Especialistas dizem quais taxas são aceitáveis e quando o custo dos gestores
reduz a rentabilidade a ponto de tornar outros investimentos mais atrativos
Taxas de administração muito altas podem reduzir bastante o rendimento líquido
Da mesma forma que pode valer a pena gastar um bom dinheiro para ir a um
restaurante caro de um chef renomado para degustar um prato saboroso, às vezes
também é vantajoso contratar um gestor experiente - e caro - para que ele decida
onde seu dinheiro será investido. No Brasil, milhares de executivos são
responsáveis pela administração do dinheiro aplicado em fundos, mas aqueles que
batem ano após ano os retornos médios entregues pelo mercado não chegam a uma
centena. Especialistas dizem que vale a pena pagar um pouco mais para entregar
seu dinheiro nas mãos desses gestores - que, se fossem chefs, receberiam três
estrelas no guia "Michelin". No entanto, ao escolher um fundo sem muita
pesquisa, o melhor a fazer é buscar taxas inferiores à média do mercado porque,
muitas vezes, o custo do gestor pode reduzir ou até mesmo acabar com a
atratividade da aplicação.
No Brasil, os fundos costumam cobrar dois tipos de taxas. A de administração
serve para remunerar o gestor pelo seu trabalho de escolher a melhor aplicação
para colocar seu dinheiro. Já a taxa de performance é uma espécie de "prêmio"
para o gestor que fez o dever de casa, soube antecipar cenários econômicos e
entregou lucros acima da média aos quotistas. Em geral, a cobrança dessa segunda
taxa só se justifica na gestão de aplicações em renda variável, que exigem uma
análise diária da carteira e a realocação constante dos recursos.
Uma terceira taxa existente no mercado brasileiro é para a entrada e saída em
um fundo. A intenção, nesses casos, é incentivar que o quotista permaneça com o
dinheiro aplicado por um prazo mais longo de forma a permitir que o gestor possa
aproveitar oportunidades de investimento em negócios menos maduros que só serão
lucrativos após vários anos. A taxa de saída, nesses casos, costuma ser cobrada
apenas se o investidor decidir resgatar seus recursos antes do fim de um
determinado prazo acertado entre as partes.
Qual o valor justo?
Em geral, fundos que aplicam em ativos de menor risco, como a maior parte dos
de renda fixa e DI, requerem menos habilidade do gestor. Por isso, é melhor que
tenham taxas de administração inferiores às dos fundos mais arrojados, como os
de ações e multimercados. O especialista em finanças pessoais Mauro Calil
acredita que nos fundos de renda fixa, o ideal é que a taxa de administração não
ultrapasse 1% ao ano. "Nos fundos de renda fixa, uma taxa de 3% ou 4% ao ano
sobre o total investido pode ser igual à metade do ganho líquido do investidor",
diz.
Para um bom fundo de renda variável, ele acredita que uma taxa de 3% ao ano
pode ser justificável desde não seja cobrada também a taxa de performance. Na
opinião do coordenador do Centro de Estudos em Finanças da Fundação Getulio
Vargas (FGV), William Eid Jr., há uma importante diferenciação entre os fundos
de renda variável. Naqueles chamados no mercado de "passivos" - em que o gestor
apenas aplica o dinheiro em uma carteira semelhante à de um índice de ações como
o Ibovespa - o ideal é que a taxa seja de até 1% ao ano. "Mais que isso já é
muito", ensina. Já para os fundos ativos em renda variável (multimercados ou de
ações), a praxe é cobrar algo em torno de 2% ao ano pelos custos com
administração mais uma taxa de performance equivalente a 20% do que superar o
rendimento estipulado como meta. "Só se a rentabilidade for muito alta não tem
problema cobrar uma taxa maior do que 3%", explica.
Um estudo realizado pela Associação Brasileira das Entidades do Mercado
Financeiro e de Capitais (Anbima) entre 2005 e 2010 mostra que as médias das
taxas de administração de fundos DI e de renda fixa no Brasil vêm caindo ao
longo dos anos. A maior parte do patrimônio líquido desses dois tipos de
aplicação já se concentra em fundos com taxas menores que 1% ao ano. Segundo o
vice-presidente da associação, Demosthenes Pinho Neto, isso se deve a dois
fatores: a migração de recursos de fundos mais caros para os mais baratos e a
criação de novos fundos já com taxa de administração mais baixa.
Mas Mauro Calil alerta que alguns fundos de renda fixa antigos ainda mantêm
taxas de administração que chegam a 5% ao ano. "Muita gente ainda não se deu
conta de que pode migrar os recursos para um fundo com taxa menor. O investidor
fica um pouco inibido porque quanto mais tempo ele deixa o dinheiro no fundo,
menor será a alíquota do Imposto de Renda. Mas, mesmo assim, na maioria dos
casos é interessante migrar. Os fundos novos caros estão cobrando 2% de taxa",
diz.
Por outro lado, os fundos que operam renda variável têm assistido a uma
elevação nos custos com gestão. O mesmo estudo da Anbima mostra que a média das
taxas de fundos de multimercados tende a oscilar, mas fica entre 1,8% e 1,9%. Já
a de fundos de ações ultrapassa um pouco os 2% ao ano. Fundos com taxa entre 1%
e 2% concentram a maior parte do patrimônio, sendo que houve uma redução
significativa de concentração em fundos com taxas superiores a 4% ao ano.
