'Eu nunca desconfiei do que estava por vir. Pensei que um
dia nós nos sentaríamos para um drinque e encontraríamos um modo de contornar os
problemas.'
James Dimon, sobre sua demissão por seu mentor, Sandy Weill
Comum é, nas empresas, encontrar um elemento que representa o braço direito
do chefe: aquela pessoa que, quando vai ao médico, alguém sempre liga no celular
dela para saber o que fazer. Quando ela se ausenta por alguns minutos da empresa
no horário do expediente (um detalhe importante é que ela costuma ficar além do
horário do expediente sem reclamar, apenas para deixar o serviço em dia) ou
quando ela tira férias, é chamada para vir desempenhar suas funções, pois
ninguém sabe fazer como ela faz. Ou ainda, ninguém sabe fazer o que ela faz.
Outra característica: ela representa o chefe, ou grande rei, principalmente
quando ele não está; recebe apelidos sugestivos, do tipo Carlos II ou Carla, se
for uma mulher, se o chefe se chama Carlos.
O braço direito, não se sabe quando nem como (às vezes se sabe!) recebeu este
status, este título informal e o introjetou na sua performance corporativa de
tal maneira que um bocado de energia acaba sendo gasto para se manter nesta
posição.
Ensinar o que sabe acaba sendo um sofrimento para esta pessoa; detectar colegas
que podem ameaçar sua posição é outro sofrimento. Qualquer pessoa próxima ao
grande rei é um perigo para ela; boicotes, na tentativa de exercer um controle
sobre quem se aproxima do trono, é sua especialidade. A energia que poderia ser
utilizada para produzir e trabalhar é drenada dia a dia.
Mas quem ousa questionar sua produção? Ou qualquer das suas atitudes? Ninguém.
Há um código de ética nos corredores da empresa que impede qualquer comentário
deste tipo.
O braço direito se distrai, preocupado em servir ao grande rei que está sentado
no trono, porque o braço direito trabalha para o rei, não para a empresa; e
erra, erra muito mesmo, mas nunca erra com o rei; para ele, tudo! Para os
outros, nada! O braço direito, na concepção do rei, não erra nunca, ou se erra,
coitado, ele o faz sempre sem perceber; o atrevido que ousar apontar alguma
coisa de negativo sobre o braço direito vai se ferrar, vai perder pontos com o
rei, vai ser chamado de invejoso, maldoso, ingrato ou qualquer coisa deste tipo,
porque o braço direito está definitivamente garantido na empresa para sempre;
suas falhas são todas justificáveis, e sabem por quem?
Ah! Aí é que está o X da questão! Pelo grande rei cotó, que só tem o braço
esquerdo, porque o direito... É este ser a quem ele está simbioticamente preso,
ligado e envolvido emocionalmente pelo cordão umbilical; é aquela pessoa que o
grande rei cotó cegamente elegeu como seu braço direito, instruído, orientado,
formado e diplomado pelo próprio rei.
Acreditem, não existe em nenhuma empresa, um braço direito que se eleja sozinho.
Não, não! Isso só acontece quando alguma autoridade superior lhe concede este
título, e ai de quem discorde disso. É um título honorário!
Segundo a analista transacional Jacques Schiff, simbiose “é o fenômeno que
ocorre quando duas ou mais pessoas se conduzem na vida como se fosse uma só”. É
a metade da laranja, a tampa da panela, ½ + ½ = 1. No relacionamento conjugal
isso até é confundido com o conceito de amor.
Nas relações interpessoais corporativas, o resultado disso é a dependência que
pode parecer confortável numa visão simplista; quando o chefe se sente
representado pelo braço direito, ele dorme tranqüilo, porque tem uma pessoa de
confiança, que cuida da sua empresa impecavelmente, na sua ausência
principalmente. Se o braço direito cuida do caixa, melhor ainda, pois o chefe
fica aliviado com a idéia de que o seu braço direito sabe cuidar do dinheiro da
empresa com muito, muito zelo. E às vezes sabe mesmo! Não é isso que está em
questão. Até porque, se ele assim o faz, está fazendo o que tem que ser feito!
O que está em questão, é o estrago que uma pessoa dessas acaba provocando na
equipe, respaldada pelo grande rei cotó. Este título delegado a um ser imaturo,
arrogante e principalmente ambicioso é um convite ao assédio moral nas suas
facetas mais sutis. E caso o braço direito não tenha estas características, é
grande a probabilidade de ter um dia, mesmo que disfarçadas por uma humildade
teatral. Nunca o grande rei cotó ficará sabendo de nada, e se souber, ele não
vai acreditar. Porque esta face nunca será mostrada para o grande rei cotó.
Conheci um rei que era especialista nisso; ele ministrava MBA sobre este assunto
ou pagava para seu braço direito o MBA. Depois de muito tempo eu soube que este
rei era movido pelo desejo de ter um filho sucessor; e na impossibilidade disso,
ele inconscientemente elegia vários braços direitos dentro da empresa que
ficavam todos disputando quem era o predileto.
Só tem uma chance de salvar o clima da empresa quando isso acontece: é o rei
deixar de ser cotó e enxergar sua empresa como um todo, com seus vários
colaboradores ou sócio-investidores, como eu prefiro chamar a todos que fazem
parte de uma empresa; uma verdadeira equipe, onde o poder é equalizado de tal
forma que todos se sentem importantes e realmente são importantes; todos cuidam
da empresa porque a empresa é de todos.
Isso acontece quando o grande rei se fortalece emocionalmente e muda a fórmula
para 1 + 1 = 2, simbolizando a ausência de dependência e a presença da
interdependência entre todos da equipe. O braço direito perde seu status
patológico quando seu poder é do tamanho que tem que ser, sem maximizações
idealizadoras respaldadas pelo grande rei que corajosa e inteligentemente deixou
de ser cotó.
A equipe, sorrindo, aplaude e agradece!