Pedido de declaração da inexigibilidade da exação
referente a salário-educação devido pelas empresas.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DA ..... VARA DA JUSTIÇA FEDERAL DA
SUBSEÇÃO DE ..... - SEÇÃO JUDICIÁRIA DO .....
....., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n.º ....., com
sede na Rua ....., n.º ....., Bairro ......, Cidade ....., Estado ....., CEP
....., representada neste ato por seu (sua) sócio(a) gerente Sr. (a). .....,
brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador (a) do
CIRG nº ..... e do CPF n.º ..... e ....., pessoa jurídica de direito privado,
inscrita no CNPJ sob o n.º ....., com sede na Rua ....., n.º ....., Bairro
......, Cidade ....., Estado ....., CEP ....., representada neste ato por seu
(sua) sócio(a) gerente Sr. (a). ....., brasileiro (a), (estado civil),
profissional da área de ....., portador (a) do CIRG nº ..... e do CPF n.º .....,
por intermédio de seu advogado (a) e bastante procurador (a) (procuração em
anexo - doc. 01), com escritório profissional sito à Rua ....., nº ....., Bairro
....., Cidade ....., Estado ....., onde recebe notificações e intimações, vêm
mui respeitosamente à presença de Vossa Excelência propor
AÇÃO DECLARATÓRIA
em face de
Fundo Nacional de Desenvolvimento a Educação - FNDE, autarquia federal com
superintendência na Rua ....., n.º ....., Bairro ......, Cidade ....., Estado
....., pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.
DOS FATOS
As Autoras são pessoas jurídicas de direito privado, regulares cumpridoras de
suas obrigações previdenciárias.
No exercício de suas atividades mercantis, as Autoras contratam trabalhadores,
sob a égide da legislação trabalhista, obrigando-se, por conseqüência, a
suportar o ônus daí decorrente.
Todavia, insurgem-se as Autoras à imposição do recolhimento do salário-educação
exigido pelo FNDE, pelas razões que passa a expor:
DO DIREITO
O salário-educação, contribuição especial criada como forma alternativa das
empresas cumprirem o seu dever constitucional de manter ensino aos seus
empregados, apresenta desde a sua instituição problemas que o tornam inexigível.
1. Na vigência da Constituição de 1946
A Constituição do Brasil de 1946, seguindo o exemplo das Cartas anteriores,
estabeleceu no seu capítulo da educação e da cultura, que as empresas
industriais, comerciais e agrícolas, onde trabalhem mais de cem pessoas, são
obrigadas a manter ensino primário gratuito para os seus servidores e os filhos
destes.
Com a pretensão de operacionalizar o disposto pela Constituição, o legislador
ordinário, em 27 de outubro de 1964, através da Lei nº 4.440, instituiu o
salário-educação, criando uma obrigação pecuniária, exigida das empresas
vinculadas à Previdência Social, representada pela importância correspondente ao
custo do ensino primário dos filhos dos empregados em idade de escolarização
obrigatória e destinada a suplementar as despesas públicas com a educação
elementar.
Ocorre que a Lei nº 4.440/64, ao criar a referida contribuição especial, não
fixou a sua alíquota, estabelecendo apenas que o salário-educação corresponderá
a uma percentagem incidente sobre o valor do salário-mínimo multiplicado pelo
número total de empregados da empresa. O Poder Executivo Federal, aproveitando a
falta na legislação, expediu sucessivos Decretos (Dec. nº 55.551/65 e
58.093/66), onde, além de regulamentar o citado texto legal, pretendeu
estabelecer uma alíquota para o salário-educação.
Como a Constituição de 1946, seguindo a tradição do constitucionalismo
brasileiro, consagrava em seu artigo 141, § 2º o princípio da legalidade, onde
ninguém pode ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em
virtude de lei, era, e continua sendo, na atual ordem constitucional,
absolutamente impossível um decreto regulamentador fixar as alíquotas de uma
contribuição.
