Imóveis - Quitou o imóvel, mas não é o dono. Há uma hipoteca...
O apartamento de Rubens Reis no Condomínio Olympic Higienópolis, construído
pela Gafisa, foi totalmente quitado em 1998. O de Marianne Krebs, adquirido da
Rodhis Construção e Comércio Ltda., também. Mas recentemente eles descobriram
que não são donos de nada, pois os imóveis estão hipotecados: para erguê-los, as
construtoras captaram financiamento em bancos e deram as unidades dos edifícios
como garantia do pagamento da dívida. No caso de Reis, a escritura definitiva só
será liberada a partir de 2005, quando a dívida da Gafisa for quitada com o
Banco Sudameris. Já no de Marianne, a escritura não tem data para sair, pois a
Rodhis moveu ação contra o Bradesco para discutir o valor da dívida em dezembro
de 2000 e o processo, segundo a advogada da empresa, Patrícia Bidutti Cortez,
está em fase de perícia. Certo é que, sem o documento, nem um nem outro podem
vender o apartamento. E, se o compromisso com os bancos não for honrado pelas
construtoras, eles correm o risco de ter seus imóveis penhorados, podendo
perdê-los a qualquer tempo em leilão...
O que mais surpreende nessa história, no entanto, é que tudo foi feito pelas
construtoras com a “anuência” dos consumidores: do contrato de compra dos
imóveis que assinaram consta uma cláusula estabelecendo que, caso fosse feito
empréstimo para concluir a obra, eles concordariam com a hipoteca. “Só que eu
não tinha consciência do que isso significava”, relata Reis. Marianne chegou a
levar o contrato de compra do imóvel a um advogado, mas não foi advertida sobre
as implicações daquela cláusula. “Agora não sei como resolver a situação, pois,
sem a escritura, o apartamento não é meu.”
Em resposta ao JT, a Rodhis diz “que nada deve mais ao Bradesco e a
liberação da escritura depende do banco”. Já a Assessoria de Imprensa do
Bradesco alega que “a liberação da hipoteca só será feita se comprovado o
efetivo pagamento do débito correspondente”... Enquanto o impasse não se
resolve, uma liminar obtida pela Rodhis na Justiça garante os interesses dos
moradores, impedindo o banco de mover ação de execução. Já a Gafisa diz, por
meio de sua Assessoria de Imprensa, que está à disposição dos consumidores para
as tratativas pessoais que se fizerem necessárias.
Conforme explica Amaro Heitor Dantas, responsável pela área Cível da Martinelli
Advocacia Empresarial, os consumidores têm direito à escritura de seus imóveis,
pois a hipoteca é nula. “A lei que regula o Sistema Financeiro de Habitação diz
que a hipoteca só garante a dívida enquanto o bem pertencer ao devedor
(construtora). A partir do momento em que as unidades são construídas e
alienadas a terceiros, ela perde a validade perante o consumidor, que responderá
apenas pela dívida que assumiu com seu negócio, não pela eventual inadimplência
da construtora.” A cláusula, segundo Dantas, viola também o princípio da boa-fé
objetiva que deve prevalecer nos contratos (artigo 478 do Novo Código Civil).
“Ela outorga plenos poderes ao vendedor para atuar em seu único e exclusivo
interesse em detrimento dos do consumidor, que fica em desvantagem”, argumenta.
Para Bruno Mattos e Silva, autor de Compra de Imóveis (Editora Atlas), a
cláusula-mandato é inconstitucional “por se mostrar excessivamente onerosa para
o adquirente”. Ele ressalta que “os tribunais, de forma unânime, têm reconhecido
a invalidade da hipoteca nessas situações, sob a alegação de que a cláusula que
a prevê é abusiva, nos termos do artigo 51 do CDC”. Essa também é a posição do
STJ, constatadas em repetidas decisões. Aos que como Reis e Marianne estão
enfrentando esse problema, o caminho, segundo Mattos, é a Justiça. “Só lhes
resta ingressar com ação contra o banco e a incorporadora pedindo tanto a
declaração de nulidade da cláusula de hipoteca quanto a sua desconstituição, o
que lhe dará direito à escritura do bem”, aconselha.
Dantas ressalta as chances de resolver o problema com rapidez são maiores se no
processo for feito um pedido de tutela antecipada (decisão em caráter de
urgência dada pelo juiz logo que o consumidor ingressa com a ação), por meio da
qual se pode conseguir o cancelamento ou a suspensão de imediato da hipoteca
antes mesmo do julgamento do processo.
DICAS
Fonte:
Secovi-SP e Martinelli Advocacia Empresarial
1)
Evite assinar
qualquer contrato de compromisso de venda e compra sem antes analisar
cuidadosamente as cláusulas contratuais. Consulte um advogado
especializado em direito imobiliário. |
4)
Nos casos em que o
imóvel pretendido for usado, ou mesmo novo, cuja contrução não esteja
sendo ou não foi financiada pelo SFH, faça com que fique estabelecido em
contrato de quem é a responsabilidade pela obtenção de eventual
financiamento: se do comprador, do vendedor ou do construtor. |
2)
Verifique se a
incorporadora já tem a escritura de compra do terreno, se o projeto está
aprovado pela Prefeitura e se a incorporação foi registrada no Registro
de Imóveis competente, como prevê a Lei nº 4.591/64 (Lei das
Incorporações Imobiliárias). |
5)
Caso o imóvel
adquirido esteja hipotecado, e do contrato de promessa de compra e venda
conste a cláusula que a prevê, o caminho é recorrer à Justiça para
tentar anulá-la ou suspendê-la por meio de pedido de tutela antecipada. |
3)
Exija da
incorporadora o memorial descritivo do imóvel e obtenha no Cartório de
Registro de Imóveis a Certidão de Registro Geral do Imóvel que se
pretende adquirir, para conferir se há hipotecas ou outras pendências. |
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