No Orkut, o site de relacionamentos mais conhecido da internet, há mais de
mil comunidades que reúnem pessoas dispostas a soltar o verbo contra alguém que
não podem criticar pela frente: o chefe. Os nomes dos grupos dão uma idéia de
como anda a imagem dele por aí.
'Ele pensa que é Deus', 'Meu chefe é o mestre dos magos' e 'Odeio o imbecil do
meu chefe' são alguns deles este último com uma evocativa ilustração do Sr.
Burns, o patrão de Homer Simpson no desenho animado da Fox. Os fóruns estão
repletos de depoimentos de pessoas que perdem os cabelos, desenvolvem gastrite e
até deixam o emprego por ter trombado de frente com o superior. Se você nunca
viveu algo assim, certamente conhece alguém que passou por situação parecida.
Estudo da Hay Group, consultoria de recursos humanos, mostra que em 70% dos
casos os conflitos hierárquicos são a razão do clima ruim na organização. E são
também a causa de 28% dos piores resultados financeiros da empresa.
A pergunta é: será que há motivo para tanto? A relação do chefe com sua
equipe tem de ser assim tão desgastante? Sete especialistas consultados por VOCÊ
S/A dizem que não. E mais: afirmam que, em muitos casos, é possível entender o
comportamento do chefe e aprender a lidar com ele de forma a evitar confusão.
'Muitos dos problemas que ocorrem entre chefe e subordinado estão no julgamento
errado que um faz do outro', diz Elaine Saad, diretora da Right Management,
consultoria de recolocação e orientação de carreira, em São Paulo. Conhecer o
temperamento do chefe não fará com que ele deixe de ser um mala, mas pode ajudar
você a melhorar a relação com ele e, dependendo do caso, salvar seu emprego.
Para ajudá-lo nesta empreitada, elaboramos uma espécie de manual de
sobrevivência sobre como agir com 10 tipos de chefes-mala aqueles que
desenvolveram a incrível capacidade de espalhar azedume a seu redor e de tirar
qualquer um do sério. Confira.
QUAL É O SEU CHEFE?
1 - PREGUIÇOSO
Como ele é?
Repassa a tarefa como se estivesse delegando, como se não quisesse parecer
centralizador. Mas, quanto mais ele pode abusar de você, mais o moço se
aproveita.
Como lidar com ele?
'Nas empresa mais modernas, está cada vez mais difícil o preguiçoso continuar
nessa boa vida', diz Gladys Zrncevich, da A2Z Consultores, em São Paulo.
Avaliações de desempenho identificam esse profissional e forçam o mala a mudar
de atitude. Se não é o caso da sua empresa, converse com seus pares para
verificar se outras pessoas sabem o que está acontecendo. E tente argumentar com
o chefe, sem personalizar a discussão. Diga que a qualidade do seu trabalho não
está seguindo o padrão que você gostaria de entregar, porque você está assumindo
muitas tarefas.
2 - PARANÓICO
Como ele é?
Pensa que todos conspiram contra ele. E age para confirmar a perseguição que
imagina. No fundo, se considera onipotente. Na verdade, vive entre o sentimento
de se achar o melhor e o autodesprezo total. É cria de um chefe que o sabotava
no início da carreira.
Como lidar com ele?
Observar o que causa tanto medo e insegurança nesse chefe é primordial. 'A
partir daí, relacione-se com ele deixando claro que não precisa ter temores
quanto a você. Que você está ali para ajudar. Mas cuidado: não exagere fazendo o
papel de psicólogo, senão ele irá sobrecarregá-lo', aconselha o professor
Ricardo Carvalho, da Fundação Dom Cabral, em Belo Horizonte.
3 - INCOMPETENTE
Como ele é?
É unânime: todos sabem que ele não dispõe de recursos técnicos e emocionais para
ocupar o cargo que tem. Compromete o resultado da equipe e tem dificuldade em
reconhecer o talento do time, emperrando a carreira dos profissionais. Não é
claro e geralmente é agressivo.
Como lidar com ele?
