No inteligente e ao mesmo tempo instigante livro "Ética para Meu Filho", cuja
agradável leitura recomendo aos jovens profissionais e também (talvez,
principalmente) aos seus líderes, inclusive os pais, o autor Fernando Savater,
filósofo espanhol, nos lembra em determinado ponto da obra que: "A boa vida não
é algo geral, fabricada em série, ela só se faz sob medida. Cada um deve
inventá-la gradualmente, de acordo com sua individualidade, única,
irrepetível... e frágil. Na questão de viver bem, a sabedoria ou o exemplo dos
outros podem nos ajudar, mas não nos substituir...".
Aqui me apresso em esclarecer que o sentido dado pelo autor aos termos boa
vida e viver bem não é o de vida folgazã, frugal ou fútil e sim o de vida
construída com virtude, vida vivida para e pelo bem.
Bonito, não é mesmo? Mas, você pode estar se perguntando: o que isto tem a
ver com o coaching para jovens profissionais? Ao que respondo, usando a
expressão que jovens um dia já usaram: tem tudo a ver. E mais, fico
impressionado como esse pequeno parágrafo nos fornece tantos elementos para se
aplicar - e que aplicamos - em programas de coaching e não só para os tão
jovens.
Antes de voltar ao parágrafo, lembremos que, de maneira bem resumida, nos
programas de coaching apoiamos o coachee a: 1) criar ou ter clareza de seus
objetivos; 2) iniciar ou desenvolver as competências necessárias para
atingi-los; 3) identificar e lidar com os obstáculos a serem superados; e 4)
elaborar um mínimo plano de ação que norteie a sua caminhada.
Concretizar estes quatro pontos não é das tarefas mais simples em se tratando
de profissional em início de carreira. Em geral, e sendo generoso, ele pode ter
tido uma boa formação familiar, cursado boas escolas e, com sorte, ter realizado
bons estágios. Pode também estar abastecido de muitas informações (que é muito
diferente de conhecimento) e ter, o que é bom e desejável, um farto, porém nem
sempre muito claro, menu de necessidades e de desejos.
Ele é um iniciante em um mundo novo, complexo, repleto de rituais próprios e
nem sempre acolhedor e hospitaleiro - o ambiente organizacional. É irreal pensar
ou querer que um jovem, no início de sua caminhada, sem vivência profissional
substancial, tenha objetivos consolidados, ou que venha a tê-los muito
rapidamente. Nesta fase da vida, objetivos e sonhos são quase sinônimos e
tê-los, os sonhos, já é, por si só, boa e essencial matéria prima para o começo
da carreira.
Aqui o coaching ganha importância, para impedir que o sonho se transforme em
pesadelo, o que infelizmente não é raro acontecer.
De um lado, temos um ser humano jovem, com a sua curta história, sua
personalidade, seu comportamento, sua curiosidade, sua disposição, sua visão do
mundo, da vida, de si próprio e a sua ainda desconhecida capacidade de trabalho.
Tomo emprestadas as palavras do Savater para chamar a atenção ao fato de que a
carreira se tornará elemento crescentemente importante na vida do profissional e
ambas, carreira e vida, não se fazem em série, mas sim, sob medida. Cabe, cá
entre nós, a pergunta: sob medida, quem de fato sabe fazê-lo?
E mais: não há outra fórmula ao jovem se não a de inventá-las gradualmente,
de acordo com sua individualidade, única, irrepetível e frágil, mas que pode e
deve ser fortalecida ao longo do tempo. Ou seja, a receita é própria, não tem
cópias e será obrigatoriamente formulada pelo profissional, que, jovem, requer
apoio. A experiência mostra-nos que a falta deste apoio, via de regra, leva a
carreira para o doloroso método da tentativa e erro ou para o campo pouco
científico da intuição. Não é só por isto, mas é fácil entender porque o
trabalho é tido como um ônus e tanta gente sonha desesperadamente em ganhar na
loteria.
No coaching, o jovem profissional toma ciência e articula o uso de seus recursos
para dar sentido e prover o desenvolvimento da sua carreira. Os grifos nos
lembram que "a sabedoria ou o exemplo dos outros podem nos ajudar, mas não nos
substituir". Portanto, cuidado há que se ter com modelos padronizados e
preconcebidos.
De outro lado, temos o ambiente organizacional "ensinando" ao jovem
profissional as suas regras, ritos, compensações, métodos, valores, linguagem,
controles, jogos de poder, alianças, e tantas outras coisas. É um ambiente
riquíssimo, sob o ponto de vista da existência humana, e a sua capacidade de
imposição é de tal força que marca profundamente a vida do profissional. Estas
marcas podem ser boas ou ruins e terão sempre consequências, novas, que o
profissional precisará administrar.
O coaching contribui na descoberta de possíveis armadilhas; antecipação de
erros clássicos; criação de caminhos e atalhos; alinhamento de valores;
adequação de atitudes; ajuste de visões - tudo para dar ao profissional a
construção de sua postura neste ambiente.
Ortega y Gasset, também filósofo espanhol, nos ensina que "O homem é o homem
e suas circunstâncias". A frase nos ajuda a aceitar e entender o enorme paradoxo
a que se submete o jovem ao vivenciar o ambiente organizacional e se transformar
no "ser profissional", sem deixar de ser a pessoa que sempre foi.
Aliás, mais do que propiciar a aceitação e o entendimento mencionados, o
coaching apóia o sólido desenvolvimento dos jovens profissionais para um estágio
da carreira onde não serão apenas profissionais jovens.