Carreira / Emprego - Recolocação profissional: Vaga não existia. Emprego ficou só na promessa...
Vaga não existia.
Emprego ficou só na promessa...
É o que dizem os leitores que contrataram e pagaram – entre R$ 300 e R$ 2 mil
– os serviços de empresas de recolocação profissional. No Procon-SP, este ano,
já foram 288 consultas e 99 reclamações
Primeiro, elas oferecem vagas que não existem. Depois, convencem o consumidor a
comprar um serviço que vai ajudá-lo a obter uma recolocação... que nunca
acontece. A promessa de emprego fica realmente só na promessa.
Pelo menos a maioria dos leitores do JT que contratou e pagou os serviços
oferecidos pelas empresas de recolocação profissional – que variam de R$ 300 a
R$ 2 mil – não conseguiu emprego nenhum. Alguns alegam não ter sido nem sequer
chamados para uma entrevista, enquanto outros denunciam não ter recebido o
dinheiro de volta após a rescisão contratual.
No Procon-SP, a principal queixa é sobre serviço não fornecido (64 registros e
28 reclamações), seguida de descumprimento de contrato (59 consultas e 25
reclamações, de um total de 288 consultas e 99 reclamações este ano).
Já no Ministério Público, os indícios são de publicidade enganosa, o que levou
promotora Deborah Pierri, da Promotoria de Defesa do Consumidor, a mover, em
abril, uma ação civil pública contra duas empresas: a Dow Right Recursos Humanos
e a Alphalaser Consultoria em RH, por ofertarem vagas que não existiam e
divulgarem como parceiras empresas que nem sequer ouviram falar das
consultorias.
O pedido de liminar da Promotoria para impedir as empresas de utilizarem de
práticas comerciais desleais foi rejeitado pelo juiz da Vara, mas a Promotoria
recorreu e ingressou com agravo de instrumento, que ainda não foi a julgamento.
Se for acatado, as empresas poderão ser obrigadas a indenizar os clientes por
danos morais e multadas por cada uma das vagas ofertadas, mas não
disponibilizadas aos clientes, quando da assinatura dos contratos.
Abordagem agressiva
Simone Ribeiro é uma das “vítimas” da Dow Right que se queixaram ao JT
(das 26 reclamações recebidas de empresas de recolocação profissional,13 são da
Dow Right).
Em janeiro, ela recebeu um telefonema da consultoria informando que uma grande
empresa estava recrutando um profissional cuja vaga se encaixava perfeitamente
ao seu perfil. “Esperançosa, fui à entrevista, mas, só depois, percebi que não
existia emprego nenhum e o que a Dow Right queria era me vender os serviços de
recolocação, pelos quais acabei pagando R$ 800”, fala.
Segundo Simone, ela passou por uma “verdadeira lavagem cerebral” e foi
convencida a assinar o contrato. “Eles disseram que a vaga já era praticamente
minha e, com o salário que eu ganharia, poderia pagar pelo serviços. Mas nunca
me chamaram para uma entrevista e estou desempregada até hoje”, lamenta.
Otávio Moratori também recebeu ligação da Prisma RH depois de responder anúncio
de emprego publicado em jornal e enviar o seu currículo. “Lá, em vez de emprego,
o que ofereceram foi a assessoria em recolocação, pela qual paguei R$ 300, mas
no dia seguinte me arrependi. Há meses tento reaver o valor, porém, não
consigo”, diz.
À reportagem, Alexandre Ferrari Faganello, advogado da Prisma RH, diz que o
pedido de cancelamento do contrato por Moratori se deu após a execução de parte
do serviço (elaboração de currículo e digitalização) e não no dia seguinte à
assinatura, como ele afirma, razão pela qual a devolução dos valores não pode
ser feita integralmente, como deseja o cliente.
