Dívidas / Endividado ? - ‘Emprestar’ nome para fazer compras pode ser mau negócio
Boa parte das dívidas que atualmente estão sendo cobradas no Brasil não é de
responsabilidade de quem fica com o bem, mas de terceiros, que emprestam seus
nomes a parentes e amigos para obter crédito ou realizar compras a prazo. Os
amigos e parentes não estão pagando as dívidas e quem emprestou o nome está indo
para o cadastro de devedores do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) e Serasa,
ou seja, está ficando com o nome sujo na praça.
Essa constatação foi feita pelo especialista em finanças pessoais Rafael
Paschoarelli após estudo sobre a inadimplência nas lojas de varejo. No estudo,
ele não chegou a apontar o tamanho da inadimplência atribuída a terceiros, mas
pôde notar que é grande o número de brasileiros que não são culpados pelas
dívidas que contraíram.
Segundo a Serasa, existem milhões de inadimplentes no Brasil.
De acordo com a coordenadora do SPC em Bauru, Sônia de Oliveira, não é
especificado nesse cadastro se a dívida é do próprio devedor ou de terceiros.
Mas segundo o coordenador do Procon na cidade, Amauri Roma, a prática tem se
tornado bastante comum, assim como o registro do nome de “inocentes” nos
cadastros do SPC e Serasa.
Ele lembra que, nesses casos, o Procon não tem como ajudar. A recomendação,
segundo ele, é nunca emprestar o nome, mesmo que o solicitante seja amigo íntimo
ou parente próximo. “Se a pessoa diz ‘não’, ela corre o risco de perder o amigo.
Mas se ela diz sim, corre o risco de perder o amigo e também o dinheiro”, alerta
ele.
Roma conta que já ficou sabendo de mãe que usou o nome da filha para financiar
uma compra e não pagou a dívida. O nome da filha foi parar no SPC. Segundo ele,
quando isso ocorre não há muito o que fazer. É preciso pagar a dívida para ter o
nome limpo novamente.
O que fazer
O primeiro passo é procurar o verdadeiro devedor para que ele pague a dívida,
mas nem sempre isso resolve o problema. Se o amigo ou parente não tem dinheiro,
quem emprestou o nome terá de arcar com o prejuízo e ainda será obrigado a
correr atrás da empresa para a qual está devendo e tentar um parcelamento da
dívida. É a única forma de livrar o nome dos registros do SPC ou Serasa.
Foi o que aconteceu com a recepcionista Michele, 22 anos, que pediu para não ter
o nome completo divulgado. Ela aceitou fazer um empréstimo em seu nome para a
mãe do então namorado. A mulher, que estava com o “nome sujo” na praça, pagou as
duas primeiras parcelas (algo em torno de 1 salário mínimo) e não conseguiu
pagar as restantes.
O nome da devedora foi mandado para o SPC e Michele descobriu isso da pior
maneira possível. “Um dia eu fui parcelar a compra de um sapato e uma
funcionária da loja me chamou em um canto e disse que não poderia fazer o
parcelamento porque meu crédito estava com restrição”, recorda ela. “Foi muito
constrangedor.”
A recepcionista diz que procurou a mãe do ex-namorado, mas ela alegou que não
tinha dinheiro para pagar o restante das parcelas. “Passei mais de duas semanas
correndo atrás de limpar meu nome. Usava meu horário de almoço para resolver
esse problema”, relata. Hoje, Michele diz que não empresta o nome para mais
ninguém. “Só se for para o meu pai ou minha mãe”, pondera. “Não é por falta de
confiança nas outras pessoas, mas por medo”, justifica.
Para evitar todo esse transtorno, Paschoarelli é taxativo. “A dica é não
emprestar o nome. É muito arriscado. Para quem não pagou uma vez, o que perde se
não pagar de novo? Qual a crise de consciência que ele vai ter?”, indaga.
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Perfil dos devedores
Levantamento divulgado pela Associação Comercial de São Paulo no início deste
ano mostra o perfil dos inadimplentes no Estado. Eles são homens, com renda
mensal que varia de 1,5 salários mínimos a 5,5 salários mínimos e com idade
entre 31 e 40 anos.
A principal razão apontada pelo estudo para a inadimplência é a perda do emprego
(53%). O segundo motivo (14%) é ter sido fiador, avalista ou emprestado o nome
para terceiros. A maioria (83%) fez empréstimo consignado em folha de pagamento
ou aposentadoria. O destino desse dinheiro foi pagar dívidas (62%), reformar o
imóvel (14%) e comprar produtos (12%).
De acordo com a pesquisa, a forma de pagamento utilizada pelos inadimplentes
está dividida quase na mesma proporção entre cheques (35%), carnês (34%) e
cartões de crédito e empréstimos (31%).
Segundo o levantamento, 62% dos inadimplentes são homens. É praticamente a mesma
porcentagem de um ano atrás, quando o mesmo estudo apontou que 61% da
inadimplência no Estado havia sido causada pela ala masculina dos consumidores.
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