Atraso na entrega de carro permite cancelar a compra
Grande demanda ou problemas na produção podem atrasar as entregasEm épocas de
demanda aquecida, a espera para sentar atrás do volante do carro novo pode se
tornar um suplício. Em vez daqueles poucos dias de aguardo a que os brasileiros
se acostumaram no passado, o prazo para entrega pode se estender por meses, a
ponto de o consumidor ter de tomar medidas legais contra a concessionária e a
montadora. Os atrasos nada têm a ver, por exemplo, com o valor pago de entrada.
Em geral, são fruto da grande procura por determinados modelos ou de problemas
na produção. Portanto, é muito difícil para o consumidor evitar esse transtorno.
Mas é possível minimizar os danos, seguindo algumas orientações de especialistas
em direito do consumidor.
Primeiro, antes de comprar um veículo, é importante checar os prazos de
entrega em diferentes concessionárias e verificar nos órgãos de defesa do
consumidor se há reclamações contra as lojas e a montadora. Se houver mais de
uma concessionária da marca na cidade do consumidor, o melhor é fugir da mais
problemática. Já houve, por exemplo, casos de concessionárias que continuaram
vendendo mesmo após decretar falência ou ainda aquelas que tiveram o
fornecimento de veículos suspenso por estarem em débito com a montadora.
Informações sobre reclamações normalmente estão disponíveis nos sites dos
Procon. A página do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC)
também traz um banco de dados no qual é possível buscar certos fornecedores e
saber a quantidade e o motivo das queixas registradas em determinado período.
Para acessar o Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (Sindec),
é só clicar no item ''Sindec'' do menu lateral no endereço
http://portal.mj.gov.br/dpdc.
"Essa pesquisa é uma maneira de identificar, aproximadamente, a conduta da
empresa. Checar fóruns na internet também vale a pena", afirma Valéria Cunha,
assistente de direção do Procon-SP. O que não falta na web são sites de
reclamações em que consumidores insatisfeitos expõem seus problemas e sua
revolta em relação a certos produtos e serviços. As queixas contra
concessionárias e montadoras em relação a atrasos na entrega de carros são
recorrentes.
Em segundo lugar, deve-se sempre exigir por escrito a fixação de uma data
para a entrega do produto, anotada no pedido de compra junto com as demais
informações sobre o veículo e o pagamento. Esse documento serve de prova para o
consumidor reclamar seus direitos em caso de descumprimento do prazo. Embora o
Código de Defesa do Consumidor não estabeleça um limite de espera, o combinado
por escrito vale como um contrato. Não entregar até a data fixada configura,
portanto, quebra contratual. E atenção: previsões como "até 30 dias" não valem.
O CDC exige que seja uma data precisa.
Mas mesmo que o consumidor não tenha exigido um documento, o acordo verbal já
é válido. Caso a concessionária não cumpra o combinado, o consumidor pode entrar
na Justiça ainda que não tenha prova do acordo. "Nesse caso, a empresa é que
teria de provar que não houve o acordo verbal, o que é quase impossível de
fazer", explica o defensor público do Núcleo de Defesa do Consumidor da
Defensoria Pública do Rio de Janeiro, Fábio Schwartz.
No entanto, quando a demora é grande demais, qualquer prova se torna
desimportante. Nesse caso, vale o bom senso. De acordo com Schwartz, para
veículos em estoque, o prazo de entrega praticado no mercado normalmente é de
até cinco dias úteis. Quando não há carros em estoque, esse prazo pode chegar a
15 dias úteis. "Mais do que isso não é considerado razoável. Se a data limite
dada pela concessionária tiver passado e a espera já chegar a alguns meses, o
fornecedor nem tem como se defender em caso de processo. O bom senso, nesses
casos, dispensa a prova", esclarece o defensor.
Quando o prazo expira
Passado apenas um dia da data estipulada para a entrega do carro, o
consumidor já pode reclamar seus direitos. De acordo com a lei, ele tem três
opções: exigir a entrega imediata do carro, aceitar um veículo equivalente ou
cancelar a compra e pedir seu dinheiro de volta, com juros e correção monetária.
"Se o consumidor verificar que o veículo desejado está disponível em outra
concessionária, por exemplo, ele pode cancelar a compra e efetuá-la na outra
loja", aconselha a assistente de direção do Procon-SP.
Para exigir uma das três soluções, o consumidor deve enviar uma reclamação
por escrito à concessionária, detalhando as condições de compra (número do
pedido, data, descrição do produto, preço), o motivo da reclamação, uma cópia do
comprovante de pagamento da entrada ou das parcelas já quitadas e a sua
exigência. Deve-se estabelecer um prazo, por exemplo, de cinco dias úteis para
que o problema seja solucionado. Se o consumidor tiver feito outras reclamações
antes, também deve relatá-las e comprová-las, fornecendo os números de protocolo
de atendimento telefônico, por exemplo.
É fundamental documentar todos os contatos feitos com a concessionária ou com
a montadora, que, nesse caso, responde solidariamente pelos atrasos na entrega.
Os contatos telefônicos devem ter número de protocolo, mas também é uma boa
opção anotar o nome do atendente, dia e horário da ligação. Ao entregar uma
carta em mãos, o consumidor deve exigir um recibo; caso as mande pelo correio, é
preciso pedir aviso de recebimento. E é sempre bom guardar cópias de todos os
documentos enviados para os fornecedores.
Sempre tente resolver os problemas com entregas de maneira amigável com a
concessionária e a montadora. Se ainda assim as empresas forem evasivas ou se
recusarem a dar uma solução, cabe acionar um órgão de defesa do consumidor ou
até mesmo a Justiça. Assim, é possível reparar danos morais e materiais
decorrentes, por exemplo, da perda de um dia de trabalho ou de um compromisso de
família para ir buscar o carro na data marcada no dia da compra. "Se o
consumidor se sentir manipulado, se ficar aguardando um contato que nunca é
feito ou uma decisão que nunca é tomada, é melhor recorrer aos órgãos
competentes", afirma Valéria Cunha, do Procon-SP.