Nos mercados acionários percebe-se com grande facilidade a
preocupação do investidor, seja ele preferencialmente especulador ou
institucional, na determinação a cada instante das perspectivas dos preços das
ações.
As previsões sobre lucros futuros de cada empresa e a análise da situação
econômico-financeira são indispensáveis para que o investidor consciente consiga
otimizar o resultado de suas aplicações em ações negociadasnas bolsas de
valores.
A Escola FundamentalistaO
fundamento teórico desta escola repousa na tese de que existe uma
correlaçãológica entre o valor intrínseco de uma ação e seu preço de mercado. O
valor intrínseco para a escola fundamentalista é representado pela avaliação do
patrimônio da empresa, seu desempenho e sua posição no respectivo setor de
atuação, pela intensidade da concorrênciae pela existência de produtos e
serviços alternativos, pelo grau de atualização tecnológicado empreendimento,
pelo nível de intervenção estatal na área de atuação (controle de preços,
proteção tributária, subsídios, etc), por seu programa de investimentos, por sua
política de distribuição de lucros e pelo cálculo do valor presente dos lucros
futuros estimados.
Da observação dos mercados acionários norte-americanos, os investidores que
adotam os princípios da escola fundamentalista podem genericamente ser agrupados
emdois grupos.
O primeiro reúne os que trabalham prioritariamente sobre as previsões
delucros futuros das diversas empresas, e procuram localizar no mercado as que,
tendo boasperspectivas, tenham cotações aviltadas à luz das perspectivas dos
resultados.
Para este grupo, os ganhos poderão advir das realizações quando os preços se
ajustarem às previsõesde lucros ou do retorno relativo à distribuição futura dos
lucros.
Outro conjunto é formado pelos investidores que procuram empresas com
baixascotações em relação a seus ativos, e que tenham controle acionário
concentrado. Nestes casos, o objetivo costuma se concretizar um “take-over”,
reunindo um lote expressivo osuficiente para garantir participação no processo
decisório da firma, seguido de propostas de desmembramento parcial ou total do
ativo para venda a terceiros, com conseqüênciasfavoráveis sobre as cotações nas
bolsa.
Teoricamente, quando o valor intrínseco se situasse acima do preço de
mercado, ocorreria uma indicação de compra; ao contrário, preço de mercado
superior ao valor intrínseco indicaria conveniência de venda.
Entretanto, essa colocação genérica não contempla a realidade dos fatos.
Primeiramente, a natureza dos componentes listados torna iqualificado o valor
intrínseco. Diante disso, é comumente utilizado o valor patrimonial de cada
companhia para as análises fundamentalistas.
Por outro lado, na verdade, algumas ações podem passar longos períodos com
preços sistematicamente superiores a seus valores patrimoniais e nem por isso
deixarem de ter ofertas de compra provenientes de investidores tecnicamente
qualificados.
Um bom exemplo extraído da Bolsa de Valores do Rio de Janeiro é a situação da
ação ordinária ao portador de White Martins, que no transcurso de dois anos
(entre julho de 1989e junho de 1990) só não viveu essa situação na segunda
quinzena de março/90, logo após o Plano de Estabilização Econômica.
A constatação de fatos desta natureza conduziu ao aprimoramento dos
instrumentosda escola fundamentalista, e à criação de certos índices que se
tornaram clássicos para a avaliação de empresas.
Principais ÍndicesÍndice
Preço/Lucro: Esta relação decorre da divisão entre a cotação de um
determinado papel, em certo momento, pelo lucro líquido por ação (anual ou
anualizado por alguma técnica adequada) proporcionado pela respectiva empresa.
Este quociente espelha o prazo de retorno do investimento (sob as formas de
dividendos ou do reforço das reservas livres da companhia).
Em princípio, deduz-se que quanto mais baixo o P/L mais recomendável será
realizar aquisições, e vice-versa; na realidade, este índice não deve ser
utilizado isoladamente para respaldar decisões de investimento.
O conceito do índice deve ser dinâmico, ou seja, sua utilização deve conter
as perspectivas de desenvolvimento daempresa e de seus lucros, de acordo com os
prazos ideais (do ponto de vista do investidor)para sua aplicação no papel em
questão.
No caso brasileiro, alguns fatores dificultam a utilização do índice P/L.
Além dacaracterística universal de várias empresas apresentarem diversos graus
de sazonalidade naformação de suas receitas, ao longo de um exercício social, o
ambiente inflacionário e assucessivas e profundas intervenções governamentais na
atividade econômica causam esseacréscimo de dificuldade.
A observação empírica nos mostra que no Brasil o lucro de uma empresa
podeapresentar grandes variações de um ano para outro; desta forma, o P/L
calculado sobre olucro passado pode nada significar, enquanto que as projeções
de lucros constituemexercícios que em certos casos beiram a adivinhação.Apesar
disso, o índice é bastante utilizado por analistas e investidores em
suasavaliações.
Cash-Yield: Este instrumento decorre da verificação do
dividendo pago em dinheiro, poração.
