Entre as satisfações que pode sentir um profissional que cria algo - produto,
ideia, mensagem, entre outras coisas - é a de que sua "criatura" se torne de
domínio público e seja amplamente utilizada, tanto por profissionais como
comunicadores. E é exatamente isto que vem ocorrendo com a expressão
"pós-carreira" que criei no início da década 80, para designar o primeiro
programa estruturado, e brasileiro, de preparação de executivos para a
aposentadoria.
Vale lembrar que naquela fase o Brasil era conhecido pela forte presença de
uma população jovem - aproximadamente 50% tinham menos de 20 anos - o que
tornava o assunto aparentemente menos interessante, tanto para empresas como
profissionais. Descrevendo um pouco as origens do programa de pós-carreira
podemos dividi-la em duas partes. A primeira é resultado de um exercício
realizado com profissionais no tema Administração do Tempo e Qualidade de Vida,
em que se pedia a cada um que analisasse como encarava suas preocupações quando
examinava sua vida nas perspectivas do Passado, Presente e Futuro.
A grande maioria priorizava o futuro dentro de uma justificativa de que tudo
aquilo que não havia realizado no passado, e tão pouco conseguia desfrutar no
presente, seria vivenciado no futuro. Ou seja, um processo de adiamento de
sonhos, realizações e desfrute. O que, realisticamente, pode não ser alcançado,
na medida em que esta será uma etapa da vida distante e muito diferente. Com
todas as implicações provocadas pelo aumento da idade.
O segundo aspecto foi resultado da observação dos conceitos que fizeram
surgir na Europa, as chamadas Escolas da Terceira Idade. Pois, segundo alguns
estudiosos europeus, a vida se divide em três etapas: Preparação para o trabalho
- processo que ocorre na infância e na adolescência; Etapa do trabalho -
caracterizada por um vínculo empregatício ou de atividade própria; e
Pós-trabalho - fase em que o indivíduo se desvincula de um compromisso formal
com o trabalho.
A constatação era de que as pessoas estavam muito bem preparadas - ou se
preocupavam - com as duas primeiras. Mas entravam na terceira fase totalmente
despreparadas. Principalmente considerando que no continente europeu os índices
de longevidade vinham aumentando e os de natalidade estavam em franco declínio,
notadamente no período do pós-guerra. Aqui no Brasil, nesta mesma época, a
principal preocupação dos profissionais, e no que se refere ao tema da
aposentadoria, estava concentrada, estritamente, na questão financeira. Ou seja,
a criação de reservas para manter seu padrão de vida. Inclusive os próprios
planos de previdência se preocupavam apenas com as questões acumulativas do
assunto.
Questões tais, como a perda da "identidade organizacional" - o sobrenome que
a corporação empresta ao funcionário durante sua permanência na mesma - não
faziam parte do repertório de preocupações dos executivos. E outras tantas como
a perda da autoestima quando ocorria a perda do vínculo empregatício; depressão;
conflitos conjugais e familiares; saúde e cuidados físicos na terceira-idade,
entre outros, pareciam desnecessários serem tratados. Até porque, quem os sentia
já estava fora do mercado de trabalho.
A própria área de Recursos Humanos nas empresas propagava que seu papel,
dentro de uma visão sistêmica, era apenas o de captar, integrar e desenvolver
pessoas para e na organização. Desconsiderava, portanto, uma missão, que também
é sua, no sentido de "reintegrar" este cidadão quando ele conclui sua etapa de
vínculo empregatício e retorna à sociedade, ou ao mercado.
Ao olharmos este assunto, tanto na perspectiva atual, como futura, é possível
constatar que o tema só ganhou importância e valorização. Para tanto, basta
examinar alguns indicadores muito presentes no mundo atual. Um dos mais
significativos é a mudança do perfil da população brasileira, provocada
especialmente pelo aumento nos índices de longevidade e melhoria da qualidade de
vida. Houve um aumento significativo do número de pessoas com mais de 50 anos no
país, a redução do tempo médio de permanência de um profissional na mesma
carreira, as mudanças no mundo organizacional, além do rápido surgimento, e
desaparecimento, de empresas no competitivo universo do mercado nacional e
internacional.
Outro ponto emblemático é a alteração das características e perfil da família
brasileira, em que em muitos casos o rendimento do profissional aposentado
representa grande parte do sustento do núcleo familiar. Sem entrar em detalhes
sobre o prolongamento do tempo de permanência dos filhos sob a tutela, na
qualidade de dependentes, da estrutura de sua família de origem.
Enfim, a cada dia fica mais claro que preparar-se para uma qualidade de vida
adequada, tanto na perspectiva pessoal, quanto profissional, não é assunto para
ser trabalhado apenas na terceira-idade ou véspera da aposentadoria. Deve fazer
parte do projeto de vida das pessoas muito antes de ingressarem no mercado de
trabalho. É um assunto vital tanto para as pessoas como também para as empresas
que necessitam manter e renovar seus quadros profissionais, além de manter o
conhecimento acumulado pelas pessoas e organizações. O "pós-carreira" hoje, e
cada dia mais, deverá ser parte do conjunto de políticas das corporações.