Já Alen Flores Tavares de Oliveira, do Departamento de Qualidade da Dow Right,
informa que a vaga para o perfil de Simone realmente existia e o seu currículo
foi encaminhado à empresa contratante, “que, infelizmente, não se interessou”. E
“o serviço contratado não foi o de recolocação profissional, mas o de divulgação
de seu currículo na internet”, plenamente cumprido, “razão pela qual ela não
recebeu atendimento personalizado”.
SAIBA A QUEM
RECORRER
Ministério
Público
Promotoria de
Justiça do Consumidor
Rua Riachuelo, 115 1o andar - Centro
Tel.: (11) 3119-9069
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Procon
Atende nos
Poupatempos Sé (Praça do Carmo - Centro), Santo Amaro (Rua Amador Bueno,
176/258) e Itaquera (Avenida do Contorno, 60) de segunda a sexta-feira
das 7h às 19h e aos sábados, das 7h às 13h
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Juizado Especial
Cível
Rua Vergueiro,
835
Tel.: (11) 3270-3615 e 3207-5857
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"Tudo não passava de uma
criação intelectual dos consultores"
Nos autos do processo movido pelo Ministério Público (MP) a que o JT teve
acesso há documentos que revelam um esquema escandaloso: num deles, um
ex-funcionário da Alphalaser, cujo nome foi preservado, denunciou ter ele
próprio publicado anúncios de vagas que não existiam em jornais de grande
circulação e capturado em sites de empregos diversos currículos de pessoas
desempregadas para depois abordá-las, concluindo que “tudo o que era oferecido
aos clientes não passava de uma criação intelectual dos consultores”. E afirma
que o procedimento da empresa – de pressionar o consumidor a assinar o contrato
e submetê-lo a testes psicológicos em seguida – é uma armadilha para se cobrar,
depois, a efetiva prestação de serviço, em caso de rescisão.
Contatada pela reportagem, a direção da Alphalaser negou ter veiculado anúncios
enganosos e justificou que todo consultor, ao ser contratado, assina um termo de
responsabilidade se comprometendo a oferecer aos clientes somente o serviço de
consultoria em RH, e não vagas ou entrevistas preexistentes, mesmo que elas
existam. E explica que chega aos clientes por meio de currículos fornecidos
diariamente por empresas que usam seus serviços e sua atuação está totalmente
legalizada e de acordo com o MP, estando à disposição do jornal para
averiguações.
Conforme lembra Fernando Scalzilli, vice-presidente da Associação dos Direitos
do Consumidor (Proconsumer), a promessa proferida verbalmente, por quem quer que
seja, mesmo que não conste do contrato, obriga quem a fizer a cumpri-la.
“Assim, se o consultor de uma empresa de recolocação oferta uma vaga para atrair
um cliente, e essa vaga não existe, tanto ele quanto a empresa, pelo artigo 30
do Código de Defesa do Consumidor (CDC), terão de cumprir o que foi anunciado,
sob pena de responder por crime contra o consumidor”, explica, ressaltando que,
pelo artigo 34 do CDC, o fornecedor é solidariamente responsável pelo atos de
seus prepostos ou representantes autônomos.
Segundo Scalzilli, a promessa de vaga, se não cumprida, caracteriza publicidade
enganosa, o que também fere o artigo 37 do CDC.
“Havendo recusa à oferta, o consumidor tem direito a exigir o cumprimento da
obrigação; a prestação de serviço equivalente ou a rescisão do contrato, com a
devolução dos valores pagos, corrigidos, conforme prevê o artigo 35 da lei
consumerista”, explica.
Para fazer valer os seus direitos, o consumidor pode, segundo Sônia Cristina
Amaro, assistente de Direção da Fundação Procon-SP, buscar ajuda no MP, nos
órgãos de defesa do consumidor ou na Justiça, recorrendo ao Juizado Especial
Cível, valendo destacar que ele não precisa contratar advogado se a causa não
envolver valores superiores a 40 salários mínimos.
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