Se a empresa não reconhece seu talento, é hora de seguir os mandamentos do
guru Stephen Covey. Use a cabeça e o coração - e valorize seus pontos fortes
Stephen Covey, um dos consultores mais badalados da atualidade, conhece como
poucos a essência da palavra sucesso.
Ele já vendeu mais de 20 milhões de livros em todo o mundo. Somente Os 7 Hábitos
das Pessoas Altamente Eficazes, um dos maiores best-sellers do chamado filão de
auto-ajuda, bateu na casa dos 16,5 milhões de exemplares. Sua empresa, a
Franklin Covey Company, fatura algo em torno de meio bilhão de dólares por ano.
Suas palestras provocam um verdadeiro frisson na platéia. O que tem Covey de tão
especial para agradar a profissionais dos mais variados perfis? Não há como
negar seu carisma, principalmente quando está no palco encarando uma platéia
numerosa. Durante as apresentações, ele fala da importância da família, elogia
publicamente os próprios filhos, que estão a seu lado, e utiliza frases de
efeito, como "você negligenciou sua família, sua saúde e sua integridade em nome
do trabalho. Chegou a hora de aprender a dizer não". Covey, que é mórmon, tem
nove filhos e 35 netos (há outros três a caminho), está preparando mais um
livro, que em breve chegará às livrarias de todo o mundo. Nele, faz duras
críticas às empresas. Afirma que as organizações não conhecem nem metade da
capacidade de seus funcionários. E por isso estão perdendo muito dinheiro.
Stephen Covey veio ao Brasil no último mês de junho. Após duas horas de palestra
para cerca de 400 profissionais do grupo Pão de Açúcar, ele concedeu, com
exclusividade, a seguinte entrevista a VOCÊ S.A..
Em seu novo livro, o senhor afirma que as empresas não conhecem nem metade da
capacidade de seus funcionários. Por que essa dificuldade em descobrir o
potencial da própria equipe?
Porque as empresas se baseiam no modelo adotado na era industrial. É uma forma
de gestão que controla o tempo todo os profissionais e não permite que a
capacidade e a criatividade aflorem. Para essas organizações, as pessoas entram
como despesa no balanço, e não como investimento. As decisões importantes são
tomadas pelos homens do topo e jamais compartilhadas. Trata-se de uma abordagem
machista que promove culturas de baixa confiança e produtividade. E isso é um
insulto à capacidade de cada indivíduo. Estamos atualmente vivendo a era da
informação, onde as boas empresas começam a enxergar as pessoas como o bem mais
precioso que possuem. São companhias conscientes de que seus funcionários têm
capacidades e talentos que nunca foram utilizados. Elas descobriram, com isso,
que os que executam o trabalho no dia-a-dia conhecem mais sobre ele do que
qualquer grande teórico.
Os funcionários têm parcela de culpa dentro desse modelo que o senhor define
como machista?
Claro, pois eles são co-dependentes. Aceitaram e compraram a idéia de controle e
passividade. Tornaram-se passivos e afastaram deles mesmos qualquer tipo de
responsabilidade. As pessoas podem delegar aos outros a sua carreira, por mais
incrível que isso possa parecer.
O senhor tem dito que, para liberar essa capacidade criativa, as empresas e
as pessoas precisam adotar um novo paradigma, uma espécie de mapa mental. Que
paradigma é esse?
Precisamos mudar o modelo de nossas mentes para nos tornarmos um ser completo.
Estou, na verdade, falando de quatro inteligências básicas: a física, para o
corpo; a emocional, para o coração; a espiritual, para o espírito; e a mental,
para a mente. Todos nós nascemos com esses equipamentos, que são fundamentais
para o sucesso. Estamos prontos para ele. E é aí que o verdadeiro líder deve
atuar, visando liberar esse mapa que está dentro de cada indivíduo.
Há um grande número de empresas que diz encarar seus profissionais como o
ativo mais precioso que possuem. Considerando sua análise inicial, o senhor
diria que a maioria delas está apenas fazendo um discurso politicamente correto?
O que existe é uma grande hipocrisia, pois a maioria das empresas ainda adota
uma postura que é um insulto à inteligência e à capacidade criativa de sua
equipe. As organizações precisam de um novo paradigma, precisam mudar tudo: a
forma como recrutam, selecionam, avaliam, treinam e recuperam seus talentos.
Na sua opinião, as tradicionais avaliações de desempenho não servem para
nada?
É isso mesmo. Não servem para quase nada. A verdadeira avaliação é aquela em que
o profissional faz uma auto-avaliação. Se as pessoas tiverem autoconfiança e
puderem participar da escolha dos papéis que desejam desempenhar dentro da
organização, elas vão se criticar e cobrar mais do que qualquer chefe ousaria
fazê-lo. Elas têm muito mais inteligência e capacidade para doar do que seus
respectivos cargos lhes permitem utilizar. Enquanto as empresas não enxergarem
isso, continuarão seguindo a velha receita de fazer pressão para que a equipe
produza mais por menos.
Não escapa nem mesmo a avaliação 360 graus, na qual o funcionário tem a
oportunidade de se expressar com maior liberdade sobre a empresa e seus líderes?