A exemplo do P/L, é conveniente que sua apuração seja sobre o valor
acumuladoanual, ou anualizado por alguma fórmula adequada.
Para muitos investidores, que preferem retornos em dinheiro para suas
aplicações, o“cash-yield” combinado com levantamentos estatísticos sobre a
periodicidade e a época do pagamento dos dividendos constitui importante
instrumento de apoio a suas decisões.
Um aspecto muito importante, que confere ao “cash-yield” características
diferentes do P/L, é que a legislação societária brasileira permite que em
certas ocasiões sejam efetuados pagamentos de dividendos à conta de saldos de
reservas de lucros, ainda que a empresa não tenha apresentado lucro em seu
último balanço ou balancete.
Além disso, o percentual dos lucros destinados ao pagamento de dividendos
varia significativamente de empresa para empresa.
Por outro lado, o analista deve atentar para os diversos procedimentos das
empresas em relação à periodicidade do pagamento de dividendos. Algumas pagam
dividendos anuais, enquanto outras fazem semestral, trimestral ou mesmo
mensalmente.
Quando o pagamento for parcelado ao longo do exercício social, o investidor
não deve deixar de utilizar deflatores, se as taxas de inflação forem
significativas.
Cotação/Valor Patrimonial: Esta relação, como se verifica
diretamente de seu nome, resulta do quociente entre acotação de um determinado
papel, em certo momento, por seu valor patrimonial.
Este último valor, por sua vez, é obtido pela divisão do montante global do
patrimônio líquidoda empresa pelo número de ações em poder dos diversos
acionistas.
Como se sabe, o patrimônio líquido de uma empresa é o somatório de todos os
recursos da companhia que não são exigíveis a não ser por seus próprios
acionistas (capital integralizado, reservas diversas e lucros acumulados).
Nos balanços este somatório é colocado em destaque, facilitando as consultas.
De maneira geral, além de seu valor absoluto, a relação cotação/valor
patrimonial de cada empresa costuma ser utilizada em comparação dentro de um
mesmo setor de atividades. Além disso, o fato por si só dessa relação ser
superior ou inferior à unidade não deve ser analisado isoladamente; diversos
setores têm características específicas que concentram suas empresas em
determinadas faixas dessa relação, como por exemplo o setor de mineração.
Neste caso, como as empresas mineradoras costumam registrar contabilmente
pequenas parcelas da quantidade total de minério contido nas minas, deixando
portanto um potencial muito grande, suas relações entre cotação e valor
patrimonial são constantemente superiores à unidade, refletindo o conhecimento
que o mercado tem dessa peculiaridade.
Outro ângulo a destacar diz respeito ao financiamento dos programas de
investimentos de empresas de capital aberto.
Se a relação entre cotação e valor patrimonial for muito reduzida, qualquer
chamada de capital só será bem sucedida à custa da concessão de vultoso deságio;
ao contrário, se a relação for elevada, é muito mais provável que a nova emissão
seja bem assimilada pelos investidores.
Certas armadilhas, no caso brasileiro, devem ser evitadas pelos analistas. Em
diversas ocasiões, por motivos diversos em que prevalecem razões políticas, os
índices oficiais de correção monetária situarem-se abaixo das taxas reais de
inflação.
Assim, a correção de valores de ativos mais antigos foi subestimada, fazendo
com que a reserva de reavaliação do ativo, que compõe o patrimônio líquido,
assumisse valor inferior ao necessário.
Desta forma, a apuração do valor patrimonial nesses casos sofre os prejuízos
decorrentes das manipulações dos índices, e dificulta a comparação entre
empresas similares, do mesmo setor, com ativos adquiridos em diferentes épocas.
ResumoA escola fundamentalista
requer intenso e contínuo esforço na obtenção e interpretaçãode uma diversidade
de informações sobre as empresas e seus ambientes.
Seus índices clássicos contêm peculiaridades que devem ser muito bem
conhecidas porseus usuários, sob pena de distorções fatais nas análises
efetuadas.
Os índices já enfocados, ressalvados seus defeitos, permitem ao usuário
projetar o prazo de retorno de seu investimento (P/L). Estimar esse prazo sob a
ótica estritamente financeira (retorno em dinheiro - “cash-yield”); e verificar
se ao comprar uma ação está pagando por ela mais ou menos do que a própria
contabilidade da empresa registra que ela valha (cotação/valor patrimonial).
OutrosFaturamento líquido:
É o saldo dos valores recebidos pela empresa, como remuneração por uma
atividade social, subtraídos os valores referentes a impostos diretos, descontos
concedidos, devoluções e eventuais parcelas repassadas a terceiros, mas que
tenham composto seu preço final; esta informação, no Brasil, pode ser obtida em
relação a vários períodos de tempo: mensal, trimestral, semestral ou anual.
O acompanhamento estatístico dessa informação (devidamente deflacionada)
proporciona uma boa visão da evolução geral da empresa.
Cabe ressaltar que para as instituições bancárias, esta informação não
costuma ser aplicada, sendo mais significativa a referente aos ativos totais,
enquanto que para as empresas “holding” adiciona-se ao seu faturamento líquido
próprio o resultado da equivalência patrimonial.
