Habeas Corpus Preventivo
Excelentíssimo Sr. Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça de
Minas Gerais
FULANO DE TAL, brasileiro, solteiro, feirante, residente e domiciliado à Rua
XXXXXXXXX, nesta capital, vem impetrar ORDEM DE HABEAS CORPUS, nos termos do
Art. 647 do CPP c/c Art. 5°, inc. LXIX c/c Art. 60, §4, inc. IV, todos da
Constituição Federal, em nome do paciente XXXXXXXXXXXXXXXXXX, brasileiro, casado
comerciante, residente à Rua XXXXXXXXXXXXXXX, bairro XXXXXXXXXXX, também nesta
capital, tendo como Autoridade Coatora o Exmo. Sr. Juiz de Direito do II
Tribunal do Júri da comarca de Belo Horizonte/MG, pelos fatos e fundamentos a
seguir:
1 – Dos Fatos
Conforme consta da documentação inclusa, o paciente será julgado pelo
XXXXXXXXXXX da comarca de Belo Horizonte no dia XXXXXXXXXXXXXX pela suposta
prática do delito previsto no artigo 125 do Código Penal Brasileiro. Logo,
estará sujeito, em caso de eventual condenação, a penas que variam de 3 (três) a
10 (dez) anos de reclusão.
Ainda, tem-se que o paciente respondeu a toda a instrução criminal em liberdade,
não tendo causado qualquer embaraço ao trâmite processual.
2 – Do Direito
O art. 5°, inc. LXVIII da Constituição Federal estabelece que será concedido
habeas corpus sempre que alguém se achar ameaçado de sofrer coação ilegal em seu
direito de locomoção.
Portanto, pode-se dizer que a ordem de habeas corpus será expedida desde que
presentes dois requisitos: uma ameaça de coação ao direito de locomoção; a
ilegalidade dessa ameaça. Faz-se necessária uma análise separada de cada um
desses requisitos, como forma de demonstrar sua presença no caso do concreto.
2.1 – Ameaça de coação ao direito de locomoção
A demonstração da ameaça de coação ao direito de locomoção do paciente não
encontra maiores dificuldades. Afinal, conforme pode se observar a partir da
decisão inclusa, o paciente será julgado pelo XXXXXXXXXXXX no dia XXXXXXXXXXXXX
pela suposta prática do delito previsto no artigo 125 do Código Penal
Brasileiro. Logo, existe a concreta possibilidade de que haja a prolação de um
decreto condenatório. Consequentemente, presente está a ameaça de coação ao
direito de locomoção do paciente.
A concessão de salvo conduto ao acusado que aguarda julgamento, inclusive de
recursos, além de encontrar vários precedentes nas cortes estaduais, também já
foi reconhecido pelo Superior Tribunal de Justiça:
“Ordem concedida para possibilitar a permanência do paciente em liberdade, até o
julgamento dos embargos declaratórios tempestivamente interpostos, determinando
expedição de salvo conduto em seu favor”. (HC 33880 / SP. 2004/0022550-0.
Ministro Gilson Dipp. Data do Julgamento: 01/06/2004) (grifo nosso).
2.2 – Ilegalidade da ameaça ao direito de locomoção
O artigo 594 do Código de Processo Penal dispõe que o acusado primário e de bons
antecedentes poderá apelar em liberdade. Inclusive, o Superior Tribunal de
Justiça já decidiu por diversas oportunidades que se trata de um direito
subjetivo do acusado, e não uma mera faculdade do juiz, senão vejamos:
“A regra contida no art. 594 do CPP traduz direito subjetivo do acusado quando
satisfaça seus requisitos, e não mera faculdade do juiz que tem a
obrigatoriedade de pronunciar-se detida e fundamentadamente sobre as
circunstâncias de primariedade e antecedentes”. (STJ. HC 32 / RJ. Rel. Min. Cid
Flaquer Scartezzini).
Assim, a possibilidade do acusado primário e de bons antecedentes recorrer em
liberdade se tornou a regra dentro do ordenamento jurídico brasileiro após a
consagração constitucional do princípio da presunção de inocência (art. 5°, inc.
LVII). Em outras palavras, apenas excepcionalmente é que se permite a prisão do
acusado que aguarda o julgamento de recurso.
Ressalte-se que o Supremo Tribunal Federal, há quase 30 anos, já consolidou o
entendimento segundo o qual o direito do acusado de recorrer em liberdade também
se aplica aos feitos de competência do Tribunal do Júri:
“O benefício de apelar em liberdade, reconhecido a favor do réu primário e de
bons antecedentes pelo art. 594 do Código de Processo Penal (redação da Lei n°
5.941/73) também se aplica às decisões proferidas pelo Tribunal do Júri”. (STF.
RHC 53992 / PB. Min. Rodrigues Alckmin. Julgamento: 12/12/1975)
Conjugando o art. 594 do CPP com o princípio constitucional da presunção de
inocência, o Superior Tribunal de Justiça passou a decidir, em crimes de
competência do júri, que o acusado possui o direito de aguardar em liberdade o
julgamento de todos os recursos da esfera ordinária, desde que tenha respondido
à instrução processual em liberdade, senão vejamos:
“O direito de recorrer em liberdade só vai até o término dos recursos
ordinários, restando inviável o reconhecimento por todo o transcurso da causa.
