mas do
investidor a quem deve ser devolvido integralmente acrescido de juros. O banco é
apenas um intermediário que só terá a confiança de poupadores e de investidores,
se for capaz de captar e emprestar com eficiência, mantendo-se saudável (com
lucro).
Exatamente por lidar com a poupança pública, os bancos estão sujeitos a um
regime de liquidação especial diferente do regime normal de concordata e
falência, onde os bens pessoais de seus dirigentes ficam indisponíveis e
respondem por prejuízos causados a investidores; são obrigados a manter um
seguro para aplicações de até R$ 20 mil e estão sujeitos a normas e a
fiscalização muito mais rígidas do que todos os demais setores da economia.
Em todos países, legislação própria assegura
confiança dos investidores e poupadores
A principal condição de um banco, para receber depósitos do público, chama-se
confiança. Se estiver sujeito a um regime jurídico inadequado ou a ações que
coloquem em risco o dinheiro que empresta e, conseqüentemente, a poupança dos
investidores que captou para atender à demanda de crédito, não terá a confiança
necessária para receber depósitos do público. Os exemplos de uma crise de
confiança no sistema financeiro estão em todas as partes do mundo e muito
próximo ao Brasil, como o da Argentina, para serem desprezados. Basicamente por
essas razão, em praticamente todos os países, as instituições financeiras, a
poupança, o investimento e o crédito têm legislação própria, específica e
adequada à sua condição de intermediários financeiro, que aplicam no interesse
da comunidade os recursos recebidos dos poupadores e investidores, que lhes
confiam suas economias.
A inadequação do Código de Defesa do Consumidor
às operações e ao funcionamento do sistema financeiro
Legislações como o Código de Defesa do Consumidor ou a denominada Lei da
Usura têm dispositivos que, se aplicados ao sistema financeiro, fatalmente
comprometeriam sua saúde e a confiança de investidores e poupadores. Alguns
exemplos:
- O tomador poderia se arrepender e devolver ao banco, até oito dias
depois, o dinheiro que tomou emprestado, sem nenhum ônus, independente do
fato de a instituição tê-lo captado para conceder o empréstimo, por 90 dias
e com o compromisso de remunerar o poupador/investidor nesse período;
- Um cliente compraria ações num banco e poderia devolvê-las pelo preço
original até oito dias depois, ao verificar que seu preço caiu, em vez de
subir, como ele esperava, alegando apenas que se arrependeu do negócio;
- Os contratos entre um banco e seus clientes poderiam ser anulados por
decisão da Justiça estadual por preverem juros superiores a 12% ou pelo
simples fato de que a condição do devedor, num determinado momento, piorou,
independentemente dos custos de captação do dinheiro e das taxas de juros
vigentes no mercado serem superiores a esse percentual e do contrato do
banco com o investidor.
- Qualquer fato que não seja previsível quando um empréstimo foi
contratado e que altere a relação entre as partes em prejuízo do devedor
pode dar margem à sua anulação, levando uma instituição a receber menos do
que contratou e até menos do que pagou pelo dinheiro, como quase ocorreu com
todos os contratos de leasing em dólares, em diversos tribunais e
instâncias do Judiciário, depois da última maxidesvalorização. Quando a
cotação do dólar era conveniente para o consumidor, porque lhe assegurava
vantagem, era justificável; quando o dólar subiu, tornou-se injustificável
por esse motivo. O fato de ter optado livremente por um contrato em dólares
e se beneficiado com prestações baixas durante longo período pouco importou
a muitos tribunais, ainda que os recursos dessas operações tivessem sido
captados na mesma moeda no exterior.
- O Sistema Financeiro de Habitação ficou comprometido exatamente quando o
governo e a Justiça começaram a tomar decisões que impuseram aos
intermediários financeiros, a pretexto de beneficiar seus mutuários, juros
menores do que os custos de captação das instituições, criando
desequilíbrios entre seus passivos e ativos. Os valores das prestações dos
financiamentos de imóveis à época ficaram irrisórios, permitindo a seus
compradores obterem vantagens absolutamente injustificáveis e causando a
perda de dezenas de bilhões para o erário público no Fundo de Compensação
das Variações Salariais (FCVS). Os benefícios concedidos a poucos, nesses
momentos, comprometeram, por muito tempo, a possibilidade de milhões terem
casa e emprego nos anos que se seguiram.
