Entenda o universo dos "grafistas" e saiba por que suas ideias polêmicas começam
a ser aceitas por alguns fundamentalistas
Por meio dos gráficos, analistas tentam prever o comportamento das BolsasEles
são populares entre os investidores, adorados pelas corretoras e controversos no
meio acadêmico. Os analistas técnicos vêm se tornando verdadeiras celebridades
do mercado financeiro, atraindo para suas palestras e cursos legiões de
investidores em busca de sucesso na bolsa. Por meio de gráficos que mostram o
histórico de negociações dos ativos, esses profissionais procuram prever seu
comportamento futuro a partir de figuras que recebem nomes curiosos como "ombro-cabeça-ombro",
"bandeiras" e "flâmulas". Mas embora suas orientações sejam acolhidas por
operadores bem-sucedidos, os "grafistas", como foram apelidados, ainda são
figuras polêmicas. Entre os investidores da escola fundamentalista, vertente
focada na análise dos fundamentos das empresas, há quem critique a falta de
comprovação da eficiência do uso dos gráficos. Mas já há aqueles que acreditam
que a análise gráfica pode, sim, ser útil e caminhar lado a lado com a análise
mais acadêmica.
O objetivo principal da análise técnica é identificar boas oportunidades de
ganhos, principalmente no curto prazo. Para isso, os analistas usam gráficos com
a evolução histórica dos preços dos ativos em períodos que podem variar de anos
a horas ou até minutos. Dessa forma, eles acreditam ser possível prever a
tendência desses preços no futuro mais imediato e, assim, detectar o melhor
momento para a compra ou a venda de um papel. "O mais importante não é prever os
preços, mas entender se o movimento tem força para continuar ou se vai mudar de
direção", explica Rodolfo Cavina, analista da corretora Gradual.
Isso seria possível porque a análise técnica parte da premissa de que os
ativos seguem tendências de alta ou baixa, formando padrões. A ideia é,
portanto, seguir a manada. Afinal, os "grafistas" acreditam que quem determina
os preços dos ativos são os grandes investidores - também chamados de "tubarões"
em fóruns de discussão do mercado financeiro. Ao segui-los de perto, as
"sardinhas", ou pequenos operadores de bolsa, também terão sua recompensa.
Para ter sucesso, no entanto, os adeptos dessa corrente se resguardam contra
os revezes do mercado por meio de ordens conhecidas como "stop loss",
que permitem ao investidor limitar as perdas caso uma tendência se reverta
rapidamente. Operar usando um "stop" não é exclusividade de quem se
baseia nos gráficos, mas os analistas técnicos são seus mais ardorosos
defensores. "Não existe análise 100% confiável. Algo inesperado pode ocorrer, e
o mercado pode virar. O 'stop' serve como um paraquedas para o
investidor não ter um grande prejuízo", explica Fábio Franchini, analista
gráfico da corretora Link.
"É isso que diferencia as pessoas que defendem suas posições daquelas que
operam segundo a estratégia do 'buy and hold' (comprar e segurar),
achando que, no longo prazo, mesmo ações em queda livre vão voltar a subir",
explica Fausto Botelho, presidente da Associação Nacional dos Analistas Técnicos
(ANAT) e um dos gurus da análise gráfica no Brasil. Segundo ele, como não existe
uma definição precisa do que seja longo prazo, o melhor é sempre se proteger. O
economista usa como exemplo as ações do mercado imobiliário japonês que ainda
não viram recuperação desde o estouro da bolha de 1990. "Infelizmente, no longo
prazo pode ter investimento errado sim", diz.
Por ter como foco a descoberta dos melhores pontos de entrada e saída do
mercado, a análise técnica geralmente é a preferida dos investidores mais
imediatistas: os "day traders" (que compram e vendem uma ação no mesmo
dia), os "swing traders" (que fazem operações curtas de alguns dias ou
semanas, mas em geral de menos de um mês) e os "position", que buscam
surfar tendências maiores, de dois ou três meses, podendo ultrapassar um
semestre.
Críticas
Porém, esse viés imediatista e a falta de comprovações rigorosas quanto à
eficácia dos seus métodos fazem com que a análise técnica seja alvo de duras
críticas de grande parte dos economistas adeptos de outra vertente de análise, a
fundamentalista. Esses profissionais, em geral, desconfiam da possibilidade de
se deduzir o comportamento futuro do mercado a partir de oscilações passadas e
acreditam que as melhores chances de rentabilidade estão na compra de ativos com
valor abaixo de seu "preço justo", desde que as expectativas em relação à
empresa sejam positivas. Ou seja, surfar a favor da maré não seria, a rigor, a
melhor estratégia para o sucesso. Como esses profissionais determinam o preço
justo? A partir de uma análise rigorosa dos fundamentos da empresa, das
perspectivas para o seu setor e do cenário macroeconômico.
"Os analistas técnicos acertam suas previsões de maneira aleatória. Os 'stops'
são eficientes. Mas a análise técnica, de maneira geral, vai contra qualquer
teoria de finanças", afirma Samy Dana, professor de finanças da FGV-SP. Para
ele, a única exceção seriam as operações de curtíssimo prazo, realizadas em alta
velocidade por computadores, como o que acontece nos fundos quantitativos.
"Nesse caso, basear-se no preço muito recente do ativo operado traz sucesso à
operação", complementa.
Apesar de rejeitada no meio acadêmico, a análise gráfica vem se tornando cada
vez mais popular entre os investidores, principalmente os que buscam maior
rentabilidade num prazo mais curto. O fato de serem mais simples de entender
também favorece os gráficos. Hoje em dia, muitas corretoras já contam com
departamentos de análise técnica que disparam relatórios diários. Algumas
inclusive vêm conseguindo aliar o estudo dos gráficos à análise fundamentalista.
"As corretoras amam os analistas técnicos, pois as operações de curto prazo
tornam-se mais frequentes e, consequentemente, pagam-se mais corretagens", diz
Fausto Botelho.
Embora ainda lute por um reconhecimento mais formal, a análise técnica já
conseguiu tornar famosos alguns de seus principais representantes no Brasil.
Além de Botelho, é o caso de nomes como Márcio Noronha, um dos pioneiros dessa
vertente no país, autor de um dos mais importantes livros em português sobre o
tema; Eduardo Matsura, que participou do desenvolvimento dos primeiros softwares
de análise técnica do Brasil; o matemático Luiz Antonio Pinto, o Parddal, que
também faz parte da diretoria da ANAT; ou ainda o "sem-papas-na-língua" Didi
Aguiar, autor do modelo gráfico "Agulhada do Didi" e ex-apresentador de um
reality show sobre a Bolsa no extinto canal a cabo Ideal.
O presidente da ANAT admite que a análise técnica ainda não é completamente
aceita entre os economistas, mas defende que o assunto seja lecionado em
universidades, a exemplo de alguns países europeus e dos Estados Unidos. "A
análise fundamentalista é muito mais difícil de ser elaborada do que a técnica,
que só depende da interpretação do gráfico. Além disso, tem uma parte da análise
gráfica que compara os comportamentos de massa a figuras, que receberam nomes
peculiares. Isso confere uma certa aura de 'misticismo' que não condiz
absolutamente com a matéria, mas que causa aversão aos analistas
fundamentalistas. Acaba sendo muito mais fácil para esses profissionais dizer
que aquilo não funciona do que penetrar naquele universo", avalia o economista.
Análise integrada
Mas de ambos os lados já existem profissionais que acreditam que as duas
vertentes são, na realidade, complementares. Embora defendam que os analistas
devam escolher um lado, os "grafistas" acreditam que os investidores podem
combinar as duas correntes para ter mais segurança. Para Fábio Franchini, da
Link, a análise técnica é mais voltada para o especulador, ou seja, o investidor
que opera no curto prazo para aproveitar a onda do mercado. A fundamentalista,
por outro lado, é mais para quem tem uma visão de longo prazo. Fausto Botelho
vai além: "A análise fundamentalista pode ser usada para fazer a escolha das
ações, o chamado 'stock picking', e a técnica para definir o momento
certo de fazer as operações", diz.
Mesmo entre os fundamentalistas também já existem os "integrados". Flávio
Conde é um deles. Ao lado do "grafista" Rodolfo Cavina, seu colega na corretora
Gradual, Conde apresenta uma palestra, nascida na Expo Money 2009, justamente
sobre essa complementaridade entre as duas escolas. "Essa rivalidade é uma coisa
mais antiga, de um mercado financeiro menos sofisticado. Agora que existem mais
analistas no mercado e que os fundamentalistas estão mais bem preparados,
descobriu-se que as duas linhas não são antagônicas, mas podem se ajudar", opina
Conde.