Negócios e família – uma mistura que, às vezes, pode ser considerada sinônimo
de harmonia ou de conflitos, vem sendo apontada como um dos pilares da economia
dos países que adotam o sistema Capitalista, inclusive o Brasil - onde 99% das
empresas não-estatais possuem origem familiar. De acordo com a revista Fortune,
40% das quinhentas maiores empresas listadas por este veículo são de propriedade
de famílias ou por elas controladas.
Outro forte exemplo vem dos Estados Unidos, uma vez que as organizações
familiares geram metade do Produto Nacional Bruto (PNB) e empregam metade da
força de trabalho. No Continente Europeu, essas companhias dominam o segmento
das pequenas e médias, e em alguns países, chegam a compor a maioria das grandes
empresas. Na Ásia, a forma de controle familiar varia de acordo com as nações e
culturas, mas as organizações familiares ocupam posições dominantes em todas as
economias mais desenvolvidas, com exceção da China. Na América Latina, grupos
construídos e controlados por famílias constituem a principal forma de
propriedade privada na maioria dos setores industriais. No entanto, este tipo de
corporação preocupa alguns administradores, uma vez que a informalidade do
ambiente familiar pode ser transferida para a organização, chegando a
comprometer na tomada das decisões que interferem diretamente no futuro do
próprio negócio. Nesse caso, pode ocorrer que as normas organizacionais não
sejam bem definidas. Uma das saídas, apontam alguns profissionais, seria
investir na capacitação gerencial e no desenvolvimento das equipes.
Outro aspecto que chama a atenção e provoca alguma cautela, refere-se ao fato
de que numa empresa familiar, os proprietários podem influenciar a cultura
organizacional, centralizando as decisões em excesso e até de maneira
autoritária. Nessa situação, a opinião e o desejo individual podem torna-se
“lei”, reproduzindo o que aconteceria no ambiente doméstico.
Com uma vasta experiência em empresas multinacionais e hoje atuando na
familiar Metalúrgica Barra do Piraí/RJ, o gerente de Recursos Humanos Márcio
Augusto Walter afirma que existem aspectos positivos nas corporações familiares.
Dentre as vantagens, ele afirma que as decisões são tomadas de forma mais rápida
e regionalizadas, diversamente das multinacionais onde prevalecem os
entendimentos corporativos, do head-office. Por outro lado, no aspecto do
treinamento, remuneração e benefícios as multinacionais investem mais pesado e
manifestam maior interesse na formação dos profissionais. “Comumente, fazem
pesquisas de clima organizacional, têm um sistema de avaliação de desempenho e
potencial, baseado no atingimento de objetivos”, complementa.
Ao ser questionado sobre a atuação do profissional de RH, dentro das empresas
familiares, Márcio Walter mostra otimismo e diz que não há risco de que haja
discriminação ou restrições às ações do Departamento de Recursos Humanos. O que
ocorre, salienta o gerente de RH da MBP, é que todos entendem um pouco sobre os
assuntos relacionados à área de RH e, logicamente, tentam apresentar sugestões.
“Como as multis possuem políticas mais rígidas e padrões internacionais, essa
influência é menos acentuada. Por sua vez, as familiares estão modernizando-se
cada vez mais. A riqueza de informações via Internet tem colaborado muito para
esta mudança, pois é cada vez mais fácil acompanhar as tendências, as inovações
nos assuntos gerais e de gestão de pessoal”, salienta Márcio Walter.
Quanto à política ideal para ser implantada numa organização familiar, o
gerente da MBP observa que deve prevalecer a confiança e o respeito às pessoas.
“Tanto nas familiares, quanto nas multis, deve existir um bom relacionamento
entre chefia-subordinado, pois tratar bem as pessoas nada custa, e sempre trouxe
resultados positivos para as organizações. Devemos levar em conta que o homem é
a peça-chave no desenvolvimento e no sucesso das empresas”, resume.
Quem também aponta diferenças nas administrações de empresas familiares,
multinacionais e nacionais de grande porte, é o gerente de RH da Michel Merheje/SP,
Alberto Pirró Ruggiero. Para ele, o sucesso ou o fracasso da ambientação do
profissional de RH, frente à realidade de atuar numa corporação familiar,
depende de fatores intrínsecos e extrínsecos que podem interferir na adaptação.
"Como fatores intrínsecos cito a experiência, a capacidade de percepção, a
flexibilidade, a velocidade de resposta, a negociação e a capacidade de se fazer
entender como fatores primordiais", diz Ruggiero. Já os fatores extrínsecos,
salienta ele, seriam a definição de papéis e de responsabilidades por parte da
diretoria, limites de atuação, respeito, a quem deverá responder e a definição
de objetivos como fatores mais importantes.
"Quando passei a atuar numa empresa familiar, senti algumas dificuldades
devido à rapidez como as decisões são tomadas, o atendimento a dois diretores
simultaneamente e às demandas reprimidas em relação a aspectos de RH. Mas nada
que qualquer profissional, com um mínimo de bom senso, não possa fazer",
confessa Ruggiero que também já trabalhou na multinacional Mercedes-Benz.
Alberto Ruggiero acredita que o profissional de RH tem plenas condições de
desenvolver um bom trabalho dentro de organizações familiares, uma vez que são
empresas que possuem campo fértil e desafiante. Ele afirma que é possível
realizar um projeto estratégico de RH, começando-se do zero. Para isso, o
profissional de RH precisa conhecer o negócio da empresa, bem como possuir uma
visão estratégica de negócios. "Vejo o profissional de RH mais como um técnico
de futebol, pois nem sempre, por mais competência que tenha, obterá sucesso em
todos os empreendimentos. A inexistência de recursos ou o excesso de controle
sobre seu trabalho por parte da diretoria, pode minar qualquer obtenção de
resultados. Por isso, deve-se deixar muito claro o que é de competência do
profissional de RH e o que compete à diretoria", defende.