Ordem concedida em parte para que a Paciente possa responder em liberdade ao
recurso de apelação”. (HC 34352 / RJ ; HABEAS CORPUS. 2004/0036767-5. Relator
Ministro José Arnaldo da Fonseca) (grifo nosso)
A partir de tais argumentos e da análise da jurisprudência transcrita acima,
pode-se concluir seguramente que o acusado primário e de bons antecedentes
possui o direito de aguardar o julgamento de eventual recurso de apelação em
liberdade. É claro que tal direito não possui caráter absoluto.
Excepcionalmente, quando presentes as hipóteses do artigo 312 do Código de
Processo Penal, e desde que justificadamente, permite-se a prisão do acusado que
aguarda o julgamento de recurso de caráter ordinário.
Contudo, nenhum daqueles fundamentos se adéqua ao presente caso. Analisando tais
fundamentos separadamente, tem-se, primeiro, que o acusado possui residência e
emprego fixos, tendo comparecido a todos os atos do processo, o que afasta
qualquer possibilidade de perigo de frustração da lei penal.
Quanto à ausência de perigo à ordem econômica, essa é ainda mais latente, por
ser uma hipótese aplicável apenas aos crimes de caráter fiscal, o que não é o
caso.
Também a hipótese de garantia da ordem pública não se aplica ao presente caso. A
jurisprudência entende que a deve ser efetuada a prisão para garantia da ordem
pública quando o acusado realiza ameaças à vítima ou a testemunhas, quando sua
periculosidade ficou evidenciada nos autos, ou quando o delito teve uma grande
repercussão. Entretanto, nenhuma dessas situações se verifica no caso concreto.
Afinal, o paciente sempre se comportou de acordo com os ditames legais, não
havendo nos autos qualquer indício de coação a testemunhas ou à vítima. Ainda,
nada existe nos autos evidenciando ser o paciente periculoso (conceito esse,
inclusive, de caráter duvidoso e já afastado pela doutrina mais abalizada). Pelo
contrário, o que se depreende dos autos é que o paciente é um cidadão primário e
de bons antecedentes, com personalidade não voltada para o crime, mas para o
trabalho.
Também incabível a prisão por conveniência da instrução criminal, visto que não
houve qualquer ação do paciente nesse sentido, como o não comparecimento a
audiências, fuga ou aliciamento de jurados, por exemplo.
Logo, diante do exposto, conclui-se que o paciente XXXXXXXXXXXXXXXXXX, primário
e de bons antecedentes, possui o direito de aguardar o julgamento de eventual
recurso de apelação em liberdade. Dessa forma, o decreto imediato de custódia do
paciente em virtude de condenação no julgamento pelo Tribunal do Júri estará
eivado de patente ilegalidade. Portanto, nesta hipótese restará presente o
requisito coação ilegal, que justifica, nos termos da Constituição Federal, a
expedição de ordem de habeas corpus.
Despiciendo observar ainda que, supondo a superveniência de eventual condenação,
a pena deverá ser fixada no mínimo legal, visto ser o paciente primário e de
bons antecedentes. Mesmo que reconhecida a agravante pleiteada na denúncia, tal
não teria o condão de aumentar a pena base, visto que se compensaria com a
atenuante do art. 65, III, b, do Código Penal.
Diante disso, restaria plenamente viabilizada a substituição da pena privativa
de liberdade pela restritiva de direitos, ou da suspensão condicional da pena.
Além disso, na pior das hipóteses, o acusado teria de se submeter ao regime
aberto ou semi-aberto, o que também lhe permitiria aguardar ao julgamento em
liberdade, no termos da jurisprudência desse Egrégio Tribunal de Justiça:
"Habeas corpus – Lesões Corporais de natureza grave – condenação para
cumprimento de pena em regime semi-aberto – interposição de recurso – pedido
para aguardar o julgamento em liberdade – Ordem concedida”. (TJMG. Número do
processo: 1.0000.00.245690-3. Rel. Des. Edelberto Santiago. Data do acórdão:
04/09/2001)
3 – Da Concessão de Liminar
Por certo, a concessão de liminar em sede de habeas corpus constitui medida de
caráter excepcional dentro do ordenamento jurídico brasileiro. Os requisitos
para a concessão de liminar são fornecidos pela doutrina: “como medida
excepcional, a liminar em habeas corpus exige requisitos: o periculum in mora (a
probabilidade de dano irreparável) e o fumus boni iuris (elementos da impetração
que indiquem a existência de ilegalidade no constrangimento)”. (Julio Fabbrini
Mirabete. Código de Processo Penal Anotado. Editora Atlas. São Paulo. 2001)
No presente caso, o periculum in mora se caracteriza pela proximidade da
audiência de julgamento pelo Tribunal de Júri, de forma que o atraso na
prestação jurisdicional pode culminar na inutilidade da prestação e na
conseqüente coação ilegal da liberdade de locomoção do paciente. A fumaça do bom
direito é comprovado pela decisão inclusa, que comprova a data marcada para o
referido julgamento.
4 – Do Pedido
Isso posto, requer-se:
- Seja concedida a ordem liminarmente, e, em sede de mérito, confirmada, com a
conseqüente expedição de Salvo-Conduto, evitando a concretização da ameaça ao
direito de locomoção do paciente.
- Seja a Autoridade Coatora, indicada no preâmbulo deste, intimada para
apresentar suas informações.
- Seja intimado o Ilustre Representante do Ministério Público para que integre a
presente lide.
Nestes termos,
Pede Deferimento.
Belo Horizonte, XXXXXXXXXXXXXX.
XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX
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