Finanças pessoais - Neuroeconomia: como o cérebro se comporta nas decisões financeiras
Neuroeconomia. O termo, ainda pouco conhecido, se refere à aproximação dos
estudos da economia com os da psicologia e da neurociência. Esses estudos
utilizam recursos como o mapeamento cerebral para entender o comportamento
humano.
"A economia vem estudando há séculos os sistemas de tomada de decisão. Essa
curiosidade levou a neurociência a se aproximar da economia, para que juntas,
consigam decifrar como funciona o cérebro dos homens na hora de decidir por uma
compra, um investimento, ou em qualquer outra situação relacionada ao trato com
o dinheiro", explica o médico e coordenador do Centro de Estudos dos Processos
de Decisão, Escola de Economia de São Paulo, Fundação Getúlio Vargas, Armando
Freitas da Rocha.
Para Rocha, um dos pontos fundamentais desses estudos é a possibilidade de
perceber que a teoria da racionalidade não consegue explicar sozinha os
processos de tomada de decisão. "Essa teoria não considera a emoção e hoje já
sabemos que a emoção está muito presente quando se toma uma decisão", afirma o
doutor e completa: "afinal, não tem como decidir sem sentir ansiedade, medo,
prazer etc. O já consagrado efeito de resistência às vendas, quando o investidor
deixa de vender suas ações no momento adequado e acaba amargando perdas, tem um
fundo emocional imenso".
Conhecimento x emoção
O coordenador explica que a emoção está presente em todos os processos de
decisão, e que é impossível não se deixar influenciar por ela na hora de fazer
uma escolha. "Os mais estudiosos e bem informados, que entendem de mercado
financeiro, costumam obter resultados melhores com suas escolhas. No entanto,
isso não significa que essas pessoas consigam tomar decisões baseadas apenas na
razão. Ninguém, por mais experiente que seja, consegue eliminar totalmente a
emoção na hora de decidir algo".
O Seminário Neuroeconomia, Decisão e Racionalidade, realizado no mês de junho em
São Paulo, foi um grande avanço para esses estudos. No evento, o pesquisador
alemão Martin Paulus, formado em medicina e professor da Universidade da
Califórnia, em San Diego, explicou como se tomam as decisões econômicas com base
em estudos e dados fornecidos em ressonâncias magnéticas. "E na minha opinião, a
grande importância desses resultados foi a percepção de que a emoção é muito
mais importante na tomada de decisão do que se considerava antigamente",
explica.
Rocha conta, ainda, que até o estado físico do corpo influencia o estado
emocional e a tomada de decisão. "Podemos dizer, por exemplo, que se o seu
sapato estiver um pouco mais apertado, você pode tomar uma decisão diferente da
que tomaria com um sapato confortável. Por isso é importante prestar atenção no
comportamento emocional na tomada de decisão, porque ele influencia muito e você
pode ficar perplexo com sua própria escolha", afirma. "Conhecendo como o cérebro
trabalha, fica mais fácil entender certos comportamentos", completa o
pesquisador.
Estudos recentes
Rocha explica que os estudos ainda são recentes e é difícil prever até onde
poderão ajudar, seja as pessoas individualmente, ou até a economia de um país.
"Tenho certeza que, com o passar do tempo, os estudos vão evoluir e teremos
informações que poderão ajudar muita gente. Por exemplo, o brasileiro não é
poupador por natureza. Conhecendo como ele pensa é possível que o Banco Central
desenvolva políticas globais de incentivo à poupança. Mas, para chegar a esse
ponto, precisamos aprofundar ainda mais os estudos, isso é fato".
E não é só no Brasil que os estudos estão no começo. "Em todo o mundo a
Neuroeconomia ainda está engatinhando, mas é uma área em ebulição e tem muita
gente boa estudando e querendo descobrir novas coisas. Essa semana mesmo tive
contato com um estudo americano sobre a resistência à venda em investimentos,
que mostra que o apego e a não-venda de uma ação está muito relacionada à uma
área do cérebro chamada Ínsula, que é relacionada a emoção. A Ínsula sofre
influência da frequência cardíaca, do nível de glicose, entre outras coisas, e
pode influenciar a não-venda em um período de crise, por exemplo. Então, a cada
dia me deparo com novos estudos que vêm comprovar o que já tinha sido descoberto
antes. Mas é preciso cuidado porque, ao mesmo tempo que há muita gente boa, há
muito picareta".
Estudos em andamento
O pesquisador conta que os estudos são feitos por meio de eletroencefalograma
não invasivo e ressonância magnética. "Os dados apresentados no seminário foram
obtidos por meio de ressonâncias porque são exames muito bons, que dão ótimos
resultados. No entanto, esse exame não pode ser feito em qualquer lugar e
precisamos levar a pessoa que está sendo estudada até um hospital e, tirá-la do
ambiente natural onde as decisões são tomadas, pode gerar certa alteração nos
resultados. Já o eletroencefalograma é ótimo porque é portátil e pode ser
realizado em qualquer lugar, mas tem um inconveniente, ele não é muito preciso
na localização espacial da atividade cerebral. Por isso, no "Estudo
Neuroeconômico do Investidor Brasileiro" serão usados os dois aparelhos, para um
panorama mais completo do cérebro".
Rocha conta que esse estudo, que está em andamento, tem duas linhas: "nós
primeiros estudaremos a tomada de decisão em uma experiência de compras.
Queremos ver como o cérebro se comporta em uma compra que gere prazer, ou seja,
quando a pessoa adquire algo que ela quer muito, ou para presentear alguém
próximo a ela, e também avaliaremos uma compra aversiva, que são compras que a
pessoa não gostaria de fazer, mas precisa, como inseticida. E depois
confrontaremos esses resultados com os obtidos na avaliação de tomada de decisão
de investidores tradicionais, afinal, compra e investimento caminham juntos",
finaliza.
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