- Decisões da Justiça que determinaram mudanças nos critérios de apuração
de encargos ou utilização de indexadores, a exemplo das ocorridas no Plano
Collor, provocaram desequilíbrios entre as operações ativas (empréstimos) e
passivas (recursos captados junto a investidores) do sistema financeiro. Se
as perdas resultantes dessas decisões tivessem que ser suportadas pelos
bancos, resultariam em prejuízos superiores ao capital de grande parte
deles, levando-os a uma crise similar à enfrentada na Argentina. Como os
recursos confiscados no Plano ficaram depositados no Banco Central, o
Judiciário decidiu que era responsabilidade da autoridade monetária arcar
com a diferença entre a remuneração recebida pelos investidores naquele
período e a que deveria ter sido efetivamente paga.
- Serviços como os cofres de aluguel praticamente desapareceram com a
inversão do ônus da prova, possibilitada pelo Código de Defesa do
Consumidor. É praticamente impossível uma instituição provar que não é
responsável pelo desaparecimento de bens e valores alegados pelo cliente
numa ação judicial, mesmo que esses bens nunca tenham sido colocados no
cofre. Na há tarifa bancária que cubra risco dessa natureza.
Muitos outros exemplos da inadequação do Código do Consumidor ao sistema
financeiro poderiam ser mencionados. O fato é que o sistema financeiro de
qualquer país precisa ter regras próprias em que a defesa dos interesses dos
consumidores/tomadores de crédito não se faça em prejuízo dos
consumidores/poupadores/investidores. O Código do Consumidor não foi elaborado
com essa ótica de preservação da poupança pública e da confiança da sociedade no
sistema financeiro. O consumidor de serviços bancários, contudo, dispõe hoje de
uma legislação que assegura defesa de seus direitos e as instituições
financeiras estão sujeitas a uma disciplina e a uma fiscalização muito mais
intensas que a grande maioria dos setores econômicos, da mesma forma como ocorre
em outros países.
Reduzir juros e ampliar crédito depende
de uma legislação segura e estável
É essencial para o desenvolvimento do País aumentar o volume de crédito, hoje
de apenas 28% do PIB no Brasil contra mais de 80% na maioria dos países, e
reduzir as taxas de juros para os tomadores, que estão entre as mais altas do
mundo. Para atingir esses objetivos, é fundamental que os contratos bancários,
livremente negociados entre as partes, de acordo com as normas legais e
regulamentares, tenham segurança jurídica e não estejam sujeitos a
questionamentos com base nos denominados direitos difusos, objetos de ações
civis públicas ou coletivas previstas na Lei 8.078/90, que colocariam em risco a
própria poupança popular, ou seja, os recursos depositados nos bancos pela
sociedade.
A atual legislação bancária não impede o recurso ao Poder Judiciário pelo
interessado que eventualmente sentir-se prejudicado, pelo descumprimento do que
contratou com a instituição financeira. A legislação de defesa do depositante,
do mutuário e do arrendatário tem sido progressivamente adequada pelo Conselho
Monetário e pelo Banco Central, inclusive em relação aos princípios genéricos
adotados no Código de Defesa do Consumidor. Essa adaptação é feita levando em
consideração suas características próprias, exatamente para evitar riscos à
poupança pública e ao sistema financeiro, inexistentes e inaceitáveis em
qualquer País do mundo.
Portanto, a despeito das críticas que setores desinformados da sociedade
formularam relativamente à ação direta de inconstitucionalidade aforada perante
o Supremo Tribunal Federal, é mister ficar suficientemente claro que seu
objetivo é exatamente definir de forma a eliminar todas as dúvidas a respeito,
os limites de atuação do Código de Defesa do Consumidor e da legislação federal
pertinente às instituições financeiras. Com essa definição serão eliminados os
conflitos que emergem da atual situação na qual remanescem dúvidas quanto à
esfera de atuação de ambos sistemas normativos. A extinção desses conflitos
trará inevitavelmente benefícios para todos, consumidores ou não, porque atuarão
com base na certeza jurídica decorrente de uma decisão final do Supremo Tribunal
Federal a respeito da matéria.