O que me desperta o interesse em iniciar o texto com este trocadilho nada
mais é do que a crença de que muitas situações difíceis podem ser encaradas de
uma maneira mais leve do que nos parecem na convivência com pessoas. Sim, porque
conviver com alguém no ambiente de trabalho não implica conhecer somente os
sentimentos aceitos socialmente, mas também os não aceitos.
Conviver com gente significa lidar com todos os tipos de sentimentos e entre
os mais diversos, a inveja. Então, chegou o momento de pensarmos também na
inveja, cuja origem latina é "invidere", que significa não ver.
Já no dicionário da Língua Portuguesa, o seu significado é escrito de duas
maneiras: Desgosto ou pesar pelo bem ou felicidade de outrem; e desejo violento
de possuir o bem alheio. Ou seja, conforme o seu significado, a inveja existe
quando se tem infelicidade pelo sucesso alheio ou quando há uma vontade, a todo
custo, de ter o mesmo progresso que a outra pessoa teve.
Como escreve o sociólogo e professor, Jean-François Chanlat "a inveja é a
contrariedade que se sente se outro dispõe do que se gostaria de ter para si e a
impressão concomitante de inferioridade". Ou seja, a inveja é a indisposição em
aceitar que uma determinada pessoa foi promovida ou teve o seu salário
reajustado, enfim, tenha atingido metas que o "invejoso" não acredita alcançar
para si. E quando isso acontece, este indivíduo não mede esforços para diminuir
ou até mesmo destruir as conquistas da pessoa invejada.
Ao contrário de um trabalhador com comportamento aceito como "normais", a
pessoa invejosa consome mais energia e esforços para desqualificar o trabalho de
um colega, do que para desenvolver ou melhorar as suas atividades. Com uma piada
maldosa ou uma curta frase lá está ele tentando diminuir a importância e os
valores de outro profissional na equipe.
Uma pessoa que na maior parte do seu tempo cultiva a inveja, dificilmente
elogia ou reconhece as outras pelo simples fato de que não consegue reconhecer a
si mesmo. Para as organizações, este problema pode passar de um pequeno conflito
entre duas pessoas - invejado e invejoso - para um desafeto geral na equipe e
uma consequente queda na produtividade. Neste caso, se você é o invejado e
percebe que não existe um comportamento legitimadamente ético entre os
profissionais no seu trabalho, a única maneira de conseguir progredir com menos
sofrimento é sendo você mesmo, agindo de uma maneira saudável emocionalmente,
buscando os seus ideais e do ponto de vista prático, documentando processos,
arquivando e-mails importantes e capacitando-se sempre.
Apesar de a inveja não ser um tema novo nas empresas, - em Gênesis (Cap. 4,
vers. 1-16) mostra que foi por alimentar este sentimento que Caim levou à morte
o seu irmão Abel -, no livro A organização por Trás do Espelho, a autora Fela
Moscovici escreve que "na empresa, a alegoria de Caim e Abel se mantém até hoje,
nos diferentes níveis hierárquicos e setores". E, de fato, é uma constatação
revivida por todos nós independente do negócio em que atua ou porte da empresa.
Por mais que queiramos acreditar ser um sentimento vivido pelos outros ou apenas
por inimigos, o fato bíblico nos chama a atenção para as pessoas mais próximas.
Basta alguém se despontar por seus esforços e méritos, e lá está a inveja, quase
pronta para dar o "bote".
É claro que este texto não objetiva aumentar a paranóia de ninguém, tampouco
afastar as pessoas umas das outras, em virtude do medo de que estas em algum dia
venham "tirar o seu chão" ou "puxar o seu tapete" como dito nas organizações.
Muito pelo contrário. O intuito primeiro é aceitar que a inveja existe; segundo,
aceitar que é possível habitar o coração de qualquer ser humano; e terceiro,
refletir sobre uma postura diferente ao senti-la.
Se já sabemos que a inveja existe e que é possível qualquer um senti-la,
resta agora, a terceira proposta. Para quem a sente em demasia, poderia ser
prático e objetivo, dizer: "olhe para dentro de si". Mas, como não é suficiente,
retomo a origem da palavra "inveja", invidere, que significa
não ver. Ao invés de continuar não olhando para dentro de você, não se
vendo, exercite outra atitude: identifique as suas forças, conheça as suas
limitações e desenhe o seu destino dentro da organização na qual trabalha. Ao
conhecer as suas emoções, fica mais fácil desenvolver-se como pessoa e como
profissional.
Ao praticar o autoconhecimento é possível reduzir o seu sofrimento, sim
porque quem somente deseja as flores do jardim alheio também sofre. Quem nunca
se satisfaz com o próprio jardim, sofre tanto quanto aquele cujas flores foram
pisoteadas. Pesquisadores japoneses identificaram que ao sentir inveja, as
pessoas ativam a mesma região do cérebro: córtex dorsal anterior, que é
responsável pela dor física. Portanto, meu caro, sentir inveja pode ser normal e
até aceitável, mas daí a agir de uma maneira imprudente para destruir a imagem
do outro passa a ser digno de atenção.
A inveja desperdiça um espaço não só no cérebro, mas no coração, que pode ser
preenchido, por exemplo, por sentimento de respeito a si mesmo e,
consequentemente, ao colega. Ela está enraizada ao receio de perder, de não ser
amado, não se manter no emprego, enfim, ao medo que é ampliado pela própria
pessoa que o sente. Entretanto, da mesma maneira pode ser eliminado a partir do
momento que tem clareza sobre a realidade e o contexto, compreende o universo
que a cerca e passa a perceber que o outro também é um ser humano.
Se a inveja o consumir, cuide de sua saúde e pense no seu invejado como um
modelo a seguir e não a prejudicar. Reserve as suas energias para utilizá-las na
realização de suas metas. Há sempre alguém melhor em alguma área. Hoje pode ser
o seu colega, amanhã pode ser você. Use as suas virtudes para o bem. Cada passo
dado é merecedor de respeito, seja pelo seu colega, seja por você. Mas, se até
este momento nada do que leu lhe servir, não veja a mim. Feche os olhos e, com
carinho, veja você.