Em seus comentários à Constituição de 1946, Pontes de Miranda esclarecia que
"qualquer regra que crie dever de ação positiva (fazer) ou negativa (deixar de
fazer, abster-se) tem de ser regra de lei, com as formalidades que a
Constituição exige". Assim, concluía o mestre que "a discricionariedade dos atos
administrativos não pode ir ao ponto de obrigar A ao ato "a" ou "b", ou à
omissão a ou b" (in Comentários à Constituição de 1946, 2ª ed. São Paulo, Ed.
Max Limonad, 1953, Vol. IV, p. 70-1).
Neste mesmo sentido, Barros Monteiro, então Ministro do Supremo Tribunal
Federal, ensinava de forma precisa: "é elementar o princípio de que o
regulamento deve ficar adstrito à lei" (RE nº 70.396-SP, in RTJ nº 55, p. 216),
citando ainda João Barbalho, outro ex-Ministro da Suprema Corte, quando
reconhecia que o Poder Executivo cometeria grave abuso em criar, no Regulamento,
direitos e obrigações novas, não estabelecidas pela lei.
"Seria uma inovação exorbitante, uma usurpação do poder legislativo; e assim
poderia o governo criar impostos, penas e deveres não estabelecidos pela lei e
teríamos dois legisladores, tornando-se o sistema constitucional verdadeira
ilusão." (João Barbalho, in Constituição Federal Brasileira - Comentários. 2ª
ed. Rio de Janeiro, F. Briguiet e Cia. Editores, 1924, pg. 249-50).
Desta forma, fica evidente que desde a sua criação a contribuição
salário-educação não apresenta os elementos suficientes para a sua exigência,
ficando assim impossibilitado o seu recolhimento.
2. Na vigência da Constituição de 1967 e Emenda nº 1 de 1969
Com a promulgação da Constituição de 1967 e alterações feitas pela Emenda
Constitucional nº 1, de 1969, o salário-educação foi elevado a nível
constitucional. Em seu artigo 178, a Carta de 1969 estabelecia que as empresas
comerciais, industriais e agrícolas eram "obrigadas a manter o ensino primário
gratuito de seus empregados e o ensino dos filhos destes, entre os sete e os
quatorze anos, ou a concorrer para este fim, mediante a contribuição do
salário-educação, na forma que a lei estabelecer".
A partir de então, o salário-educação constitui uma obrigação pecuniária que é
prestada por opção das empresas, em substituição ao dever de manter o ensino
primário gratuito dos empregados e seus filhos. A empresa tem agora a escolha
entre manter o ensino ou concorrer com o salário-educação.
Era assim recepcionada pela nova ordem constitucional, a Lei nº 4.440/64 que
havia criado a referida contribuição, permanecendo, entretanto, a falta de lei
fixando a alíquota do salário-educação.
Com o objetivo de viabilizar cobrança da contribuição, o Poder Executivo
Federal, em 23 de outubro de 1975, expediu o Decreto-Lei nº 1.422, dando outra
regulamentação ao salário-educação. Surge assim uma nova inconstitucionalidade:
a contribuição do salário-educação não poderia ser regrada via Decreto-Lei.
A Carta de 1967 (Emenda nº 1/69), ao regular o processo legislativo,
estabelecia:
"Art. 55. O Presidente da República, em casos de urgência ou de interesse
público relevante, e desde que não haja aumento de despesa, poderá expedir
decretos-lei sobre as seguintes matérias:
(...)
II - finanças públicas, inclusive normas tributárias;"
Ocorre que o salário-educação, na época, não possuía natureza tributária, nem se
enquadrava no conceito de finanças públicas.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal de longa data reconhecia que a
referida contribuição não possuía natureza tributária:
"Recurso extraordinário. Má aplicação da Constituição. Conhecimento do recurso.
Salário-educação. Natureza. Não tem as características de um tributo.
Substituição de uma obrigação de fazer, imposta pelo art. 170 da Constituição,
por uma contribuição. Provimento do recurso." (RE nº 68.074, DJ 05/12/69).
O Ministro Moreira Alves, do Supremo Tribunal Federal, por sua vez, esclarecia
que:
"A contribuição representada pelo salário-educação não é tributo, mas, sim, uma
das prestações com que as empresas podem cumprir a obrigação constitucional de
auxiliarem o Estado no setor da educação." (RE nº 83.662, in RTJ nº 83, p. 454).
