Mandado de segurança em face de decisão de juiz da Vara de Execuções Penais que deferiu benefício indevido a detento.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR-PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
DO ESTADO DO .....
Impetrante: MINISTÉRIO PÚBLICO
Impetrado: EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA VARA DE EXECUÇÕES CRIMINAIS DE
.........
O MINISTÉRIO PÚBLICO, pela Promotora de Justiça signatária, com substrato no
artigo 5°, inciso LXIX, da Constituição Federal, e artigos 1° e seguintes da Lei
n° 1.533/51, vem, perante Vossa Excelência, impetrar
MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO DE LIMINAR
em face de
decisão proferida pelo Sr. Magistrado da Vara de Execuções Criminais de
........., Dr. ........., requerendo a concessão de LIMINAR, pelos motivos de
fato e de direito a seguir aduzidos.
PRELIMINARMENTE
DO CABIMENTO E ADEQUAÇÃO DO MANDAMUS E DA LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Considerando que o agravo em execução criminal não tem efeito suspensivo, e que
já houve a autorização para a apenada exercer o trabalho externo, sem o
cumprimento do requisito objetivo, propugna-se, COM URGÊNCIA, através do
presente mandado de segurança, EFEITO SUSPENSIVO ao recurso interposto, evitando
reste este prejudicado, tendo em vista que, do contrário, durante o
processamento do recurso de agravo, estará a condenada usufruindo de benefício
sem previsão legal.
É hoje pacífico que o Mandado de Segurança pode ser intentado contra ato
judicial, especificamente para sustar o cumprimento de decisão, quando o recurso
cabível não tem efeito suspensivo e a ordem possa causar irreparável prejuízo,
sendo inegável o periculum in mora e o fumus boni juris.
Nesse aspecto, assim preleciona JÚLIO FABBRINI MIRABETE:
"Não concedeu a lei ao agravo em execução o efeito suspensivo sob o fundamento
teórico que, como regra geral, não haverá dano enquanto se aguarda a decisão do
recurso interposto pela parte. Entretanto, apesar da orientação geral de que,
sendo o despacho atacável por meio de recurso próprio, incabível é o mandado de
segurança, tem-se admitido que, presentes o fumus boni júris e o periculum in
mora, deve-se admitir o mandamus impetrado pelo agravante para dar efeito
suspensivo ao agravo em execução."1
Por outro lado, assim, já se pronunciaram os Tribunais pátrios:
"Mandado de Segurança - Efeito suspensivo ao agravo previsto na Lei de Execução
Penal. Possibilidade - Progressão de regime prisional - Medida que necessita
ampla análise dos fatos - Laudos contraditórios a suscitar dúvidas sobre o
acerto da decisão proferida - Ordem concedida." 2
"Mandado de Segurança - Objetivo - Efeito suspensivo a agravo na execução da
pena - Admissibilidade - Decisão que defere pedido de progressão de regime a réu
condenado por crime hediondo - Constitucionalidade do regime integral fechado -
Direito líquido e certo da sociedade na aplicação das leis em vigor - Segurança
concedida." 3
"Mandado de segurança. Regimes. Progressividade. Lei n.º 8.072/90. Embora
defensável a tese que preconiza a inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da
Lei dos Crimes Hediondos, porque o mesmo, ao proibir a progressividade nos
regimes, atenta contra o princípio da individualização da pena na terceira fase,
a de execução, a orientação dominante no Tribunal de Justiça do ........., no
Superior Tribunal de Justiça e no Supremo Tribunal Federal é no sentido de que o
legislador constituinte deferiu ao legislador ordinário a regulamentação do
princípio. A polêmica reflete-se, no Estado, nas recomendações aprovadas, por
maioria, no Encontro de Juízes de Execução Criminal, ocorrido em Santa Maria no
ano de 1994. Segurança concedida para conceder efeito suspensivo ao agravo
interposto pelo Ministério Público contra decisão concessiva de progressão a
regime mais liberal de condenado por narcotráfico (art. 12 da Lei n.º
6.368/76)"4
Outrossim, é de ser referido que recentemente, em situação semelhante, foi
concedida a segurança pela Primeira Câmara Criminal, no mandado de segurança n.º
70004253480, que assim decidiu:
"Vistos. 1. Busca o Ministério Público das efeito suspensivo ao agravo em
execução interposto contra a decisão que concedeu progressão de regime a apenado
por homicídio qualificado à pena de 12 anos de reclusão a ser cumprida no regime
integralmente fechado, conforme sentença de fls. 13-14 que transitou em julgado
em 12 de abril de 2000. Com razão o Ministério Público. A decisão que concedeu a
progressão de regime não só desrespeitou a coisa julgada, como também reexaminou
matéria já transitada em julgado, não sendo possível a alteração do regime de
cumprimento de pena no juízo da execução. Além disso, esta Primeira Câmara
Criminal, nas inúmeras vezes em que enfrentou a questão, posicionou-se no
sentido da constitucionalidade do art. 2º, § 1º, da Lei 8072/90, que estabelece
o regime integralmente fechado para o cumprimento da pena privativa de liberdade
aos condenados por crime hediondo, dentre eles o homicídio qualificado. 2. Dessa
forma, concedo, em liminar, a segurança, para das efeito suspensivo ao agravo em
execução. Porto Alegre, 25 de abril de 2002. Des. Marcel Esquivel Hoppe,
Relator."
