Quem se lembra da crise financeira vivida no mundo e no Brasil há cerca de um
ano e meio? Depois de um período de ajustes na economia, com demissões,
diminuição no crescimento e alguma instabilidade, o mercado brasileiro volta a
dar sinais de crescimento, com a taxa de desemprego em claro sinal de melhora e
previsão de crescimento acima de 6% para 2010. Indicadores de confiança
acompanham o mercado e mostram que o consumidor acredita que o pior já passou e
que a hora é de consumir mais. Empresas anunciam fusões e o mercado de ações
volta a efervescer. Crise? Que crise?
"Dívida de consumidor de SP cresce 24%. Quatro em cada dez
consumidores de 15 regiões da capital paulista estão na lista do SCPC
(Serviço Central de Proteção ao Crédito), que inclui dívidas com atraso a
partir de dez dias, segundo dados de janeiro a junho deste ano" -
Claudia Rolli, edição de 15 de agosto do jornal Folha de S.
Paulo, caderno Mercado.
O número total de inadimplentes chegou a 4,16 milhões, cerca de 40% do total
de habitantes das regiões pesquisadas (10,94 milhões). O número representa queda
de 14,5% em relação ao primeiro semestre de 2009, mas ainda assim é bem alto.
Apesar de a pesquisa ter como foco 61 bairros e 15 áreas distritais, proporção
semelhante deve ser encontrada em outras cidades Brasil afora.
Toma lá, dá cá!
O que tudo isso tem a ver com a crise, mencionada no primeiro parágrafo? Vamos
tentar chegar a uma conclusão juntos: você sabe quais são as maiores causas de
inadimplência? Os consumidores com problemas de pagamento apontam a perda do
emprego, o descontrole de gastos e emprestar o nome/cartão para familiares e
amigos como os principais motivos.
Traduzindo, as chances de perder o emprego durante uma crise aumentam
consideravelmente, o que explica o maior número de inadimplentes em 2009. A
falta de planejamento impede que muitos brasileiros se preparem melhor para
emergências e comprometam grande parte de sua renda com dívidas desnecessárias.
Quando há trabalho e emprego, falta bom senso e controle. Quando sobra algum
capital, alguém logo pede emprestado e contribui para que tudo fique do mesmo
jeito ou pior. É triste constatar que são muitos os brasileiros pagando dívidas
empurradas do ano passado. Mais triste é saber que, para não ficarem de fora da
"onda do consumo", muitos deles já fizeram novas e maiores dívidas em 2010.
Está tudo bem? Prepare-se para o pior!
O texto de hoje tem tons de indignação. A situação me preocupa, principalmente
porque quando damos a volta por cima insistimos em cometer os mesmos erros. Esta
não será a última crise, assim como 2010 não será o único ano de crescimento
acima da média. Sabendo disso, o que você faz? Dar de ombros é comum,
infelizmente. Proponho atitudes mais inteligentes:
- Crie uma reserva de emergência. O momento em que você
tem dinheiro disponível, fluxo de caixa previsível e possibilidade de se
organizar tem que ser aproveitado para investir no futuro e criar
oportunidades concretas de consumo e padrão de vida diante de futuras
crises. Falei sobre isso no artigo
"Você mantém uma reserva financeira para emergências?";
- Evite comprometer mais do que 30% de sua renda mensal com
dívidas de mais de 30 dias. Prefira negociar insistentemente e
pagar quando tiver o dinheiro disponível à vista. Certifique-se que há
dinheiro para a qualidade de vida, para os investimentos (pelo menos 10% da
receita líquida) e para o básico;
- Imponha e respeite limites para categorias de gasto do
orçamento. Com o que você gasta seu dinheiro? Os inadimplentes têm
sempre desculpas e justificativas para chegar ao final do mês com a corda no
pescoço. Comece a anotar tudo o que recebe e gasta como uma simples
experiência e depois de algum tempo observe suas anotações. "C@#%#$@,
para onde foi meu dinheiro?" é uma reação bem comum. Mais sobre
orçamento no artigo
"Sua saúde financeira e os 'Outros'".
Como sempre, interpretar um artigo deste tipo é uma tarefa pessoal. Possíveis
reflexões sobre seu dia-a-dia financeiro só serão bem-vindas se você admitir que
lidar bem com dinheiro deve ser uma de suas principais prioridades. Ou corremos
o risco de continuar comentando números e conclusões cada vez piores sobre
inadimplência, endividamento, crise etc. Terá fim essa história?