Além de não configurar matéria tributária, o salário-educação também não
pertencia à área cuidada pelas finanças públicas.
Segundo o conceito dado por De Plácido e Silva, finanças exprime "o conjunto de
recursos e meios, de que dispõe ou pode dispor o Estado, para satisfazer suas
próprias necessidades e manter sua existência." (in Vocabulário Jurídico, 7ª ed.
Rio de Janeiro, Forense, 1982, Vol. II, pg. 300).
Aliomar Baleeiro conceituava finanças públicas ou ciência das finanças como:
"A disciplina que, pela investigação dos fatos, procura explicar os fenômenos
ligados a obtenção e dispêndio necessário ao funcionamento dos serviços a cargo
do Estado, ou de outras pessoas de direito público, assim como os efeitos outros
resultantes dessa atividade governamental." (in Uma Introdução à Ciência das
Finanças, 12ª ed. Rio de Janeiro, Ed. Forense, 1978, pg. 22).
Por se tratar de uma obrigação alternativa, prestada pela empresa em
substituição ao dever de manter o ensino aos empregados e os filhos destes, o
salário-educação não estava ligado à obtenção de recursos para o funcionamento
dos serviços estatais. Ficava assim fora das finanças públicas, pois de acordo
inclusive com entendimento de Themístocles Cavalcanti, Ex-Ministro do Pretório
Excelso, a sua arrecadação "não se destina à manutenção do serviço público". (RE
nº 68.074, DJ 05/12/69).
Conforme já se manifestou o Ministro Moreira Alves, "o direito de opção entre as
duas modalidades de prestação, por ter sido deferido ao obrigado - a empresa -,
já está a indicar que a prestação substitutiva (a contribuição) não visa a
fornecer ao Estado meios para que este possa cumprir os deveres que lhe são
impostos como Estado". (RE nº 83.662, in RTJ nº 83, p. 454).
Assim, o salário-educação não visava oferecer recursos para o Estado cumprir as
suas obrigações. Ele era prestado em atendimento a um serviço que, de acordo com
a Constituição, está a cargo das empresas, sendo irrelevante o fato do Estado
ser o órgão arrecadador, a exemplo do que ocorria com o PIS e ainda acontece com
o FGTS.
Na decisão plenária, onde afastou a natureza tributária do Fundo de Garantia por
Tempo de Serviço, o Supremo Tribunal Federal assim concluiu:
"A atuação do Estado, ou de órgão da Administração Pública, em prol do
recolhimento da contribuição do FGTS, não implica torná-lo titular do direito à
contribuição, mas, apenas, decorre do cumprimento, pelo, Poder Público, de
obrigação de fiscalizar e tutelar a garantia assegurada ao empregado optante
pelo FGTS. Não exige o Estado, quando aciona o empregador, valores a serem
recolhidos ao Erário, como receita pública. Não há, aí, contribuição de natureza
fiscal ou para fiscal." (RE nº 100.249-SP, RTJ nº 136, p. 618).
Como o salário-educação fica vinculado a obrigação educacional das empresas, na
vigência da Constituição de 1969, a matéria não era tributária nem de finanças
públicas, embora o Poder Público fosse o órgão encarregado de recolher a
contribuição.
Conforme ensina o Ministro Francisco Rezek, do Supremo Tribunal Federal, "o fato
de o Estado tomar das pessoas determinada soma em dinheiro, e de o fazer
compulsivamente, por força de lei, não é bastante para conferir natureza
tributária a tal fenômeno". (RE nº 148.754-2/RJ, DJ 04/03/94).
Assim, fica evidente que o Decreto-Lei nº 1.422/75 deve receber o mesmo
entendimento dado aos Decretos-Lei nºs 2.445 e 2.449, ambos de 1988, que
pretendiam regular o PIS, uma contribuição que na época não era tratada pelas
finanças públicas, e, por isso, foram julgados formalmente inconstitucionais
pelo Supremo Tribunal Federal (RE nº 148.754-2RJ, DJ 04/03/94). Desta forma,
permanece em vigor a Lei nº 4.440/64, já que não poderia ser revogada por um
Decreto-Lei. Ocorre que, além de extrapolar a sua competência, o Decreto-Lei nº
1.422/75 também deixou de fixar alíquota necessária para que a empresa possa
apurar o montante a pagar. Em seu artigo 1º, o Decreto-Lei apenas estipula que o
salário-educação "será calculado com base em alíquota incidente sobre a folha de
salário de contribuição", estabelecendo no parágrafo 2º deste mesmo artigo, que
a alíquota será fixada por ato do Poder Executivo. Com a lacuna deixada pelo
legislador, o Presidente da República emitiu decretos regulamentadores (Decretos
nºs 76.923/75 e 87.043/82), pretendendo fixar uma alíquota para a contribuição.
