Investir pressupõe ter dinheiro sobrando. Sejamos sinceros: por aqui, o
raciocínio relacionado ao ato de fazer sobrar dinheiro não favorece a cultura do
investimento. A autodefesa contra o sistema traz à tona a figura do "se". Ora,
se está sobrando, por que não consumir um pouco mais? Por que não dar entrada
naquela tão sonhada TV LCD? Por que não comprar uma e outra peça de roupa e
valorizar a aparência? Se sobra, então é porque eu posso mais.
Equilíbrio... Mas, e se?
A palavra resume bem o que é necessário para que um simples cidadão possa se
transformar em um poupador e, então, em um investidor. Ironica e felizmente,
equilíbrio também diz respeito ao "se" (frequente em quase todas as nossas
decisões). Se eu deixar de comprar a TV agora, posso guardar o dinheiro para
comprá-la com desconto depois do Mundial. Se eu evitar tantas baladas, talvez
tenha dinheiro para a viagem de navio que tanto gostaria de fazer. O que muda?
Se não somos bons com o "se" que nos faz consumir, também não somos com o
"se" que deveria nos levar à reflexão. Logo, o equilíbrio - que pressupõe
disciplina - não é a chave. Ajuda, mas não resolve. A diferença mesmo quem faz é
o comprometimento e o amor. Comprometimento com a melhora, com a possibilidade
de crescer, agregar valor e construir patrimônio. Amor próprio, que reflete-se na autoestima e na capacidade
de, ai sim, tomar partido e avaliar com mais inteligência as
alternativas disponíveis.
Iniciada minha contribuição, listo abaixo dez princípios e atitudes que
considero especiais em investidores inteligentes e que sabem fazer seu dinheiro
realmente trabalhar:
1. Não considera títulos de capitalização como investimento.
Pagar caro para que uma simples poupança seja acumulada e, ainda assim,
apresente retorno menor que o da caderneta de poupança não faz parte do dia a
dia de investidores conscientes. Para entender melhor este tipo de produto, leia
o artigo "A verdadeira face dos títulos de capitalização".
2. Não transfere a responsabilidade de gerenciar suas finanças para
outra pessoa ou instituição. As melhores alternativas de investimento
são aquelas que ele compreende e é capaz de associar às suas metas pessoais,
profissionais e familiares. Ponto. As indicações (do amigo, do gerente etc.) são
analisadas com o devido respeito e atenção, mas a decisão é sempre consciente e
parte de um processo. O mesmo acontece com o dinheiro do cotidiano.
3. Mantém um orçamento atualizado e que contempla gastos, receitas e
investimentos. Controla, mede e avalia para que possa usar as
ferramentas financeiras como fator de libertação e independência. Sabe se está
exagerando e quando pode exagerar. Conhece seus limites e os respeita.
4. É coerente com a realidade familiar. Vive o padrão de vida
possível, com plena consciência de que evoluir significa ter, antes de mais
nada, um meio de vida sustentável e compatível. Não guarda por guardar, mas
porque quer garantir possibilidade de consumo e qualidade de vida hoje e sempre.
O futuro não é apenas romântico, mas parte de sua programação financeira. Sugiro
a leitura do artigo
"A complexa e delicada questão do padrão de vida".5. Assume
o papel de cidadão e negocia com firmeza. Ao entrar em uma loja, sabe
que o interesse deve ser muito maior por parte do vendedor. Assim, prefere não
demonstrar euforia e emoção e avalia os produtos/preços de forma racional, fria.
Planeja a compra com antecedência, exige desconto e prefere pagar à vista. Leia
também "Negociação = Planejamento, disposição e informação".
6. Tem objetivos claros que faz questão de respeitar. Dica
recorrente, presente em todo trabalho de bons planejadores financeiros, definir
objetivos significativos faz com que o investidor exercite a automotivação.
Quando o que ele quer tem valor, é relevante para si, ele é capaz de deixar
outros pequenos desejos, supérfluos ou não, na fila de espera. Mais sobre o tema
no artigo "O grande segredo de ter metas financeiras".
7. Valoriza a qualidade de vida. Vive de acordo com suas
possibilidades, mas com momentos de lazer, tempo para a família, hobbies e
prática de esportes. E faz questão de destinar parte de seus recursos para o
cultivo da qualidade de vida, consciente de que inesquecíveis são os momentos,
as pessoas e os acontecimentos, e não um produto ou bem material. A polêmica
completa você encontra no texto "Há relação entre riqueza e qualidade de vida?".
8. Faz uso da matemática financeira básica para tomar decisões.
Primeiro, sabe que não existe o tal "juro zero". Segundo, sabe usar simuladores
simples para avaliar uma compra financiada, parcelada e a contra-partida da
compra à vista com o apoio do tempo. O que é melhor? Gosto muito do exemplo
usado pelo amigo e autor best seller Gustavo Cerbasi
em relação à compra da casa própria quando ainda somos jovens:
Os jovens que compram seu imóvel quando ainda ganham pouco acabam por
comprometer excessivamente o orçamento familiar com uma prestação maior do
que pagariam pelo aluguel de um apartamento mais simples e adequado para o
momento. Falta dinheiro para seu lazer, para seus planos de curto e médio
prazo. (...) Com um orçamento apertado por uma pesada prestação, qualquer
imprevisto leva o jovem a contrair pequenas dívidas - A vantagem da compra
própria, por Gustavo Cerbasi em 07/06/2010 - Folha de S. Paulo.
9. Comemora pequenas vitórias e aprende com seus erros. A
vida não é só sombra e água fresca, mas tem seus momentos de grande alegria. Os
desafios trazem consigo o sentimento de realização e também experiências
frustrantes. O investidor de sucesso aceita essa realidade e convive com ela de
forma cordial, com humildade e muita vontade de aprender. Aprende porque quer,
não porque precisa.
10. Diversifica, investindo em produtos conservadores e alternativas
mais agressivas. Como define bem seus objetivos de curto, médio e longo
prazo, aloca seu capital em investimentos de características próprias, sempre
alinhando-os com seu horizonte de tempo e interesse. Assim, mantém uma boa
reserva de emergência, deixa a maior parte de seu dinheiro em produtos
conservadores, mas também participa do mercado de ações (fundos, home broker
etc.).
Todos podemos ser investidores inteligentes
Porque se for importante para você, você é capaz de fazer. Se for valer a pena,
você segue adiante. Se realmente representar uma possibilidade de novos rumos na
profissão, você arrisca. Porque se for por você e por aqueles que ama de
verdade, você é capaz de aprender e fazer diferente. Engraçado, o "se" apareceu
novamente. Pois é, o investidor inteligente tem no "se" seu maior trunfo:
as respostas são consequência e o que realmente importa são as perguntas.
Causa e efeito. Afinal, se dependesse de mim, você seria rico, feliz e cercado
de boas decisões. Se...