A equivalência patrimonial a que nos referimos é o somatório do lucro líquido
de cada empresa controlada, distribuído à “holding” na proporção de sua posição
acionária em cadasubsidiária.
Margem Líquida: É a relação entre o lucro líquido (após o
imposto de renda) e o faturamento líquido,demonstra assim para os analistas
quanto resta do faturamento para as destinações decididas pelos acionistas
(reservas livres, dividendos, etc.).
Por outro lado, espelha o peso das despesas não operacionais na estrutura de
custos de cada empresa (despesas administrativas, de vendas, financeiras, etc.),
o que dá boa medida da eficiência de sua gestão; o exame da série de informações
provenientes da margem líquida constitui um instrumento dos mais preciosos para
analistas e investidores, pois seu acompanhamento ao longo do tempo oferece um
seguro retrato sobre o desempenho de cada organização.
Para as empresas do setor bancário, é usual levantar-se a rentabilidade dos
ativos totais, ou seja a relação entre o lucro líquido após o imposto de renda e
o total dos ativos da instituição.
Liquidez Corrente: Trata-se do quociente entre o ativo e o
passivo circulantes; em decorrência, reflete a capacidade de cada empresa de
fazer face a seus compromissos de curto prazo ( em geral até 30 dias); assim
sendo, valores de liquidez corrente inferiores à unidade são preocupantes para o
investidor, significando que a empresa pode ter insuficiência de recursos para
obrigações quase imediatas.
Rentabilidade do Patrimônio: É o quociente entre o lucro
líquido de uma companhia e seu patrimônio líquido. Representa, em outras
palavras, o percentual de retorno dos recursos totais aplicados pelos acionistas
nos negócios (e à disposição dos administradores da empresa), permitindo preve
ro tempo necessário para a recuperação do capital próprio investido; este índice
obviamente permite comparações entre empresas dos mais diversos setores.
Endividamento: É o resultado da divisão entre o passivo
circulante mais o exigível de longo prazo eo ativo total; apresentado geralmente
em termos percentuais, demonstra quanto cada empresa recorreu a capital de
terceiros para financiar suas operações; de maneira geral, exceção feita aos
bancos, esta relação não deve ser superior a 50%, pois valores superioresa este
costumam refletir fragilidade financeira da empresa.
Um complemento relevante que também pode ser analisado é o endividamento de
curto prazo, que vem a ser o quociente,preferivelmente apresentado em termos
percentuais, do passivo circulante sobre o ativototal.
Esta relação demonstra o peso dos compromissos financeiros exigíveis dentro
de umprazo de 30 dias sobre a totalidade dos recursos de cada empresa.
A escola fundamentalista, como vimos, recomenda atenção dos analistas a
to-das asinformações internas, setoriais ou microeconômicas que envolvam cada
empresa.
Assim sendo, a imprensa diária, as publicações setoriais especializadas e os
Diretores de Relações com o Mercado são fontes permanentes de consulta para
complementar os elementos informativos.
No tocante a informações internas, destacam-se eventos como mudanças nos
quadros técnicos e de direção, programas de pesquisa e de desenvolvimentos de
recursos humanos, campanhas publicitárias e, no campo financeiro, alterações na
estrutura do capital de giro da empresa.
Neste particular, um caso clássico é o das grandes cadeias
varejistas,especialmente de super ou hipermercados, que têm enorme potencial de
ganho na gestão dadiferença entre vendas à vista e compras à prazo.
Pode-se mesmo arriscar uma generalização, afirmando que o mais importante
componente do capital de giro da empresaé o crédito oferecido por seus
fornecedores, que via de regra condiciona a política decomercialização de cada
companhia.
Nos campos setorial e macroeconômico, as informações mais relevantes são as
quese refiram à concorrência, às políticas governamentais específicas para área
de atuação decada empresa, em particular as políticas de crédito, fiscal e
cambial.
Para exemplificar, tomemos o setor agrícola, fortemente dependente na maioria
dos casos de empréstimos oficiais, e os setores exportadores, que além de
subsídios tributários podem ser estimuladospor ajustes acelerados na taxa de
câmbio comercial.
Grafistas x Fundamentalistas: esse suposto antagonismo só
persiste na maioria dos casos enquanto o analista se mantém no campo teórico. Na
teoria, a escola técnica prescinde de qualquer informação que não seja referente
à evolução das cotações de um determinado papel no mercado acionário, enquanto
que a escola fundamentalista esmiuça tudo que direta ou indiretamente diga
respeito à empresa enfocada.
Na prática, julgamos que apesar das disparidades conceituais, o domínio dos
instrumentos das duas escolas só melhora as chances de ganho de um investidor em
ações.
Generalizando, as informações da escola fundamentalista oferecem ao usuário
elementos para decidir o que comprar, por outro lado, as ferramentas da escola
técnica se prestam a sinalizar quando comprar (ou vender). Nada melhor,
portanto, para enfrentar a intensa competitividade do mercado acionário, do que
municiar-se de todos os instrumentos disponíveis.