A Constituição de 1967 (Emenda Constitucional nº 1), de 1969, também consagrava
em seu artigo 153, parágrafo 2º, o princípio da legalidade, o que descarta a
possibilidade de um simples decreto impor obrigações aos cidadãos.
Explicando o sentido do princípio, José Afonso Silva esclarece que "o Estado, ou
o poder público, ou os administradores não podem exigir qualquer ação, nem impor
qualquer abstenção, não podem mandar nem proibir nada aos administrados, senão
em virtude de lei". Assim, "o poder regulamentar não é poder legislativo, por
conseguinte, não pode criar normatividade que inove a ordenação jurídica" (in
Curso de Direito Constitucional Positivo, 2ª ed. São Paulo, Ed. Revista dos
Tribunais, 1984, p. 566, 571).
"Logo, em suas atividades particulares, ninguém é obrigado a obedecer a qualquer
regulamento, por mais bem redigido e oportuno que seja. Regulamento não é lei."
(Roque Antônio Carraza, in O Regulamento no Direito Tributário Brasileiro, Ed.
Revista dos Tribunais, 1981, p. 155).
O próprio Decreto-Lei nº 1.422/75, quando dispõe que o Poder Executivo fixará a
alíquota, fere do mesmo modo o princípio da constitucional legalidade, pois
pretende que um mero decreto crie direito novo, extrapolando os limites
estabelecidos pela Constituição.
Como já ocorria na vigência da Constituição de 1946, o salário-educação
permanece indevido, pois a empresa não encontra na lei todos os elementos
necessários para apurar o valor que deve ser recolhido, ficando impossibilitada
qualquer exigência pelo Poder Público.
3. Na vigência da Constituição de 1988
Em seu artigo 212, parágrafo 5º, a Constituição Federal de 1988 dispõe que "o
ensino fundamental público terá como fonte adicional de financiamento a
contribuição social do salário-educação, recolhida, na forma da lei, pelas
empresas, que dela poderão deduzir a aplicação realizada no ensino fundamental
de seus empregados e dependentes".
De acordo com o texto constitucional, permanece para as empresas a alternativa:
contribuir com o salário-educação ou manter o ensino dos empregados. Nas
Constituições passadas, a empresa mantinha o ensino ou recolhia o
salário-educação; na atual ordem constitucional, o contribuinte paga o
salário-educação ou aplica estes valores na educação dos seus empregados. O
salário-educação, no entanto, recebe no novo ordenamento constitucional a
natureza de tributo, sendo regrado pelo sistema tributário nacional como uma
contribuição social. Segundo o Ministro Carlos Velloso, do Supremo Tribunal
Federal, entre as diversas espécies tributárias hoje encontradas no Brasil,
tem-se o salário-educação, classificado pelo eminente magistrado como uma
"contribuição social geral" (RE nº 138.284-8 CE, DJ 28/08/92).
Assim, mesmo sendo recepcionada a Lei nº 4.440/64, que institui o
salário-educação, permanecendo a inexigibilidade da contribuição pelo fato de
não existir lei fixando a sua alíquota.
A Carta de 1988, em seu artigo 5º, inciso II, a exemplo das Constituições
anteriores, também estabelece como direito fundamental dos cidadãos o princípio
da legalidade, ficando assim afastada qualquer exigência que não seja criada por
lei. Portanto, o salário-educação não pode ser cobrado pelo fato de não existir
lei que ofereça todos os elementos necessários para a apuração do montante a
recolher.
