Especialistas indicam investimento nesses fundos apenas para quem terá de
realizar pagamentos em moeda estrangeira no futuro
Investir em fundos cambiais protege o poder de compra em moeda estrangeiraNem
todos os fundos de investimento têm como objetivo principal a multiplicação do
patrimônio. Muitas vezes o investidor pode simplesmente procurar um fundo para
se resguardar de possíveis variações de mercado que lhe possam ser
desvantajosas. É o que se chama de proteção ou hedge. Um dos principais
exemplos desse tipo de fundo é o cambial, que acompanha não um indicador de
mercado, mas a flutuação de uma moeda estrangeira.
"É um fundo para quem quer proteger o dinheiro contra a oscilação cambial",
define Renato Ramos, diretor de renda fixa do HSBC. Ou seja, destinam-se,
basicamente, a pessoas ou empresas que tenham dívidas em moeda estrangeira - ou
qualquer outro tipo de obrigação de longo prazo no exterior - ou a quem tem
planos futuros em outros países. Por exemplo, empresas importadoras, pessoas que
mandam dinheiro para a família no exterior, estudantes ou profissionais que
pretendem fazer um curso em outro país. "Como é um fundo para hedge, se
for usado como tal, o risco não é alto", diz Ramos.
É importante ficar atento a esse perfil específico de investidor. Isso
porque, em um cenário de desvalorização ou grande oscilação da moeda que o
referencia, esse fundo não é vantajoso para quem quer ter rentabilidade. Apenas
investidores qualificados, com grande conhecimento do mercado, conseguem,
eventualmente, ter bons rendimentos com apostas na oscilação de moedas, uma
operação bastante arriscada. "O investidor não pode esquecer que pôs o dinheiro
nesse fundo para protegê-lo, e não para multiplicá-lo", diz Rafael Paschoarelli
Veiga, professor de finanças da USP e criador do site ComDinheiro.com.
O professor exemplifica: se um investidor aplica 170.000 reais num fundo
cambial referenciado em dólar com a moeda americana a 1,70 real, terá o
equivalente a 100.000 dólares em quotas. Se o dólar cai a 1 real, os 100.000
dólares permanecem, mas em reais o investidor terá registrado uma perda de
70.000. "É por isso que o fundo cambial só é indicado a quem quer preservar seu
poder de compra em dólar", explica Veiga.
Veiga também recomenda esses fundos quando as obrigações em moeda estrangeira
não são muito vultosas, ou abaixo de 1 milhão de reais. Nesses casos, funcionam
como uma maneira de guardar dinheiro sem estar à mercê da variação cambial. Para
obrigações milionárias, no entanto, o professor indica, em vez de fundos, a
aplicação direta em derivativos. "Nos fundos, o investidor precisa, de fato, pôr
dinheiro. Em derivativos, não. Coloca-se caixa apenas no acerto final (na data
do vencimento)", explica o especialista.
Mas, em relação aos fundos referenciados na moeda americana, o
superintendente de produtos da Bradesco Asset Management, Ricardo Mizukawa, faz
uma ressalva: "Antigamente, fundos referenciados em dólar eram considerados uma
boa proteção contra a desvalorização do real, por causa do cenário
hiperinflacionário do Brasil. Mas com a forte desvalorização do dólar ao longo
do tempo, esses fundos perderam muito apelo."
Funcionamento
Os fundos cambiais não investem em moeda estrangeira diretamente, mas em
títulos emitidos em moeda estrangeira por bancos e empresas. "A composição da
carteira é vinculada à moeda por meio de operações com derivativos (baseadas na
negociação do preço do ativo em uma data futura, para comprar mais barato ou
vender mais caro). Não existem mais papéis remunerados em dólar, como anos
atrás", explica Mizukawa.
De modo geral, investir nesse fundo protege o cotista de uma possível alta em
uma moeda da qual ele vai precisar por um longo período de tempo, ou mesmo da
qual ele necessita constantemente. Assim, no caso de valorização da moeda
americana, alguém que tenha planos de fazer um mestrado nos Estados Unidos daqui
a três anos gastará menos se investir hoje do que se resolver trocar seus reais
por dólares no futuro.
Esses fundos mantêm, no mínimo, 80% de seu patrimônio em ativos atrelados à
variação de preços da moeda estrangeira que os referencia. A taxa que quantifica
o rendimento em moeda estrangeira chama-se cupom cambial. As referências mais
comuns são dólar e euro, esta última mais disseminada entre investidores pessoas
jurídicas. Existem, no entanto, fundos ligados a cestas de moedas, podendo
também incluir outras moedas de alta liquidez, ou seja, que podem ser rápida e
facilmente convertidas em real, como a libra e o iene.
No entanto, não se deve pensar que esses fundos seguem exatamente a cotação
da moeda. O Imposto de Renda (IR) e a taxa de administração reduzem o
rendimento. Resgates de aplicações em menos de 30 dias também sofrem cobrança de
Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) com alíquota inversamente proporcional
ao número de dias de aplicação.
A cobrança do IR segue a regra dos fundos de investimento de longo prazo:
tabela regressiva com alíquotas variando de 22,5% a 15% em quatro faixas de
cobrança (aplicações até 180 dias, 22,5%; de 181 a 360 dias, 20%; de 361 a 720
dias, 17,5%; e acima de 720 dias, 15%). Não pode haver cobrança de taxa de
performance. Já as taxas de administração oscilam entre 1% e 3% ao ano. "Como a
gestão é um pouco mais complexa, mas os patrimônios são geralmente baixos - em
torno de 10 ou 20 milhões de reais - as taxas são mais altas. A procura por esse
tipo de fundo também é pequena'', diz Ricardo Mizukawa.
Por exemplo, se um investidor aplicar 1.000 reais em um fundo cambial, com o
dólar a 2 reais, e, em dois anos, o dólar chegar a 3 reais, ele não receberá
1.500 reais se resgatar seu dinheiro. Supondo que a taxa de administração seja
de 2% ao ano, e considerando-se que a alíquota de IR que incidirá será a de 15%,
esses 500 reais de rendimento se tornam, com os descontos, 416,50 reais.
Portanto, o investidor resgata 1416,50 reais.
Assim, para realizar uma viagem ao exterior dentro de três meses, por
exemplo, é melhor comprar a moeda em espécie e não arcar com essas taxas.
Aplicar em fundos cambiais só é aconselhável para quem se encaixa perfeitamente
no perfil recomendado pelos especialistas. Moedas não são boas opções para quem
quer boa rentabilidade, havendo, para isso, outras opções de diversificação,
tanto na renda fixa quanto na renda variável.