A avaliação 360 graus funcionaria se existisse um consenso entre as pessoas
sobre os critérios adotados. As informações não devem ser passadas aos
funcionários pelo próprio chefe, pois dessa forma elas chegam deturpadas. Daí a
importância da comunicação transparente dentro da empresa, de alto a baixo na
hierarquia. Aí sim a pessoa teria condições de fazer seu próprio julgamento com
base nessa metodologia, compartilhando o que está aprendendo e o que vai fazer a
respeito daqueles assuntos.
Os profissionais estão realmente capacitados para fazer essa auto-avaliação?
Não só os profissionais, mas todos os trabalhadores dos mais variados níveis das
organizações. Estão todos prontos. Somos mais exigentes conosco do que qualquer
chefe pode ser. É claro que isso só é possível dentro de uma cultura de plena
confiança, caso contrário, nada será autêntico.
Como o funcionário pode mudar essa realidade?
As pessoas podem escolher entre ter ou não força. Aos poucos, elas devem se dar
mais autonomia e tomar iniciativas. Isso não pode ser feito de forma impulsiva,
mas cuidadosamente. Se a pessoa for produtiva, terá necessariamente que ser
ouvida por seu chefe e pelos colegas. Sua opinião passa a ser importante e
relevante para o grupo. Aos poucos, ela pode se tornar um catalisador de
mudanças dentro da companhia.
Muitas empresas são resistentes a esse tipo de ação. Como driblar isso?
As pessoas precisam ser treinadas para se tornar facilitadoras do processo.
Então, elas começam a ensinar e a aplicar essas ações dentro dos seus círculos
de influência. Se ocupam cargos de supervisão por exemplo, podem ajudar a equipe
a ter mais iniciativa e responsabilidade. Em resumo: a empresa precisa ter
indivíduos treinados e capazes de disseminar essa cultura por toda a companhia.
O senhor diria que as empresas que não se preocupam com seus recursos humanos
estão perdendo dinheiro?
Certamente. As empresas mais lucrativas são as que utilizam o talento humano, em
vez de suprimi-lo com controles estúpidos. A abordagem dos filmes de caubói, em
que o mocinho entra na cidade e resolve os problemas, desapareceu. Hoje, o valor
está na equipe, pois ao lado de outras pessoas talentosas nossos pontos altos
são realçados e os fracos desaparecem.
O senhor é um especialista em administração do tempo e tem insistido na tese de
a pessoa buscar seu equilíbrio. O segredo para atingir esse equilíbrio passa
pela correta gestão do tempo?
Eu acredito que o equilíbrio é mais uma questão de liderança de vida do que de
gestão do tempo. A administração do dia, das horas, dos minutos e segundos é
algo complicado e cheio de técnicas. Mas você pode liderar sua vida e ser,
assim, mais equilibrado, integrado e pleno. As pessoas realmente produtivas são
mais felizes. Elas não se esforçam mais que os outros nem trabalham mais que
seus colegas. A diferença é que trabalham de forma inteligente, com bons
paradigmas. São verdadeiros líderes, que dizem constantemente para cada membro
da equipe o seu valor. Eles fazem isso com tanta clareza que os funcionários
acabam enxergando dentro de si o seu potencial. Isso também pode ser feito com
os nossos filhos. Dizer para a criança que ela tem valor e potencial fará com
que cresça enxergando-se como um líder, um catalisador de mudanças.
Por que há uma tendência, então, de enxergarmos mais os nossos pontos fracos?
O modelo industrial coloca as pessoas como uma engrenagem de sua máquina. Isso
torna evidentes as fraquezas dos funcionários. Eles sabem que são demitidos por
causa dos pontos fracos. Há uma inversão. Nós deveríamos contratar profissionais
pelos pontos fortes, ignorando os fracos a ponto de torná-los completamente
irrelevantes. Às vezes, os pontos fracos podem e devem ser trabalhados, mas
temos que focar nos fortes. Se você tem um funcionário que é visionário e nada
prático, não o critique por causa de seu ponto fraco. Não o reprima. Procure
colocá-lo ao lado de alguém que tenha essa característica como ponto forte.
Procure fazê-los trabalhar em equipe, unindo suas forças para terem a visão e a
prática em conjunto.
As universidades estão preparando os jovens para exercer esse tipo de liderança?
Cada vez mais as universidades caminham nesse sentido. Elas estão compreendendo
que o mundo é interdependente. Eu conheço faculdades que trabalham com equipes
de alunos em áreas pobres nos centros das cidades. Eles são desafiados a
trabalhar em grupo para melhorar aquelas regiões. Dessa forma, eles descobrem a
importância do trabalho em grupo, da contribuição, de enxergar potencial em
pessoas que estão sem poder e sem autonomia.
Qual o maior erro que um profissional pode cometer contra a sua carreira?
É a impaciência. Ou seja: querer resultados da noite para o dia, ver os frutos
antes de as raízes estarem nutridas. Essa ansiedade é muito ruim. Quando você é
impaciente e as coisas não acontecem na hora em que quer, você começa a criticar
todos à sua volta. E, ao criticar, ressalta os pontos fracos e impede que as
pessoas liberem todo seu potencial criativo, capacidade e intuição. Por isso,
temos de dar tempo ao tempo.