Após estas considerações, torna-se forçoso concluir que a exigência do
salário-educação, sem que o Legislativo tenha fixado a alíquota de contribuição,
é inconstitucional, notadamente por afrontar o artigo 150, inciso I, da
Constituição Federal e art. 97, inciso IV do CTN.
Neste sentido, o Código Tributário Nacional, que possui natureza de Legislação
Complementar à Constituição, ao reafirmar o princípio máximo de Direito
Tributário da reserva legal, estabelece no art. 97, inciso IV, que a fixação da
alíquota dos tributos é de competência exclusiva da Lei, como assim se observa:
"Art. 97 - Somente a lei pode estabelecer:
IV - a fixação da alíquota do tributo e da sua base de cálculo, ressalvados o
dispostos nos arts. 21, 26, 39, 57 e 65;"
O referido princípio da Reserva de Lei, ou da Legalidade, encontra-se previsto
nos artigos 5º, II, e 150, I, da atual Carta Constitucional, determinando que
somente a norma jurídica, sem sentido estrito, poderá obrigar alguém a fazer ou
deixar de fazer alguma coisa:
"Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em
virtude de lei;"
"Art. 150 - Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é
vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - exigir ou aumentar tributos sem lei que o estabeleça;"
Assim, a expressão "exigir tributos" é o mesmo que fazer incidir uma norma
jurídica, revestida de eficácia, com todos os elementos constitutivos do
tributo. A alíquota, neste passo, compõe-se num dos aspectos da tipificação
tributária, posto que constitui-se, no plano normativo, na proporção a ser
tomada da base de cálculo, segundo nos ensina Aires Barreto (Base de Cálculo,
Alíquota e princípios constitucionais, Ed. RT, 1986), resultando, pois, no
"quantum debetur".
Geraldo Ataliba, (Hipótese de Incidência Tributária, Editora RT, 4ª ed., p.
115), por sua vez, é enfático ao afirmar que, para a fixação do "quantum debetur",
não basta tão somente a previsão da base de cálculo, fazendo-se mister a
previsão também da alíquota que, combinada com a base de cálculo, resultará no
objeto da prestação tributária. Vejamos:
"Não basta para a fixação do 'quantum debetur', a indicação legal da base
imponível. Só a base imponível não é suficiente para a determinação 'in concretu'
do vulto do débito tributário, resultante de cada obrigação tributária.
A lei deve estabelecer outro critério quantitativo que - combinado com a base
imponível - permita a fixação do débito tributário, decorrente de cada fato
imponível. Assim, cada obrigação tributária se caracteriza por ter certo valor,
que só pode ser determinado mediante a combinação de dois critérios numéricos: a
base imponível e a alíquota.
O objeto de cada obrigação tributária (individual e concreta) é o pagamento de
uma soma determinada. A fixação dessa soma depende integralmente da lei. Nem a
administração, nem o contribuinte concorrem com qualquer margem de liberdade no
processo de sua formação."
Resta demonstrado, pois, que a alíquota é aspecto indissociável da norma
jurídica tributária, posto que sua aplicação resultará no objeto da prestação
tributária. Sendo assim, somente lei formal, isto é, aquela que tem origem no
órgão legislativo, votada e aprovada mediante as determinações constitucionais,
tem o condão de fixar a alíquota de qualquer tributo.
Neste mesmo sentido, a lição de Alberto Xavier (Os Princípios da Legalidade e da
Tipicidade da Tributação, Editora RT, 1987, p. 6-7) a qual, com o brilhantismo
que caracteriza o seu autor, ressalta a importância do princípio da legalidade
na instituição de tributos:
"A verdade é que, a partir do século XI, tinha-se já definitivamente enraizado
nos povos europeus a idéia de que os tributos não poderiam ser cobrados, sem que
tivessem sido criado por lei; e, com efeito, o art. XII da Magna Carta, ao
estabelecer que 'no scutage or aid shall be imposed on our kingdon unless by the
common counsel or our kingdon', limitou-se a consagrar uma regra que - mercê de
uma prática reiterada - já tinha sido consuetudinariamente imposta.