'Não há como ensinar esse tipo de pessoa, nem da maneira mais delicada', diz
Elaine Saad, da Right Management. 'É um tipo difícil, pois qualquer tentativa de
conversa ou conciliação é encarada por ele como agressão. E o troco será uma
ação de defesa contra você.' A saída é guardar provas de tudo o que você faz,
para que a incompetência dele não o afete. E ter paciência até conseguir uma
transferência ou mudança de emprego.
4 - CENTRALIZADOR
Como ele é?
Na maioria das vezes, teve um chefe tão centralizador quanto ele, quando era
subordinado. Não consegue delegar tarefas e quando o faz não sai de perto. Fica
estressado facilmente, se sobrecarrega e não permite que a equipe se desenvolva.
Muitas companhias tentam a estratégia do coaching para melhorar a situação.
Como lidar com ele?
'Ele é inseguro e acha que ninguém pode fazer as tarefas tão bem quanto ele',
diz Mariá Giuliese, diretora executiva da consultoria de carreira Lens &
Minarelli, em São Paulo. Por isso, o segredo é tentar ser uma espécie de gestor
do seu chefe. 'Tente ajudá-lo, descobrindo o que provoca tanta insegurança.
Procure suprir essa falha, mas de uma maneira amiga, para não parecer que você
quer puxar o tapete dele.'
5 - CAXIAS
Como ele é?
Fiscaliza o horário em que você chega e sai, o tempo que demorou no almoço,
quanto usa o telefone. Não importa se você entrega, é preciso seguir certas
regras. Geralmente fica no cargo porque dá resultado para a companhia.
Como lidar com ele?
A melhor maneira de resolver um conflito com ele é entrar na dança do relógio:
procure seguir o ritmo do superior, não atrase, entregue os trabalhos nos
prazos. Ou então mostre o incômodo que isso gera para você. Diga que você
concorda com os horários e regras dele, mas que isso tem afetado sua vida.
Discuta o sentimento e não a regra. Diga, por exemplo, que a pressão para chegar
no horário tem aumentado sua ansiedade e atrapalhado seu rendimento.
6 - ANTIÉTICO
Como ele é?
Tem um agenda oculta. Tem suas próprias regras, que ninguém sabe ao certo quais
são. Nunca se sabe o que ele está tramando. Nunca age sozinho. Sempre tem
ligações dentro da própria organização e em outras também.
Como lidar com ele?
'É o tipo mais perigoso entre todos os chefes', afirma Gladys Zrncevich, da A2Z
Consultores. É importante sempre se precaver, guardar documentos, provas e
álibis. 'Se ele age sem ética, é porque tem o aval de superiores dentro da
empresa', afirma a consultora. Não o enfrente e procure ter a relação mais
formal e distante possível. O melhor, por mais duro que seja, é começar (logo!)
7 - ESTRELA
Como ele é?
É uma espécie de Donald Trump, que não suporta o sucesso do subordinado. Em seu
programa, O Aprendiz, ele teria demitido a profissional que era seu braço
direito porque, dizem, 'ela estava brilhando demais'. Esse tipo geralmente foi
um jovem prodígio no início da carreira, com um superior relapso, que não
impunha limites nem normas.
Como lidar com ele?
Os subordinados desenvolvem a propriedade de se tornar 'invisíveis', como
defesa. 'Evitam interação com o chefe e executam as tarefas o mais rápido
possível, para se ver livre do superior. Não questionam e perdem sua
individualidade', diz Márcio Augusto Martins, da Allieh Coaching e Gestão
Empresarial, em São Paulo. Ou você entra nesse jogo ou vai atrás de outro
emprego.
8 - DESLIGADO
Como ele é?
Não sabe quanto você ganha, há quanto tempo está na empresa e qual é exatamente
sua função. Por isso mesmo, não dá feedback. Na verdade, esse chefe sofre com
ele mesmo, porque esquece compromissos, deixa a carteira em casa e leva o
controle remoto para o trabalho em vez do celular.
Como lidar com ele?
