O Brasil, como você já cansou de ouvir, tem cerca de 160 milhões de
habitantes e quase 160 milhões de técnicos de futebol. Se comandasse a seleção
brasileira, cada cidadão saberia exatamente o que fazer para ganhar todos os
jogos de goleada. O time seria mais coeso, mais agressivo, mais criativo, mais
dinâmico, mais ofensivo, mais defensivo - tudo ao mesmo tempo, é claro. Pois,
quem diria, com essa mania de ser técnico, os brasileiros, sem saber disso,
sempre estiveram à frente de uma das mais modernas técnicas de administração - o
coaching, programa que detecta as principais falhas de um líder e procura
corrigi-las, em benefício da equipe.
Coach, em inglês, significa técnico. Imagine agora se os brasileiros resolvem
aplicar esse talento nato de técnico de futebol no dia-a-dia das empresas. De um
dia para o outro, as equipes ficarão mais unidas, os talentos serão valorizados,
os funcionários ficarão motivados, suando a camisa por melhores resultados. A
sorte é que, ao contrário do penta, essa não é uma esperança frustrada. Graças
ao coaching, muitos executivos estão mudando para melhor seu estilo de gestão.
O coaching, uma tradição nas grandes corporações dos Estados Unidos (país que
tem 275 milhões de técnicos de basquete), chegou ao Brasil no fim da década de
80. É voltado para líderes, de gerentes a presidentes. Geralmente orientado por
consultores, o programa inclui um raio X do executivo, submetendo-o a um
feedback compulsório. Todos os envolvidos - subordinados, superiores, em alguns
casos até clientes - avaliam os aspectos positivos e negativos do estilo
gerencial do executivo em questão. Os subordinados, por exemplo, respondem por
escrito (importante: sem se identificar) a perguntas do tipo "Meu chefe
considera minhas habilidades quando me passa tarefas?" ou "Ele ajuda a obter os
recursos necessários para o meu trabalho?". Na maior parte das vezes, uma boa
série de falhas já surge nessa etapa. "Com essas respostas, mais uma análise da
formação e das habilidades do executivo, mostramos o que precisa ser melhorado e
como fazer isso", diz a headhunter Vicky Bloch, da DBM, empresa que há dez anos
realiza programas de coaching no Brasil.
O vice-presidente de operações da Alcan, João Bosco da Silva, submeteu-se a um
dos primeiros programas de coaching feitos no Brasil, há dez anos, quando a
empresa fez uma profunda reestruturação em seus quadros. Bosco, na época diretor
de recursos humanos, decidiu participar do processo antes dos outros executivos.
A idéia, em resumo, era ser uma espécie de cobaia para ver se funcionava mesmo.
O programa foi executado pela Gutemberg Consultores. Bosco foi testado, aprovou
os métodos e ficou esperando para ver como os outros executivos se sairiam. O
resultado foi surpreendente. "Alguns de nossos profissionais levaram um choque
ao descobrir o quanto estavam desatualizados em relação ao mundo dos negócios e
à forma de liderar suas equipes", diz Bosco.
Em algumas empresas o programa impressionou tanto que foi levado para dentro da
companhia. A Arthur Andersen, por exemplo, criou seu próprio departamento de
coaching, sob a responsabilidade de Howard Johnson, gerente de treinamento da
empresa. Para a Arthur Andersen, o coaching tornou-se um diferencial
competitivo, além de uma fórmula preciosa para motivar e desenvolver pessoas.
"Cerca de 80% das competências de um profissional são desenvolvidas no exercício
de seu trabalho e não no treinamento formal", afirma Johnson. "Por isso, ele
precisa saber tirar o máximo de sua equipe para não perder vantagem
competitiva." Johnson defende, dentre outras coisas, a tese de que os gerentes
devem participar de happy hours com seus subordinados para fortalecer os laços
entre os membros da equipe. "Temos pesquisas que demonstram que um funcionário
recebe cinco críticas para um elogio. Na nossa empresa nos Estados Unidos, que
adotou o coaching há tempos, a proporção é de três elogios para cada crítica",
diz Johnson.
Ninguém gosta de crítica, ainda mais num programa desses, onde elas têm peso
dois ou três. A ABB, Asea Brown Boveri, multinacional do setor de engenharia
elétrica, adotou o treinamento do coaching em 1992. "No começo foi muito
complicado. Alguns dos nossos executivos não estavam preparados para ouvir
críticas ao seu trabalho", diz Nydia Rocha, gerente de desenvolvimento humano e
organizacional corporativo da ABB. "Não se adaptaram à nova realidade e tiveram
de ser desligados da empresa." Hoje, sete anos depois da implantação do
programa, a cultura da empresa está centralizada no coaching. Isso influencia o
comportamento de todo mundo. Cada um dos executivos da ABB sabe hoje como
gerenciar negócios, processos, clientes, pessoas, mudanças, estratégias e a sua
própria carreira. "Esse é o perfil do nosso executivo para o novo milênio",
afirma Nydia Rocha.