Quem já está acostumado com o mercado acionário certamente já ouviu os
diversos jargões que o rodeiam, assim como ditados do tipo “sell in may and go
away” (venda em maio e vá embora, na tradução livre). Um, em especial, até os
mais leigos já se depararam no pouco tempo operando: “o mercado sobe de escada e
desce de elevador”.
Variações à parte, a expressão “desce de elevador” remete ao pânico dos
investidores em tempos de crise aguda, quando os fundamentos são deixados de
lado e a palavra de ordem é vender. O P/VPA (Preço/Valor Patrimonial por Ação)
dos papéis - que indica o preço teórico que o mercado estaria disposto a pagar -
foge da média e setores que mostravam robustez até então, definham em meio ao
pessimismo generalizado.
Quando o mercado se depara com uma crise financeira, onde a escassez de crédito
é uma das marcas mais significativas, a volatilidade histórica dos papéis sobe
em escala exponencial e as medidas de risco, intimamente ligadas à variável,
disparam, desqualificando o fator normal* dos mercados.
Neste cenário de extremos, nem mesmo ferramentas como o VaR (Value at Risk) são
confiáveis, uma vez que as distorções em relação à média são evidenciadas e
correlações sem significância estatística começam a influir na carteira,
interferindo negativamente no resultado final.
Distorções significativas
Em função destas distorções, instrumentos que se baseiam em correlações
entre ativos e na distribuição de retornos próximos a uma curva normal
apresentam falhas devido à aversão global ao risco, como explica Raphael Monaco
Shiratori, FRM**, gerente de risco dos fundos Sparta.
A percepção geral do mercado de desaceleração, alimentada por um efeito manada
em prol da venda, eleva a velocidade da desvalorização dos preços e a procura
por ativos considerados de menor risco, com os agentes migrando dos títulos de
renda variável para a renda fixa, ou simplesmente embolsando os lucros.
Perante o cenário extremamente adverso, a diversificação, que antes protegia a
carteira do investidor, pode não ser suficiente para amenizar as perdas. E o VaR,
parâmetro para o controle de risco, pode apresentar oscilações desproporcionais
a cada pregão, não sendo, portanto, uma ferramenta confiável em tempos
“anormais”. E agora?
Levando a análise ao extremo
Com as hipóteses anuladas, o gerente de risco dos fundos Sparta sugere
intercalar VaR e outra mensuração de risco conhecida como Stress Test. “O Stress
Test faz a conta exatamente onde o VaR falha, em momentos de alta correlação e
retornos com amplitudes muito elevadas”, afirma.
O Stress Test é baseado em uma série de simulações de cenários (variação de
preço de diversos ativos) com o objetivo de simular o retorno da carteira do
investidor na situação imposta. Neste caso, cenários de crise e de alta
correlação entre os ativos.
Assim como no caso do VaR, a pior perda esperada na simulação será o valor do
Stress Test, ou seja, a perda máxima tolerável da carteira olhando o histórico
de variação dos preços em outras crises.
Junto com os grandes
Grandes fundos de investimento utilizam a métrica para controlar o risco de
suas carteiras, como no caso do AHL, uma das maiores gestoras de investimentos
do mundo focada em estratégias quantitativas no mercado de futuros.
Segundo Matthew Sargaison, CRO (Chief Risk Officer) da AHL, o Stress Test é
calculado diariamente pelos sistemas do fundo e avalia os dois piores cenários
de perdas com uma base histórica de 30 anos, o que gabarita a gestora para
comparar as perdas médias verificadas nas principais crises globais ocorridas em
três décadas e se posicionar através da volatilidade.
Segundo o CRO, quando a volatilidade aumenta consideravelmente, historicamente
configurando um prenúncio de crise nos mercados, o instrumento lança um sinal ao
sistema, que, automaticamente, reduz sua exposição ao mercado de forma
progressiva ao aumento ou queda da volatilidade.
As tradicionais medidas de risco, como o VaR, tendem a atenuar as potenciais
perdas em um cenário crítico, reitera Sargaison sobre a importância do Stress
Test em tempos de crise financeira.
Avalie o cenário antes
Entretanto, Shiratori lembra que este método deve ser utilizado em cenários
extremos de crise, uma vez que é muito conservador em comparação ao VaR, que
deve ser utilizado rotineiramente, em condições normais de mercado.
“VaR é uma medida que vai te proteger no dia a dia, onde o mundo mantém suas
correlações históricas entre os ativos e os retornos estão dentro de uma faixa
bastante aceitável. O Stress Test neste mundo “calmo” em nada ajuda, pois não
refletirá a realidade”, atenta o gerente de risco dos fundos Sparta.
Portanto, o investidor deve monitorar essas duas medidas e estabelecer os
limites de risco tanto para o VaR, quanto para o Stress Test, sugere Shiratori,
“lembrando apenas que o limite de Stress Test deve ser maior que o limite do VaR”,
uma vez que estamos tratando de um cenário muito volátil.
Afinal, estou protegido?
A simulação proposta para estabelecer os limites de risco da carteira em
cenário de crise pode ser considerada estatisticamente uma importante métrica ao
investidor, já que proporcionará níveis confortáveis de exposição da carteira em
tempos de crise.
Aliado ao controle de risco, uma carteira cujos ativos tenham um bom resultado
acumulado, ou seja, diversificada, tende, como demonstrado na última matéria, a
reduzir volatilidade da carteira e, portanto, auxiliar o investidor na busca de
um bom resultado no mercado.
* Eventos aleatórios que desenvolvem ao longo tempo uma forma simétrica em torno
da média.
**Certificado FRM® (Financial Risk Manager) pela Global Association of Risk
Professionals