'Os distraídos não agem assim por maldade', afirma Elaine Saad, da Right. O
subordinado não pode se irritar, nem esperar que ele tome iniciativas. 'Se ele
não lembra de algo que prometeu, conte a história novamente. Diga que no dia
tal, que ele fez uma certa coisa, ele disse que iria te dar uma certa
bonificação. O diálogo -- paciente -- com esse tipo de chefe é o melhor
caminho.'
9 - ESCORREGADIO
Como ele é?
Nunca admite que erra, nunca assume responsabilidade e sempre põe a culpa em
outras pessoas. É inseguro e também antiético.
Como lidar com ele?
'Esse tipo de chefe tem a maior dificuldade para dizer 'eu errei'. É mais fácil
pôr a culpa em outro', afirma Elaine, da Right. Segundo ela, avaliações de
performance têm identificado esse profissional nas empresas, que procuram se
livrar dele. 'Mas, se ele é o dono ou o presidente, dificilmente o panorama vai
mudar.' Nesse caso, monte um plano para buscar outra coisa e defina uma data
para sair da organização. Enquanto tiver de suportar o mala, procure combinar
tudo por e-mail, guardando provas para que você possa se defender quando ele
empurrar os erros dele pra cima de você.
10 - HARDY
Como ele é?
Lembra do desenho Lippy e Hardy? Hardy vivia se lamentando: 'Ó dor, ó vida, ó
céus, ó azar. Isso não vai dar certo'. Tem chefe que é assim: reclamão e avesso
a novidades.
Como lidar com ele?
'Normalmente, o Hardy é chapa do presidente, por isso tome cuidado', diz Grace
Pedreira, diretora da Grace & Co. Executive Search, em São Paulo. Mais uma vez,
o dilema é: ou você se conforma com isso ou pula fora. Há casos, no entanto, em
que há sinais de mudança na empresa. 'Aí o chefe Hardy fica muito inseguro e se
agarra ainda mais aos modelos antigos, com medo de ser tirado de sua zona de
conforto.' Neste caso, descubra quem são os pontos de poder dentro da
organização e o que pensam desse comportamento. Se houver espaço para uma
conversa, vá em frente.
É preciso ter jogo de cintura
'Certa vez recebi uma proposta para trocar o cargo de gerente em uma
multinacional pelo de diretor em outra. Durante a entrevista, a superiora disse
que gostaria de ter alguém com autonomia para tomar decisões. Com o passar do
tempo, no entanto, ela mostrou-se insegura com relação à autonomia que tinha me
dado. Reclamei, entramos em conflito e preferi sair da companhia. Fui para outra
multinacional, também como diretor, mas dessa vez com mais jogo de cintura.
Aprendi como argumentar sem bater de frente. Um bom exemplo foi minha postura
durante uma campanha de vendas. Meu chefe queria gastar metade do que o
necessário. Com calma, respondi que faria o trabalho com a verba que ele queria,
mas que não acreditava que poderia conseguir os resultados esperados com um
orçamento tão baixo. Assim, sem contestar a ordem dele, mas sem abaixar a
cabeça, consegui convencê-lo a usar uma verba maior. O resultado? Vendemos pra
caramba e ele me agradeceu.'
Nada como uma boa conversa
'Estou há 12 anos no banco e hoje lidero uma equipe de 1 200 pessoas. Nos meus
dois primeiros anos aqui, tive um chefe muito formal. Quando tínhamos uma
sugestão, ele não gostava que falássemos direto com ele. Queria que o assunto
fosse passado a outras pessoas, que o informariam. Mas isso nem sempre
funcionava e a mensagem não chegava até ele. Com jeito, passei a conversar com
ele, dizendo que havia sugerido para Fulano de Tal uma redução de custo ou uma
mudança de processo. E logo perguntava: 'O que o senhor acha?'. Essa atitude de
compartilhar mais do que de reclamar despersonalizava a questão e sempre
funcionava. Mais tarde, tive outro gestor que era totalmente diferente. Ele
gostava que falássemos direto com ele. Ou seja, cada chefe tem sua linguagem. A
gente precisa saber se comunicar com ele. Sem comunicação não há transparência.
E sem transparência o trabalho atravanca.'