Aos 26 anos, o consultor Cezar Zarza, ocupava pela primeira vez um cargo de
chefia. A experiência que se mostrava desafiadora - ele estava assumindo a
gerência de suporte técnico em uma multinacional, no entanto, logo se
transformaria em uma prova de fogo. Com uma equipe que tinha, em média, 35 anos,
o novo executivo sentiu na pele o preconceito por ser um chefe jovem. As pessoas
o olhavam de maneira diferente e em muitas situações chegavam a escantea-lo. E
pior. "Eu era testado o tempo todo por ser novo e já estar em uma posição de
liderança", lembra Zarza.
Ele não esquece o dia em que enfrentou uma grande saia justa no meio de uma
reunião com um cliente. Seus colegas de trabalho lhe pediram para fazer uma
pequena apresentação, sem que o tivessem avisado com antecedência. "Não havia me
preparado, mas minha sorte é que tinha o domínio do assunto", conta. Situações
como essas, aliás, acabaram se tornando freqüentes em sua rotina. "Sempre me
colocavam na berlinda como uma forma de testar minha competência ou capacidade
profissional na hora de tomar decisões".
Mas sua experiência não é a única. Isso porque cada vez mais jovens conquistam
postos de comando nas organizações. Fenômeno que vem provocando muitos impactos
nas relações entre chefes e subordinados. Pesquisa realizada com exclusividade
para o Valor , pela consultoria Lens & Minarelli, envolvendo 250 executivos,
mostra que mais da metade (51%) tem ou já teve um chefe mais jovem. E desse
total, 63,9% revelou ter enfrentado algum tipo de dificuldade de relacionamento.
Entre as características negativas dos chefes mais jovens destacadas pelos
entrevistados estão a imaturidade, com 60% das respostas, e a falta de
experiência, 55,6%. "A imaturidade, por exemplo, é associada a comportamentos
como arrogância, autoritarismo, insegurança, impulsividade, ansiedade,
imediatismo, impaciência e competitividade exacerbada", afirma Mariá Giuliese,
diretora da Lens & Minarelli. Enquanto a inexperiência, afirma, se traduz na
falta de conhecimento da realidade organizacional, de um relacionamento mais
político e da percepção dos jogos de poder.
"O chefe jovem não costuma questionar as ordens que recebe. Ele simplesmente as
obedece sem avaliar se terá um impacto negativo ou não", dispara Zarza, hoje com
43 anos e que recentemente viu o outro lado da moeda. Se deparou com um chefe 11
anos mais novo, contratado para ocupar uma posição acima da sua na empresa em
que trabalhava. Embora ele enxergue os pontos positivos na gestão de um chefe
jovem, como a energia, disposição e visão diferenciada - além de terem menos
vícios, como costuma dizer, o consultor critica a postura que a maioria adota
para se manter no cargo. "Eles fazem qualquer coisa a qualquer preço", diz.
"Mesmo que para isso seja preciso sacrificar a equipe".
Ser comandado por um profissional mais jovem não só incomoda executivos
experientes, como também causa uma enorme frustração para eles. Do total de
entrevistados, 35,7% disseram se sentir indignados por não terem chegado lá.
Segundo Mariá, é comum ouvir frases como: "Por que não estou no lugar dele?" ou
"Ele poderia ser meu filho". Indignação à parte, o fato é que não há muito o que
fazer. "Nos últimos quatro anos, observamos que as reestruturações feitas pelas
empresas provocaram a 'juniorização' dos cargos", analisa Mariá. "Os altos
executivos passam menos tempo no cargo e são substituídos com freqüência por
profissionais mais jovens, menos experientes, mas com uma boa formação acadêmica
e mais conectados com o mundo global".
Renata Willens Longo, 27 anos, é o retrato dessa nova realidade. Ingressou na
Ultragaz há cerca de oito anos como estagiária do departamento jurídico. Em
2003, foi promovida a coordenadora da área cível e há quatro meses passou a
comandar o mercado Centro-Sul da companhia. Fez carreira na empresa e tudo que
aprendeu se deve à experiência adquirida no grupo. Graduada na Faculdade de
Direito da USP, uma das mais tradicionais do país, Renata já conta no currículo
com uma especialização em direito na Pontifícia Católica de São Paulo e planeja
este ano cursar um MBA na Fundação Getulio Vargas.
Sua rápida ascensão, no entanto, teve um preço. Enfrentou resistência em vários
momentos por ser jovem e mulher - até bem pouco tempo atrás era a única
profissional do sexo feminino no departamento. Não raro questionavam: "Você é
tão nova e já ocupa essa função?", lembra. Ou então diziam: "Vamos ouvir outros
advogados além dela para ver se a decisão tomada é a mais correta". A sensação
de desconforto não acontecia apenas internamente. Renata também era alvo de
algumas provações no mercado. "Na minha profissão se valoriza advogados mais
velhos e experientes, acima dos 50 anos", ressalta Renata.
Aos poucos, ela foi ganhando maturidade e aprendendo a passar segurança em seus
contatos diários, seja com os funcionários da empresa ou clientes. Superados os
conflitos, ao mostrar sua competência e talento acabou conseguindo ocupar a
mesma posição de seu superior na época em que era estagiária e agora eles
dividem responsabilidades. Ela acredita que a figura do chefe jovem é
controversa para os mais velhos em razão de algumas habilidades, como a pressa
em obter respostas e resolver questões.
"São características que comumente são confundidas com uma postura de
arrogância", observa. "Mas essa imagem não me atrapalha. Sou assertiva e
objetiva, o que contribuiu para que meu trabalho funcione e dê o resultado
desejado", afirma. Para ela, o grande diferencial do jovem hoje é que ele chega
no mercado de trabalho mais preparado. Além de começar mais cedo, ressalta
Renata. "Quem está no início da carreira tem mais garra para atingir as metas
agressivas que as companhias impõem", diz.
Assim como ela, não é raro profissionais mais jovens entrarem em conflito ao
questionar a postura dos mais velhos. E a maior queixa refere-se à resistência
que muitos têm em abandonar hábitos antigos, como a falta de alinhamento com as
novas estratégias e de interesse para atuarem em um mundo globalizado. Aspectos
que vêm sendo amplamente combatidos pelas organizações, que buscam um perfil de
líderes multifuncionais, agressivos, ágeis, visionários, com foco em processos e
resultados. "Características mais ligadas a profissionais em início de
carreira", ressalta Mariá.
Curiosamente, a pesquisa revela que 61,9% dos entrevistados, se pudessem
escolher, dariam preferência a chefes mais velhos. Entre as razões destacadas
estão aspectos como experiência, maturidade, flexibilidade, melhor compreensão
da realidade organizacional, segurança no trato com conflitos e empatia com os
funcionários. "Na verdade, o que as pessoas esperam dos mais velhos é sabedoria
para lidar com os problemas e com as pessoas, por acreditarem que os mais jovens
cometem erros já conhecidos e vivenciados por eles", explica Mariá. "Não é à toa
que há uma sensação de que algo está errado quando a relação de idades está
invertida".
Mas na visão da diretora da Lens & Minarelli, fica claro que esta inversão é
inevitável, sendo preciso preparar o jovem para exercer a chefia e comandar o
mais velho. E para o profissional experiente, resta aceitar e saber aproveitar
esse movimento crescente de profissionais jovens ocupando cada vez mais postos
de comando. "Há pontos positivos de uma liderança jovem que se combinados com a
sabedoria de executivos tarimbados resultarão em um modelo de gestão
equilibrado", afirma.