De acordo com o vice-presidente da Anbima, a elevação das taxas de fundos
mais "ativos" se justifica pela introdução de novos instrumentos no mercado,
como derivativos e crédito privado. Analisar esses produtos exige um trabalho
bastante sofisticado do gestor. O grande número de empresas que vêm abrindo seu
capital também incentivou o aumento das taxas. "O custo de produtos tão
complexos é maior", diz Demosthenes Pinho Neto.
O que o investidor paga
Mas, afinal, o que está embutido na taxa de administração? Ela custeia os
serviços prestados pelo administrador ou por terceiros. Ou seja, banca a
administração, a gestão, a custódia, a distribuição, atividades de consultoria
de investimentos, tesouraria, controle, registro da emissão e resgate de cotas,
classificação de risco por agência especializada e contratação obrigatória de
auditoria independente.
Outro fator que influencia o valor da taxa é o segmento de mercado para o
qual o fundo é voltado. As taxas praticadas no varejo - o segmento dos pequenos
investidores, pessoas físicas ou pequenas empresas com saldo médio menor que R$
105.000 - costumam ser maiores que aquelas cobradas pelos fundos de atacado -
investidores corporativos, institucionais e private banking - e pelos fundos
exclusivos - de um ou poucos grandes investidores.
Isso porque fundos de varejo requerem, além da gestão, uma ampla gama de
serviços para atender a seus inúmeros cotistas e permitir transações constantes.
Por exemplo, um grande banco de varejo precisa dispor de uma rede de agências,
funcionários, caixas eletrônicos, divulgação e propaganda para informar e atrair
novos clientes, além de canais de comunicação com o público. Também tem de arcar
com obrigações legais como a confecção de regulamentos e prospectos e com os
custos de organização de assembleias gerais de cotistas.
Esses fundos também costumam ter tíquetes de entrada mais baixos que os de
demais segmentos, o que significa que o investimento mínimo inicial é menor que
R$ 20.000. Com isso, demoram mais para ficar maduros, e o retorno para o
administrador vem apenas no médio ou longo prazo. No fim das contas, as taxas
são geralmente mais altas quanto menor for o tíquete de entrada.
Taxa de performance só em fundos mais arriscados
Já a taxa de performance é um percentual fixo cobrado por fundos que operam
renda variável, como os multimercados e os de ações. Os fundos de renda fixa
voltados para investidores qualificados ou classificados como de longo prazo -
com prazo médio de carteira maior que um ano e que invistam em ativos mais
arriscados, como títulos privados - também podem ter taxa de performance. Os
demais fundos de renda fixa, os referenciados DI e os de curto prazo, no
entanto, não podem cobrá-la.
O desconto só é feito quando o rendimento do fundo ultrapassa o indicador de
desempenho que o baliza, o chamado benchmark. A exceção à essa regra é
quando o fundo dá prejuízo. Isso quer dizer que se o Ibovespa cair 40% e um
fundo de ações perder 30%, não há cobrança de taxa apesar de o benchmark ter
sido superado. No caso dos fundos multimercados, que aplicam em uma série de
ativos diferentes, tanto de renda fixa quanto variável, o gestor pode definir
seu parâmetro, que pode ser até mesmo o CDI. Segundo William Eid, especialista
em finanças pessoais da FGV, os valores costumam ser de 20% quando o parâmetro é
o CDI, e de 25% quando é o Ibovespa.
No entanto, ele faz um alerta: "Não existe comprovação de que fundos que
cobram taxa de performance sejam mais bem-sucedidos do que aqueles que não
cobram. Mas é um incentivo para a busca de melhores resultados." Na opinião de
Mauro Calil, o ideal é que não haja taxa de performance, mas, se houver, não
deveria ultrapassar os 20%. "O investidor só paga taxa quando supera o
benchmark. Então por que o gestor não paga algo ou compensa o cotista
quando o fundo vai muito mal? É injusto", diz.
Todos os fundos precisam divulgar claramente em seus prospectos e
regulamentos o valor de suas taxas e todas as possibilidades de contratação de
outros prestadores de serviço. Qualquer modificação nesses documentos, como o
aumento ou a alteração do cálculo das taxas, deve ser aprovada pelos cotistas,
reunidos em assembleia geral. No entanto, eventuais reduções nos valores podem
ser feitas pelo administrador sem prévia autorização dos investidores.
É importante lembrar que o valor das taxas não deve ser o único fator
considerado pelos cotistas ao escolher um fundo. Rentabilidade, risco, histórico
de desempenho, perfil do investidor e idoneidade do gestor devem ser analisados
com lupa. É aconselhável informar-se sobre todos os detalhes do fundo e evitar
aqueles que cobram uma taxa baixa mas possuem uma reputação ruim no mercado. Da
mesma forma que o prato de um chef pode proporcionar uma experiência
gastronômica inesquecível, manter-se longe da comida de um ambulante na porta de
um estádio de futebol também é importante para evitar uma intoxicação alimentar.