Ora, evidencia-se que, mantida a decisão que permite o trabalho externo à
apenada que não cumpriu o requisito legal, como já referido, estará
caracterizado o desvio de execução.
Quanto à legitimidade, o Ministério Público, por seus Promotores de Justiça,
possuem atribuição para ajuizar mandado de segurança em Segunda Instância, como
se observa pela lição de ADA GRINOVER, em palestra sob o título "Mandado de
Segurança e Habeas Corpus Impetrados em Segunda Instância por Promotor de
Justiça" (Revista JUS, do Ministério Público mineiro, p. 110):
"É o Ministério Público legitimado ad causam e tem capacidade postulatória para
a impetração. Age ele, nesses casos, exatamente como quando recorre, como
dominus litis, ou como "órgão da justiça". Dirige o writ para órgãos de segundo
grau, visando afastar o constrangimento ou a ilegalidade praticada em primeiro
grau. É como se, do órgão a quo, se dirigisse ao órgão ad quem. Não funciona em
2ª Instância. Impetra (recorre) para a 2ª Instância."5
Aliás, a questão foi pacificada, legislativamente, através da Lei Orgânica
Nacional do Ministério Público (Lei n.º 8.625/93), em seu artigo 32, inciso I,
que explicita:
"Além de outras funções cometidas nas Constituições Federal e Estadual, na Lei
Orgânica e demais leis, compete aos Promotores de Justiça, dentro de suas
esferas de atribuições:
I - impetrar "habeas corpus" e mandado de segurança e requerer correição
parcial, inclusive perante os Tribunais locais competentes."
Portanto, cabível e adequada a presente impetração, tendo o Ministério Público
legitimidade para tanto.
DO MÉRITO
DOS FATOS
Tramita na Vara de Execuções Criminais de ......... processo de execução contra
........., em razão de sua condenação pelo crime de homicídio qualificado,
encontrando-se em regime semi-aberto.
Entendendo que "o reeducando que começa a cumprir pena no regime inicial
semi-aberto, para obtenção do TE, deve cumprir o lapso temporal de apenas 1/12
no regime, para diferenciá-lo dos que iniciam o cumprimento em modo fechado", o
Magistrado a quo deferiu o trabalho externo.
Irresignado, o Ministério Público recorreu da decisão, interpondo agravo,
previsto no art. 197, caput, da Lei 7.210/84.
DO DIREITO
A decisão que deferiu o benefício do trabalho externo à apenada, que cumpriu,
apenas, 1/12 da pena privativa de liberdade, viola, frontalmente, o disposto no
art. 37, caput, da Lei de Execução Penal, que diz:
"Art. 37 - A prestação de trabalho externo, a ser autorizada pela direção do
estabelecimento, dependerá de aptidão, disciplina e responsabilidade, além do
cumprimento mínimo de um sexta da pena." (grifou-se)
Sabido é que ao Juiz não é permitido decidir contrário ao texto da lei, sem que
este seja, incidentalmente, declarado inconstitucional, sob pena de violação do
sistema jurídico.
Criar novos institutos que não encontram previsão legal nem se encontram dentro
de algum poder regulamentar que, por ventura, possa exercer o Magistrado,
implica invadir a competência do Poder Legislativo, o que, por certo, afronta o
princípio inabolível da separação dos poderes, consagrado no art. 60, §4º,
inciso III, da Magna Carta.