A proibição do costume e do regulamento - aspectos mais salientes da reserva de
lei formal - vale assim como o reconhecimento de que, em matéria de impostos, a
justiça só pode ser realizada através de lei formal e que, portanto, só o órgão
legislativo é competente para designar, de entre vários fatos da vida
reveladores da capacidade contributiva, aqueles que concretamente irão dar
origem a deveres tributários, bem como definir o seu regime substancial."
A jurisprudência não discrepa do entendimento ora esposado. Aliás, o Egrégio
Tribunal Regional Federal da 1ª Região houve por bem adotar esse entendimento,
"verbis":
"Somente à lei é dada estabelecer ou disciplinar obrigações tributárias, definir
infrações e cominar penalidades. Não podem fazê-los os Decretos regulamentares
ou atos administrativos." (Ap. Civ. nº 89.01.22901-3 - BA - 4ª Turma do TRF da
1ª Região - julgado em 10/02/92).
Vê-se, à evidência, que a fixação de alíquota para a exigência do
salário-educação somente poderia ser dada mediante lei, jamais por decretos,
impondo-se, dessa forma, o reconhecimento judicial da inconstitucionalidade da
exação hostilizada.
CONCLUSÕES
1) O salário-educação foi instituído em 27 de outubro de 1964, através da Lei nº
4.440, correspondendo a uma porcentagem incidente sobre o valor do salário
mínimo multiplicado pelo número total de empregados da empresa.
2) O Poder Executivo Federal, através dos Decretos nºs 55.551/65 e 58.093/66,
pretendeu fixar uma alíquota para o salário-educação, violando flagrantemente o
princípio da legalidade.
3) Em 23 de setembro de 1975, o Poder Executivo expediu o Decreto-Lei nº 1.422,
dando nova regulamentação ao salário-educação.
4) Sob a égide da Carta Constitucional de 1967, o salário-educação não possuía
natureza tributária, nem se enquadrava no conceito de finanças públicas, pelo
que não poderia ser objeto de Decreto-Lei (RE nº 68.074, DJ 05/12/69).
5) Assim como a Lei nº 4.440/64, o Decreto-Lei nº 1.422/75 é inconstitucional ao
determinar que a alíquota seria fixada pelo Poder Executivo, afronta o princípio
da legalidade.
6) Na Constituição Federal de 1988, o salário-educação recebeu novo tratamento
jurídico, passando a ter natureza jurídica tributária, e a ser considerado como
uma "contribuição social geral" (RE nº 138.284-8, DJ 28/08/92).
7) Atualmente, a Lei nº 4.440/64 está recepcionada pela Constituição Federal, na
parte em que institui o salário-educação, permanecendo, entretanto, inexigível,
posto que não há lei formal fixando sua alíquota.
8) Em decorrência, por não existir lei formal fixando a alíquota do
salário-educação, resta configurada a inconstitucionalidade da exigência, por
ferir o princípio da estrita legalidade, consubstanciada nos artigos 5º, inciso
II, e 150, inciso I, ambos da Constituição Federal, e também artigo 97, IV, do
Código Tributário Nacional.
DOS PEDIDOS
Diante do Exposto, pleiteiam as Autoras:
a) seja declarada, liminarmente, a inexigibilidade do salário-educação, posto
que não existe relação jurídica tributária válida entre as Autoras e o FNDE,
declarando, incidentalmente, a inconstitucionalidade da Lei nº 4.440/64, na
parte em que determina que as alíquotas sejam fixadas pelo Poder Executivo, bem
como a ilegalidade dos Decretos nºs 55.551/65 e 58.093/66, que extrapolaram o
poder normativo concedido pela citada Lei e, ainda, a declaração de
inconstitucionalidade do Decreto-Lei nº 1.422/75, posto que expedido sem
obediência ao art. 55, inciso II, da Carta Constitucional de 1967.
b) a condenação do requerido à restituição dos valores indevidamente recolhidos,
acrescidos de correção monetária e juros legais, bem como o levantamento das
importâncias depositadas.
c) a citação do requerido, para, querendo contestar a presente, no prazo legal,
sendo ao final julgados procedentes os pedidos formulados, condenando-o também
ao pagamento de custas e honorários advocatícios.
d) Protesta-se pela produção de todas as provas em direito admitidas.
Dá-se à causa o valor de R$ .....
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]