No Brasil, é impensável falar em reciclagem sem citar os catadores de
materiais e suas cooperativas. Não existem números fechados, mas
calcula-se que existam de 300 mil a 1 milhão de catadores em atividade no país.
Os dados são do Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR),
que, no final de 2006, registrava 450 cooperativas formalizadas e
aproximadamente 35 mil catadores em seus cadastros.
Imbróglio urbano
A regulamentação do uso das carroças é, ainda, uma questão mal resolvida
na maioria dos municípios brasileiros.
É fato que cresceu o número de carroças em circulação nas cidades. No
entanto, como a reciclagem feita por catadores é uma atividade
majoritariamente informal, sua regulamentação tornou-se insuficiente e
sua fiscalização, de difícil execução.
No DF, por exemplo, o uso da carroça é permitido desde que as leis de
trânsito sejam respeitadas. Em São Paulo, tenta-se ressachar a atividade
exercida informalmente. Em outras cidades, apesar de pouco
regulamentada, a atividade é bem vista e formentada pelos governos
locais. |
Não é para menos, a população brasileira gera diariamente cerca de 126 mil
toneladas de lixo de consumo (excluindo dejetos industriais e empresariais). Não
fossem os catadores, esta fábula de lixo acabaria integralmente em aterros
sanitários e lixões. Na cidade de São Paulo, por exemplo, cerca de 20 mil
catadores desviam dos lixões oito mil quilos de materiais diariamente,
segundo dados de 2007.
A profissão, no entanto, não é tão glamorosa quanto o papel social e ambiental
que os catadores exercem. Muito pelo contrário, a maioria deles
perambula em média 30 quilômetros por dia, debaixo de chuva e sol, puxando até
400 quilos (o peso da carroça cheia), em busca de materiais que, muitas
vezes, só são encontrados dentro de sacos de lixo.
Como a maioria não usa proteção (uns por falta de dinheiro, outros por falta
de informação), freqüentemente ocorrem lesões ou infecções pelo manuseio o lixo.
É muito comum também que sejam confundidos com mendigos ou marginais ou, o que é
pior, simplesmente ignorados pela maioria das pessoas.
E como se não bastasse, alguns municípios proibiram as carroças de circular
por vias e estacionar em locais públicos.
Tudo isso para ganhar de um a dois salários mínimos por mês e,
com sorte, encontrar algum aparelho eletrônico que esteja funcionando.
Os atravessadores se aproveitam da frágil estrutura organizacional dos catadores
e abocanham 75% do faturamento gerado pela reciclagem, segundo dados do
Instituto Polis. Os catadores, por sua vez, ficam com apenas 25% da receita (e
com todo o trabalho pesado).
Se vale a pena? Na maioria dos casos, não se trata de escolha, e sim de luta
pela sobrevivência. Quem não consegue empregos melhores, mas tem família para
criar, acaba virando catador. Apesar da insalubridade, do desprestígio social e
da baixa remuneração, o dinheiro para atender necessidades latentes vêm no curto
prazo.
É por isso que proliferam-se, pela maioria dos centros urbanos do País, as
cooperativas de catadores de materiais reciclados. Organizados, os catadores têm
obtido resultados expressivos no sentido de melhorar suas condições de trabalho
e sua remuneração.
Benefícios e vantagens
As cooperativas normalmente oferecem uma série de benefícios aos associados,
como estacionamento para carroças, banheiro, refeitório (em muitos casos com
direito a almoço) e espaço para recebimento e separação de materiais.
Suporte
administrativo
Para que as cooperativas não se transformem em um verdadeiro caos, é
necessário que uma estrutura administrativa suporte suas operações.
Estamos falando de elaboração de planilhas de controle, organização de
sistemas e métodos, contas a pagar e receber e vendas. A figura do
psicólogo e do assistente social também é comum nas cooperativas de
catadores. O tamanho da estrutura varia de acordo com o volume de
operações, e a estrutura é bancada pela contribuição dos associados que,
em geral, varia entre 10 e 30% da receita de cada catador. |
Por terem mais notoriedade do que os catadores, as cooperativas
acabam conquistando a simpatia da vizinhança: “Oras, a cooperativa
transforma potenciais marginais em trabalhadores comuns”. A vizinhança, por sua
vez, tende a retribuir, firmando convênio para coleta de materiais ou
simplesmente entregando os recicláveis em seus depósitos.
O grande volume de materiais coletados pela cooperativas permite que os preços
sejam melhor negociados, seja com indústrias que utilizarão o material como
matéria-prima, seja vendendo a atravessadores. Em última análise, a
cooperativa dispensa a presença dos atravessadores, pois possui
estrutura suficiente para negociar direto com o cliente final.
Por outro lado, não raro vemos cooperativas manufaturando uma parte do material
coletado, no intuito de diversificar sua linha de produtos e incrementar seu
faturamento. Produz-se peças de artesanato, objetos decorativos e
mobiliário, entre outros. Estas atividades, em geral, envolvem a
família dos cooperados e moradores de rua.
Estrutura interna
A cooperativa de catadores funciona como uma empresa: tem área
administrativa, divisão de tarefas, distribuição de dividendos, etc. E para dar
certo, seu mecanismo interno precisa estar muito bem “azeitado”.
Projetos sociais e ambientais
As atividades da cooperativa não (necessariamente) se limitam a venda de
materiais para indústrias. É comum que sejam organizados projetos
sociais e ambientais, envolvendo catadores associados, suas famílias e
voluntários.
A cooperativa pode destinar uma parte dos materiais que seriam vendidos para a
produção de artesanato, objetos decorativos e mobiliário, ampliando sua linha de
produtos e agregando valor aos mesmos. A produção, em geral, fica por conta de
familiares de catadores ou voluntários que, além de receber aulas e adquirir
técnicas, podem obter algum rendimento com a atividade. Nesse sentido, a
cooperativa pode formar multiplicadores e organizar cursos abertos de
artesanato.
A cooperativa pode também organizar festas e confraternizações para promover a
venda de produtos. Parte da arrecadação pode ser destinada a ações sociais e
ambientais, como a distribuição de alimentos para moradores de rua e o plantio
de árvores na cidade, estabelecendo uma relação de simbiose com a
comunidade que está inserida.
A cooperativa pode, ainda, criar algumas exigências para o ingresso de
cooperados, como por exemplo, estabelecer presença obrigatória em cursos de
alfabetização e assistência social promovidos pela instituição.
Mais do que comercializadoras de materiais recicláveis, as cooperativas são
centros de reabilitação social e promoção de cidadania, além de agentes de
conservação do meio ambiente. São peça fundamental para o
desenvolvimento sustentável das sociedades.