A intenção do Magistrado de diferenciar o apenado que iniciou o cumprimento da
pena em regime semi-aberto daquele que iniciou o cumprimento da pena em regime
fechado, embora compreensiva, não pode prosperar, ante à flagrante violação de
diversos princípios jurídicos.
De plano, verifica-se a quebra do princípio da igualdade, consagrado na
Constituição Federal (art. 5º, caput), visto que os presos de outros
estabelecimentos carcerários, na mesma condição, não poderão usufruir de tal
benefício antes do implemento do requisito objetivo previsto em lei.
Por outro lado, deve-se salientar que o processo de execução penal é regulado
pela Lei n.º 7.210/84, a qual prevê todos os benefícios passíveis de serem
concedidos aos apenados, mediante o atendimento de requisitos objetivos e
subjetivos.
Ignorar o requisito objetivo, criando um novo lapso temporal para concessão do
trabalho externo, caracteriza evidente invasão da esfera de atuação do Poder
Legislativo, o que, num Estado Democrático de Direito (art. 1º, caput, da Carta
Magna), é inadmissível.
A sociedade e o Estado, que têm o legítimo interesse de ver cumprida a sanção
penal, tal como prevista em lei, acaba sendo prejudicada por tal decisão, visto
que a apenada fica isenta do cumprimento da sanção imposta quando da sentença
condenatória.
Ainda, não se pode esquecer que, além da ressocialização do condenado, a pena
possui finalidade retributiva, a qual visa prevenir a prática de novos delitos.
Ora, se o condenado não permanece encarcerado pelo período previsto na sentença
condenatória (recebendo, por óbvio, todos os benefícios legais que lhe são de
direito), todo o processo de execução penal é frustrado. E mais, consagra-se o
que popularmente se chama de "impunidade".
Saliente-se, desde já, que, jamais, o Ministério Público irá se opor à concessão
de benefícios aos apenados, mas, sempre, condicionada ao atendimento dos
requisitos legais, sob pena de se vivenciar o caos, ante as incertezas
decorrentes da não observância da lei.
Cumpre lembrar que a lei existe justamente para garantir a segurança das
relações jurídicas.
Nesse sentido, já se posicionou o Superior Tribunal de Justiça:
"PENAL - PROCESSUAL - REGIME SEMI-ABERTO - TRABALHO EXTERNO - LAPSO TEMPORAL -
1. A autorização para o exercício de trabalho externo não é conseqüência direta
do regime semi-aberto. Depende, dentre outros fatores, do requisito objetivo -
Lapso temporal - Não atingido pelo paciente quando da impetração. 2. "Habeas
Corpus" conhecido; pedido indeferido. (STJ - HC 10609 - (199900804732) - RS - 5ª
T. - Rel. Min. Edson Vidigal - DJU 02.05.2000 - p. 00151).
Flagrante, portanto, a ilegalidade da decisão, a violar direito e líquido e
certo que a sociedade e o Estado possuem em ver a apenada cumprindo pena a que
foi condenada em processo judicial, em que foi assegurado o contraditório e a
ampla defesa, impõe-se a concessão da segurança.
Presente, igualmente, o periculum in mora, em face da ausência de previsão legal
de efeito suspensivo para o agravo da LEP.
DOS PEDIDOS
Diante do exposto, requer o Ministério Público seja concedida, com urgência,
LIMINARMENTE, a SEGURANÇA pleiteada, para o fim especial de dar EFEITO
SUSPENSIVO ao agravo interposto, evitando, pela demora no seu julgamento, reste
prejudicado, permitindo que a condenada usufrua de benefício ilegal, autorizado
no dia 19.02.03.
Requer, outrossim, concedida a liminar, seja dada ciência desta, URGENTEMENTE,
também, à SUSEPE, para sustar a autorização para a condenada exercer o trabalho
externo, tendo em vista que já foi expedido ofício pelo Juízo de Execuções
Criminais à Administração do Presídio nesse sentido.
Ao final, requer seja concedida a segurança, de modo a conceder o efeito
suspensivo ao agravo interposto.
A presente petição vai remetida pelo correio (protocolo integrado), acompanhada
de cópias das folhas 54 a 62, e versos, do processo de execução n° ...........,
além da cópia do agravo.
Dá-se à causa o valor de R$ .....
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura]