Muito tem se falado nos últimos tempos sobre as iniciativas com o objetivo de
incentivar os brasileiros a procurar o mundo dos investimentos, principalmente
os investimentos de renda variável (Bolsa de Valores). Nosso dever é apoiar
essas iniciativas e brindar as mudanças que elas despertam na população:
acreditar e agir de forma a, através dos investimentos, ter condições de
encontrar a realização de seus sonhos e objetivos.
O artigo de hoje é uma reflexão, pois algo ainda me incomoda. Observo tudo
com otimismo, mas ainda com um pé atrás. Não me tenha como um pessimista ou
“chato de plantão”, mas como alguém que convive com uma realidade diferente no
contato com as pessoas: a grande maioria da população ainda está “a quilômetros
de distância” de se tornar um investidor, ainda mais se considerarmos o mercado
de ações.
Muito crédito, consumo e inadimplência em alta
Na última semana, dados foram divulgados mostrando que a inadimplência aumentou
nos últimos meses. Mais cheques sem fundo e mais pessoas no rotativo do cartão
de crédito, entrando com força total na roda viva dos juros altos. O
Navarro abordou o tema em duas oportunidades recentes:
“Educação financeira, critérios e prioridades” e
“Crescimento não rima com endividamento”.
As desculpas, ou justificativas como preferem alguns, para esse aumento foram
o Dia das Mães e o Dia dos Namorados. Não as datas em si, é claro, mas o exagero
nos gastos e o parcelamento das compras realizadas nesses dias. A verdade volta
à tona: crédito não é dinheiro grátis e, como sempre, a conta mais cedo ou mais
tarde chegará.
Se a inadimplência aumentou, é claro que o diagnóstico não poderia ser
diferente. O brasileiro não desenvolveu sua capacidade de poupança, mesmo sendo
evidente o aumento de renda e poder de compra da população. Os que estão
ganhando mais e melhor estão destinando seus recursos ao consumo, e só ao
consumo.
O que se pode fazer, de fato, para mudar essa situação?
Iniciativas de Educação Financeira precisam ir além de práticas que simulem
investimentos e mercados. É preciso entender a real necessidade das pessoas. As
pessoas precisam de ajuda para colocar as contas em dia e isso não se faz apenas
através de discursos e projetos com as melhores intenções; é preciso partir do
começo, do básico.
Ninguém esquece as décadas de descontrole econômico. Inflação, dólar, dívida
externa são alguns dos termos do dia-a-dia financeiro que criaram verdadeira
repulsa em muitos brasileiros. Discutir dinheiro não trazia benefícios, doía e
incomodava. Tudo o que estava ligado à economia era visto como extremamente
ruim.
Nesse ambiente, as famílias criaram uma barreira enorme para discutir o
orçamento financeiro. Criou-se a idéia de que para conseguir comprar algo, só
mesmo comprando parcelado e/ou com dinheiro emprestado. Planejar o futuro, a
aposentadoria, não valia a pena, pois a inflação destruía o capital guardado e a
qualquer hora o plano econômico mudava.
Aprendizado e maturidade
O tempo passou, o Brasil mudou e melhorou. A migração social trouxe oportunidade
de consumo para muitos brasileiros e o acesso facilitado ao crédito aproveitou a
crença anterior das conquistas por parcelas. Resultado? O brasileiro se perdeu
nos controles e caiu de cara nas dívidas.
O desejo de consumir não pode ser maior do que o planejamento, lição simples
que precisa ser trabalhada nas escolas, comunidades e empresas. O trabalho nos
fundamentos da educação financeira tendem a atrair resultados ainda melhores
para as iniciativas de investimento. Porque apenas incentivar os devedores a
investir pode ser um tiro no pé, na medida em que eles percebam isso como uma
realidade muito distante da sua. Investir que dinheiro? Para quê? Por quanto
tempo? Com que banco? Corretora? Como funciona? É seguro?
Mesmo quem já tem uma vida com as contas no azul e hoje consegue poupar em
outros produtos tem que estar muito bem informado sobre o que vai encontrar no
mercado de capitais. Preocupo-me porque há certa euforia com ganhos rápidos,
especialmente nos jovens. Vender a ilusão de riqueza na bolsa é um crime contra
o país e todos os avanços que conseguimos alcançar no decorrer do tempo.
Fazendo a lição de casa ao lado da educação financeira
Tome o que aconteceu há pouco tempo como exemplo, quando a crise de crédito
estourou. Período em que o Ibovespa despencou e muitos estavam lá apenas
baseados nas notícias de sites e revistas especializadas. E isso vai acontecer
mais vezes. Assim como períodos de ganhos prolongados também virão.
Para concluir, peço que interprete bem minhas palavras: eu defendo e invisto
em ações. É importante que tenhamos esse mercado forte e disseminado, afinal ele
representa empresas que apostam no crescimento do país através de sociedades
abertas. Nosso universo potencial de clientes para este mercado é enorme, mas
precisa ser educado, compreendido e valorizado. Acredito que o aprendizado e a
experiência são mais importantes que apenas a componente sorte.