Responda rápido: você não se cansou ainda de ver nas prateleiras livros
pretensiosos que ditam regras de como ser feliz, como vender de tudo, como
alcançar a paz de espírito, como chegar ao nirvana e coisas afins?
Travestidos de textos de descoberta e auto-ajuda (não consigo me esquecer da
piada do cara que entrou na livraria e pediu ajuda para achar os livros daquela
seção…), o que se vê são variações sobre temas similares, releituras de visões e
experiências que vem sendo contadas há milênios desde os textos sagrados (estes
sim, originais…). A coisa segue em níveis cada vez mais profundos de pretensão,
com títulos que prometem fórmulas e receitas em uma pequena quantidade de passos
fáceis.
Efeitos colaterais – Vamos refletir sobre um exemplo prático de temas que
inundam as prateleiras das livrarias: vendas e sucesso pessoal. O primeiro
efeito colateral que enxergo é uma quase que total obrigação (por parte de quem
lê) de que os conselhos dos textos sejam seguidos à regra.
Explico: imagine um vendedor bem-sucedido, mas como todo o ser humano, também
sujeito aos seus tombos. Quando lê um desses livros, geralmente distribuídos em
uma convenção de vendas em que a diretoria já mostrou os objetivos daquele
trimestre, semestre ou mesmo ano e sinaliza quase que diretamente que o livro
pode ser o verdadeiro manual, o incauto se vê em uma situação complicada.
Conflitos internos – Todos os seus pares lerão o livro. Os concorrentes
também. Nada contra, até aí, leitura é sempre saudável. O problema é que nesse
momento, imediatamente um botão interno é acionado e o sujeito se vê em uma
sinuca. Se não praticar o que está dito ali pode não conseguir ser bem-sucedido.
Nunca mais. Se praticar e não alcançar as promessas que estão no texto, ele se
sentirá eternamente diminuído em relação aos outros e a si mesmo. Inicia-se
então uma espiral descendente de angústia e ansiedade.
Imagine que essa situação se repete indefinidamente em momentos distintos da
vida do ser humano, além dos que menciono aqui: obesidade, conflitos de
relacionamento, sorte no amor, como ficar rico sem fazer força.
Resultados imediatos – O que temos como inevitável conclusão (apontada
principalmente pelas grandes tiragens e vendas desses livros) é que existem hoje
algumas gerações de pessoas e empresas absolutamente ansiosas por resultados
imediatos, de curto prazo e que funcionem como receitas ou mapas de entendimento
fácil e aplicação rápida.
O medo corporativo – O que sobra então para o indivíduo e sua capacidade
de realização? Peter Drucker já disse que se um historiador do futuro olhasse
para o final do século XX e todo os seus progressos, não diria que os grandes
feitos foram a Internet ou o comércio eletrônico, mas sim a grande mudança na
condição humana: a possibilidade de escolher.
Não me parece que, sob esse ângulo da auto-ajuda, estejamos realmente exercendo
essa capacidade. O que vejo com cada vez mais freqüência, principalmente no
ambiente corporativo, é a presença do elemento mais desestabilizador e nocivo
que conheço: o medo. Medo corporativo: “Manda quem pode, obedece quem tem juízo”
Ou ainda: “Você não é pago para pensar e sim para trabalhar” Medo que causa nas
pessoas o desejo inevitável de buscar nos textos fáceis as soluções de curto
prazo e, com isso, viver com ainda mais medo. Medo de não ser competitivo, de
não ser vencedor, de não ter poder.
A possibilidade de escolha – Então, a questão principal, passa a não ser
mais o livro e sim o indivíduo e suas escolhas. Estar feliz com o que se é e com
o que se quer ser, é o que nos diferencia, além de um comportamento quase
rebelde de não se emular idéias e atitudes que de forma traiçoeira envolvem as
pessoas, fazendo com que se acredite que aquele é o único jeito de fazer as
coisas.
O livro é um bom ponto de partida. O que se faz a partir daí é o que importa. Se
a ansiedade é maior do que a ajuda, esqueça o livro e os resultados projetados
por ele. Escreva você mesmo a sua história.